Dados oficiais apontam para que existam atualmente em Moçambique mais de 25 mil portugueses, a viver e trabalhar. A Câmara de Comércio Moçambicano reconhece que o número de contactos de empresas ou profissionais portugueses com o país, triplicou nos últimos dois anos e os próprios voos da TAP para Maputo aumentaram quase 40%. Os números certificam o interesse crescente dos portugueses por um país que já está a tomar o lugar de Angola entre os principais destinos profissionais. Mas o que faz afinal Moçambique um destino “maningue nice” (muito bom) para viver e trabalhar? Oportunidades.
Dinamismo, crescimento, oportunidades várias e necessidade de profissionais qualificados poderão ser, a uma primeira análise, os grandes aliciantes de Moçambique aos olhos dos portugueses. Quem conhece o país sabe que há mais, muito mais do que isso. E talvez por esta razão, Moçambique se esteja a tornar o destino favorito dos portugueses na altura de emigrar e procurar novas oportunidades profissionais. Embora os salários praticados estejam ainda abaixo dos angolanos, o custo de vida também é substancialmente inferior, a segurança é maior, o ambiente mais descontraído e o potencial de crescimento a médio prazo é muito elevado.
Segundo estimativas da Economist Intelligence Unit (EIU) país será uma das economias de crescimento mais acelerado, sobretudo devido ao sector da exploração do carvão (que se iniciou em 2011 e está em pleno crescimento) e outros recursos naturais, como o gás natural, que este ano deverá assumir grande dinamismo. Sector financeiro, turismo, transportes e agricultura comercial são, de acordo com o EIU, outras áreas igualmente determinantes na criação de oportunidades e de crescimento, nas quais há falta de profissionais qualificados no país.
Afonso Carvalho, diretor-geral da Kelly Services Portugal, reforça esta ideia. O especialista, habituado a liderar processos de recrutamento para aquele mercado, explica que “as principais carências de Moçambique em matéria de mão-de-obra qualificada estão maioritariamente concentradas ao nível de quadros médios-altos (diretivos ou operacionais) ou perfis técnicos especializados”. A Kelly Services tem recrutado para o país diretores financeiros e diretores gerais, nas áreas da logística e alimentar, mas Afonso Carvalho realça o elevado número de oportunidades existentes na hotelaria e restauração, logística e transportes, construção civil e tecnologias de informação. A média salarial praticada está, segundo o especialista, “40 a 50% acima da praticada em Portugal”. Contudo, Afonso Carvalho aconselha a que, antes de partir, seja negociada toda a logística inerente a um expatriado, uma vez que “a habitação será uma das parcelas mais elevadas do orçamento familiar no país”.
Com uma população ativa de cerca de dez milhões, 81% dos moçambicanos exercem atividade ligados à agricultura, 13% aos serviços e 6% à indústria. Perante este dados, “as prioridades das políticas de desenvolvimento dos recursos humanos em Moçambique estão centradas na educação, formação e emprego”, esclarece Ana Cardoso, diretora da área de Recrutamento e Seleção do Grupo Egor, acrescentando que “nos próximos cinco anos preveem-se 10 mil novos empregos em vários sectores”. A responsável reconhece o potencial do país enquanto destino de emigração, até por uma questão de proximidade histórica, mas acrescenta que é necessário acautelar algumas situações antes de escolher Moçambique como destino e convém não ignorar as enormes diferenças culturais do país face à Europa (ver caixa).
Segundo Ana Cardoso, “as oportunidades geradas pelas empresas moçambicanas são transversais a quase todos os sectores, mas a Egor tem sido nos últimos anos procurada para a seleção e recrutamento de quadros especializados em áreas como a indústria extrativa, construção civil, ferrovia, telecomunicações, informática, ensino e saúde, onde temos verificado um aumento do recrutamento de quadros e perfis técnicos”. Trabalhar no país, implica o cumprimento de vários requisitos legais, o primeiro dos quais é o visto de trabalho que “implica uma carta convite para integrar a empresa”, explica Ana Cardoso. Nada deve ser deixado ao acaso. As empresas Moçambicanas cumprem quotas para a admissão de estrangeiros, pelo que muitos portugueses têm apostado numa abordagem ao país como empreendedores, procurando oportunidades para o lançamento de negócios próprios, ou chegando ao país à boleia de empresas portuguesas que lançam operações locais, recrutando em Portugal quadros qualificados.
