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Emigrantes de luxo

A nova vaga de emigração portuguesa é composta por profissionais qualificados, com formação superior a quem o país não consegue dar uma resposta adequada às suas aspirações profissionais.
04.03.2010 | Por Cátia Mateus


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Jovens, qualificados, com ambição profissional global e decididos a não confinarem o seu destino a um país onde o desemprego já ultrapassou a temível fasquia dos 10%, são estes os novos emigrantes portugueses. Segundo dados do Conselho das Comunidades Portuguesas, desde a década de 60 do século passado que o país não assistia a uma vaga de emigração tão grande. O desemprego está na origem da maioria das decisões dos novos emigrantes, mas a questão não se resume apenas a este factor. Reino Unido, Suíça, França, Luxemburgo e países africanos, são os destinos preferenciais destes emigrantes, cada vez mais qualificados que procuram melhores salários e melhores condições de vida, deixando mais pobre um país que sempre se debateu com escassez de qualificação.

O final de 2009 saldou-se negro para o país em matéria de emprego, alcançando os dois dígitos. Segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE) o último ano deixou no desemprego 563.300 pessoas. Os números são conhecidos e não parecem inverter-se com o arranque de 2010. Um fenómeno transversal a todos os grupos etários e qualificações, que as políticas governamentais não parecem conseguir inverter, fazendo Portugal perder a batalha de décadas que trava contra a designada “fuga de cérebros” nacionais.

Luís Ribeiro Rosa deixou trocou Portugal pela Suíça em 2008. Tem 31 e frequentou a licenciatura em Informática na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. Não chegou a concluir o curso, mas diz sem rodeios que tenciona vir acabá-lo. É que a vida colocou-lhe outras oportunidades. “Tive de começar a trabalhar cedo porque tinha de suportar todas as minhas despesas e não tinha suporte parental, por isso agarrei a oportunidade de trabalhar no estrangeiro em 2008”, explica.

Luís trabalha neste momento na Suíça como consultor informático, desenvolvendo funções de programador e analista de sistemas informáticos. Confessa que não procurou activamente sair do país, mas face às condições que encontrava em Portugal, quando a oportunidade surgiu não a deixou fugir. “Tinha óptimas possibilidades de seguir uma carreira no meu país, mas estava descontente com a forma como se trabalha em Portugal, com as condições e perspectivas de carreira que oferecem aos jovens e por isso aceitei sem hesitações abraçar uma carreira internacional”. Para o jovem, os benefícios de optar por uma carreira além fronteiras dependem sempre muito da empresa e do país de destino, mas centram-se sobretudo nas condições de vida e carreira, na organização do trabalho e no nível salarial.

“Um bom profissional tem muita facilidade em conseguir trabalho com melhores condições noutros países do que em Portugal porque se tem tornado progressivamente mais difícil para as empresas lusas competirem com as condições oferecidas no estrangeiro e isto é um problema que o país tem de tentar resolver. Há muitos jovens talentos que Portugal não consegue segurar porque encontram condições de vida e trabalho bem mais atraentes e aliciantes, com outras possibilidades de progressão no estrangeiro”, argumenta. Uma realidade que para Luís Ribeiro Rosa tem a ver não só com o estado da economia nacional, mas também com a mentalidade do país. Embora não coloque de parte a hipótese de um regresso, Luís confessa que para já “não está nos meus planos” e lá vai adiantando que, se voltar, não será por razões profissionais. “Certamente, a maior parte dos jovens emigrantes gostaria de ter ficado no seu país se pudessem trabalhar na sua área, sendo justamente compensados por esse trabalho”, concluí referindo ainda que Portugal tem de saber tornar-se aliciante ao investimento, sem sacrificar as condições de trabalho e as oportunidades de carreira.

Igual opinião tem Michel Santos. Com 35 anos, o jovem jornalista está permanentemente em Lyon ao serviço da Euronews desde 2005, embora o seu vínculo à empresa tenha começado em 2001 como freelancer, depois dos estágios realizados na SIC e na RTP, em Portugal. A ambição de uma experiência internacional foi o primeiro grande aliciante para trocar Portugal por Lyon, mas cedo outras razões se evidenciaram. “Após estagiar na SIC e na RTP, encarei a aposta na Euronews como um reforço ao meu currículo. Nos primeiros anos como freelancer, tive sempre a perspectiva de conseguir uma colocação num meio de comunicação português, mas a verdade é que as oportunidades foram raras e acabei por deixar toda a minha vida em Portugal para me instalar em Lyon. Tive muito a perder, sobretudo em termos pessoais, mas as condições laborais, especialmente financeiras e de protecção social pesaram muito”, relembra argumentando que “em Portugal os jornalistas são mal recompensados. A maioria não vive, sobrevive e depois de alguns anos em França, as questões financeiras sobrepuseram-se às razões profissionais”.

No entender do jornalista, Portugal falha na missão de oferecer aos jovens condições para desenvolverem o seu potencial profissional no seu país, não só na área da comunicação mas noutras também. “No caso do jornalismo, por exemplo, há profissionais que trabalham a recibos verdes há inúmeros anos. Como é possível que um jornalista trabalhe num caso que pode suscitar pressões na sua vida profissional e pessoal, sem que estejam asseguradas as mínimas condições de estabilidade?”, enfatiza.

Ainda que a sua ambição seja regressar ao seu país, confessa que “infelizmente, a precaridade no meio deixa-me de certa forma limitado, pois dificilmente encontrarei em Portugal as condições que aqui tenho. Nos meus primeiros anos aqui sempre pensei que fosse temporário, mas hoje não vejo perspectivas de regressar a curto prazo”, lamenta. Para Michel Santos, “os jovens são um valor acrescido e Portugal precisa deles para poder competir num mercado global. O país nunca sairá do lodaçal em que se encontra se não tiver gente competente a contribuir para o desenvolvimento do país”. E acredita que “se a riqueza do país fosse melhor gerida, seria possível manter os talentos. Portugal é um dos países onde se verifica um maior fosso salarial entre trabalhadores e gestores. E isso torna as empresas ocas, com estruturas motivacionais débeis e uma postura de conformismo que se alastra a toda sociedade. Ninguém pode contribuir positivamente para uma empresa, para o pais, se não existir bem-estar no trabalho”, concluí.

E enquanto esta realidade não se inverte, o profissional vai procurando tirar da sua experiência internacional os melhores benefícios que na sua perspectiva se prendem com a riqueza de experiências que acabamos por usufruir em termos profissionais. “Neste domínio, a Euronews é um local muito rico. Trabalho diariamente com colegas de pelo menos 9 nacionalidades e isso permite-nos ficar a perceber as diferentes perspectivas profissionais de cada um, as diferentes maneiras de reagir dos jornalistas em questões sensíveis em países onde a imprensa tem problemas. É igualmente interessante observarmos a diferença das relações interpessoais consoante a nacionalidade. A Euronews é uma torre de Babel, um meio extraordinário, para conhecermos o perfil profissional e também pessoal de colegas de outras nações. No fim de contas, ficamos como uma mentalidade mais aberta, em todos os domínios”, argumenta enfatizando as possibilidades de formação e progressão na carreira, bem como um nível de vida superior ao que a sua profissão continua a permitir em Portugal.



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