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Jovens rejeitam ciência

06.02.2004


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Cátia Mateus, Fernanda Pedro, Maribela Freitas e Ruben Eiras

A CIÊNCIA conquista cada vez menos jovens portugueses. De acordo com uma análise do Eurostat, entre 1998 e 2001, registou-se uma diminuição de 4% na procura de licenciaturas na área científica.


Além disso, Portugal também detém a mais baixa taxa de participação da UE em cursos superiores relacionados com as ciências, na faixa etária entre os 20 e 29 anos: 7,1% contra 11,8% da média europeia.

De acordo com os responsáveis contactados pelo EXPRESSO, as causas desta tendência são o facilitismo no ensino da matemática e das ciências exactas, a falta de orientação profissional nas escolas e a escassez de emprego científico na economia portuguesa.

Segundo Silvino Ruivo, director da empresa de consultoria em gestão de recursos humanos Europraxis e que coordenou um estudo sobre orientação profissional "as escolas, genericamente, não têm uma cultura de incitamento dos seus alunos para as áreas científicas".

O mesmo responsável acrescenta que o sistema de ensino actual não valoriza e até retira, ou permite retirar, matérias científicas na altura em que por norma é aplicada a orientação escolar.

"A prática de orientação escolar e profissional nos Serviços Psicológicos de Orientação (SPO) - ensino público - é aplicada por volta do 8º e 9º anos de escolaridade, quando a capacidade de raciocínio lógico não está plenamente desenvolvida", explica.

Daí que, perante as dificuldades do aluno ou ausência de hábitos de trabalho persistentes, este desista face às dificuldades sentidas.
Além disso, o próprio sistema permite-lhe escolhas de agrupamentos que o afastam das áreas científicas.

Na opinião de Silvino Ruivo, "mesmo que um jovem tenha potencial de raciocínio lógico, quando afirma não gostar de matemática ou física, os orientadores dos SPO tendem a facilitar a escolha da via de ensino mais fácil, normalmente por eles mesmos não estarem sensibilizados para as necessidades do mercado de trabalho, presente e futuro".

Apostar na orientação profissional

A razão pela qual os jovens seguem cada vez menos as áreas científicas pode estar, segundo aquele especialista, "numa má orientação profissional e escolar".

Para melhorar este serviço, só mesmo apostando "numa maior formação dos orientadores. Estes necessitam de ser mais qualificados para a função e ter informação e formação sobre o mercado de trabalho actual e futuro", reforça.

Todavia, este tipo de medidas não parece estar incluído nos planos do Governo para aumentar a participação dos jovens nos cursos de ciências.

Quando interpelado pelo EXPRESSO sobre esta questão, Jorge Moreira da Silva, secretário de Estado da Ciência e Ensino Superior, limitou-se a referir vagamente que a orientação profissional dos jovens é fundamental, porque "a vocação é muito importante e há que dar a oportunidade aos talentos".

Especializações tecnológicas a caminho

Para já, no curto prazo, uma das soluções que o Governo apresenta para colmatar a falta de profissionais especializados nas áreas das ciências é a reconversão de licenciados de outras áreas com baixas taxas de empregabilidade.

"Vamos apostar em cursos de especialização tecnológica mesmo para aqueles alunos que frequentem licenciaturas fora da área científica", explica Jorge Moreira da Silva.

Só que a escassez de emprego científico campeia em Portugal, devido ao baixo investimento em actividades de Investigação&Desenvolvimento. Dos quinze Estados-membros da União Europeia (UE), segundo a AEP só a Grécia apresenta indicadores piores do que Portugal em matéria de investimento em investigação e desenvolvimento.

Portugal aplica anualmente nesta área 0,84% do PIB enquanto a média da UE aponta para 1,98%. E o sector empresarial investe menos 20% do que o Estado em I&D.