E são cada vez mais as empresas portuguesas a apostar neste mercado, nos mais diversos sectores de atividade. A Galp Energia deu um tiro certeiro ao iniciar a exploração de gás natural no país, a Novabase entrou em força em Moçambique, a seguradora AIG Portugal estuda a possibilidade de lançar a sua operação naquele mercado contando com a força laboral de expatriados portugueses, a Visabeira Moçambique (através da marca Sogitel) soma projetos no território e prepara-se para dar início à construção local de uma fábrica de prefabricados de betão, cujo investimento ultrapassa os 1,9 milhões de euros. A própria Sumol+Compal, na altura de construir a sua premira fábrica fora de Portugal escolheu Moçambique, encarando o país como a sua rampa de lançamento para o continente africano.
Apesar de todos este potencial, Ana Cardoso enfatiza que o país não é imune a constrangimentos. As oportunidades são reais e muito aliciantes, mas “a burocracia é grande, a inflação elevada, as infraestruturas são inadequadas e o sistema de saúde deficitário”. A especialista aconselha a que antes de partir deixe bem claras “as reais condições de trabalho, o perfil da empresa, as questões contratuais e todos os outros aspetos do dia-a-dia, como a habitação, seguros e sistemas de saúde”, para assegurar uma integração bem-sucedida.
Viver e trabalhar na pérola do Índico
Moçambique é um país de oportunidades para empresas e profissionais portugueses, mas não é um destino isento de riscos. Decidir rumar a Moçambique implica uma imensa capacidade de adaptação e consciência de que o país apresenta sectores de oportunidade mas também uma gigante desigualdade social e diferenças culturais abissais em relação à Europa.
O crescimento de 7% ao ano transforma o país num destino atraente, mas esta expansão não tem sido suficiente para colmatar a grave falta de profissionais técnicos qualificados. Com uma literacia de 48% e uma taxa de desemprego que ronda os 27%, em Moçambique 54% da população ainda vive abaixo do limiar da pobreza. A maior fatia da população ativa dedica-se à agricultura e aos serviços e as grandes prioridade do Governo estão centradas na educação, formação e emprego.
A braços com a falta de perfis mais qualificados, o recrutamento estrangeiro tem sido a solução encontrada pelas empresas moçambicanas, mas as regras para entrar no país são muitas e nem sempre fáceis de transpor. Trabalhar em Moçambique implica um visto de trabalho e residência, algo que só acontece mediante um contrato de trabalho ou uma carta convite da empresa a integrar. O processo pode ser moroso tendo em conta as restrições impostas pelas empresas em termos de admissão de expatriados e a obrigatoriedade que têm, cada vez mais, em admitir quadros locais. Evitar contratempos nesta matéria poderá passar por sair de Portugal já com contrato assinado, abordar o país como empreendedor, ou aproveitar a boleia das várias empresas portuguesas que estão a criar operações na pérola do Índico.
Maputo, Beira, Tete, Nampula e Pemba são as áreas de maior crescimento e empregabilidade no território. Para além dos cuidados mais comuns como o alojamento, as garantias de retorno ou a segurança, deverá preocupar-se em acautelar a necessária cobertura para cuidados de saúde e escolas, se viajar com a família. O ideal é recolher o maior número de informação possível sobre todos estes aspectos e se necessário, viajar ao país antes de se mudar em definitivo. É fundamental que não chegue a Moçambique sem uma ideia global da realidade e do esforço de adaptação que lhe será pedido.