Além disso, o sector privado emprega apenas 12% do total de investigadores que trabalham no mercado nacional. Para a Associação Empresarial de Portugal (AEP), "se o país não evoluir neste domínio perderá a oportunidade de uma maior valorização da produção nacional".

A associação frisa que "a percentagem de gastos anuais em I&D assegurada pelas empresas é no nosso país bastante diminuta quando comparada com outros países europeus".

Entre os factores que travam o investimento nacional neste domínio, a associação salienta "a reduzida dimensão das empresas industriais portuguesas; uma interface deficiente entre centros de investigação, universidades e empresas; a falta de uma cultura que leve a criar orçamentos próprios e suficientes para I&D por parte das empresas assim como o facto dos incentivos públicos à actividade de I&D nas empresas permanecerem ainda longe das suas reais necessidades".

São mesmo de salientar, por parte da AEP alguns retrocessos nesta matéria. A instituição frisa o facto de o "Orçamento de Estado para 2004 não renovar o crédito fiscal ao investimento em investigação e desenvolvimento tecnológico".

Para a AEP não restam dúvidas de que, a continuar por este caminho, o país estará a perder o comboio em matéria de I&D "demonstrando fraca capacidade de inovação e concepção de novos produtos e processos produtivos, permanecendo a generalidade das empresas dependentes de relações de subcontratação das empresas estrangeiras que detêm essa capacidade".

12 mil bolsas para reconversão de doutorados

Inverter essa tendência passa, segundo a associação empresarial, por criar mecanismos que conduzam a um melhor interface entre o mundo científico e o mundo empresarial, bem como "criar e reforçar programas de estímulo à inserção de doutorados e investigadores nas empresas".

Neste plano, Jorge Moreira da Silva avança que será lançado até ao final deste mês o mecenato científico, que consiste na concessão de bolsas destinadas à reconversão profissional de licenciados, mestres e doutores.

São cerca de 12 mil bolsas no total, sendo que cinco mil serão dirigidas às empresas que admitirem licenciados, mestres ou doutores e sete mil destinadas à administração pública para empregar jovens recém-licenciados.

O secretário de Estado destaca ainda o plano de emergência que o seu Ministério está a desenvolver para combater o insucesso escolar nas áreas das ciências exactas, sobretudo na matemática.

O objectivo é apostar na qualidade do ensino, através de "um trabalho conjunto entre os vários intervenientes, nomeadamente professores do ensino secundário, universitário e centros de investigação".

Jorge Moreira da Silva assegura que este tipo de plataforma de colaboração irá projectar as profissões de base científica e tecnológica.

Quanto à melhoria da qualidade de ensino da matemática e das ciências exactas, o secretário de Estado adiantou ao EXPRESSO que o Ministério está a desenvolver um projecto transversal a todas as idades com a finalidade de atrair os estudantes para estas ciências.

Contudo, aquele responsável governamental não pode ainda divulgar o conteúdo do projecto, garantindo, no entanto, que está para breve a sua aprovação.

Serviços dominam

SE O leitor é um trabalhador altamente qualificado, fique a saber que dentro do segmento do emprego científico, segundo um estudo estatístico do Eurostat, entre 1997 e 2002, as melhores perspectivas encontravam-se nos sector dos serviços intensivos em conhecimento, isto é, todas as actividades que exigem tratamento e utilização avançada de informação (como a banca, por exemplo): o crescimento foi superior ao da UE (3,1%), com cerca de 4%.

Mas o parto do emprego científico no tecido industrial revela-se tarefa difícil. A criação de postos de trabalho no sector da indústria tecnológica "high-tech" (de ponta) foi negativa: o emprego contraiu 0.9%. Mas no segmento médio daquele sector industrial o aumento foi de 0,2%.

Ou seja, na generalidade, isto significa que os doutorados tiveram menos oportunidades de trabalho naquele período. Por outro lado, aqueles que se diplomaram com uma qualificação técnica de nível médio ou se ficaram pelo grau de licenciatura provavelmente conseguiram arranjar emprego na indústria nacional.





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