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"As empresas não são redutoras de salários"

O novo diretor-geral da multinacional de recrutamento Randstad Portugal, José Miguel Leonardo, assumiu funções esta semana. O engenheiro civil que consolidou toda a sua carreira fora do sector dos recursos humanos, partilha com o Expresso a sua  visão sobre o desemprego, a produtividade e os salários nacionais.

07.03.2014 | Por Cátia Mateus


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Este é um desafio distinto dos que anteriormente abraçou na sua carreira. Com que missão o aceita?
É distinto no sector, mas acaba por ter em comum com outros o facto de vir trabalhar com pessoas muito bem preparadas. Quem conhece a Randstad, percebe que há uma equipa de profissionais muito sólida que permitiu que ao longo dos anos esta marca fosse ganhando espaço num mercado difícil e de elevada responsabilidade e isso só se consegue com méritos próprios e sendo consistente ao longo dos anos. O mérito do que é esta empresa é de quem cá está e de quem por cá passou. O meu objetivo é dar continuidade a este trabalho e aos êxitos alcançados, mas também fruto da minha experiência e do meu contacto com outros sectores empresariais, com outras práticas, apostar valor à estrutura da Randstad que é sólida mas que necessita de uma contínua ambição de melhoria e evolução.

Quer dizer que não ter um percurso na área dos recursos humanos pode ser uma mais-valia no exercício desta função? 
Venho com uma visão que não está limitada por experiências vividas exclusivamente neste sector, mas também com conhecimento de outras áreas com experiências e práticas distintas. Não ter um percurso nesta área pode ser claramente uma oportunidade de repensar as práticas, na medida que venho questionar os procedimentos e desbravar novos caminhos.

Quais são os seus objetivos na liderança da Randstad?
O objetivo da Randstad enquanto empresa de recursos humanos é ajudar a proximar as pessoas das empresas. Ao mesmo tempo, queremos moldar o mundo do trabalho garantindo o seu equilíbrio e funcionamento, respondendo aos desafios da sociedade atual, como seja a escassez do emprego  e o envelhecimento da população. Os meus objetivos e a minha missão neste cargo são contribuir para que a Randstad tenha, no seu compromisso com estas metas, resultados visíveis.

Não o intimida abraçar este desafio numa altura tão conturbada em matéria de desemprego?
Acho exatamente o contrário. É um desafio tremendamente acrescido, mas não me recordo de termos vivido momentos fáceis nunca. É inquestionável que as circunstâncias que nos rodeiam são complexas, mas tudo o que temos vivido nos últimos tempos tem contribuído para nos fortalecer. O sucesso é contagiante, mas as dificuldades são o que nos faz crescer, emergir, andar para a frente e encontrar novas soluções. O papel das empresas deste sector é decisivo nesta fase de mudança económico social e a Randstad tem os valores, o know-how e as pessoas para ter um importante contributo na recuperação. Estou consciente das dificuldades que temos pela frente. Não me intimida absolutamente nada. É um imenso estímulo.

Sob a liderança do anterior presidente, Dr. Mário Costa, a Randstad Portugal destacou-se pelos seus níveis de produtividade face às suas congéneres e foi convidada a assumir desafios de gestão internacional no grupo, nomeadamente no Brasil. É um desafio acrescido pegar numa empresa neste patamar?
É uma grande responsabilidade. A Randstad foi extraordinariamente bem gerida até aqui, o eleva o nível de responsabilidade que eu próprio terei para continuar a transportar a empresa, com a colaboração de todos, para níveis de excelência ainda superiores. Todos temos essa aspiração e noto nestas pessoas a vontade de fazer mais e melhor. Se será mais difícil? Provavelmente não porque uma empresa que está habituada ao sucesso, está formatada para estes níveis de competitividade. 

Quantos postos de trabalho assegura atualmente a Randstad?
Cerca de 28.030 colaboradores, em 39 países, que dão emprego a 567.700, pessoas todos os dias.

Como é que uma empresa desta dimensão encara a questão do desemprego?
O desemprego é uma redução do mercado. Representa uma diminuição do volume de negócios. Para nós representa também um desafio acrescido de continuar a cumprir a nossa missão: a de fazer “casamentos perfeitos” entre as aspirações profissionais das pessoas e o interesse das empresas.

Nos últimos meses o mercado tem dado sinais de uma tímida recuperação da dinâmica do mercado de trabalho. Parecem-lhe sustentáveis esses sinais?
Tendemos a olhar para o futuro baseando-nos na experiência vivida. A expectativa é de que qualquer coisa parecida com o que já vivemos se repita. Eu não acho que isso venha a acontecer. O contexto que teremos a partir daqui será novo. Este período que enfrentamos veio colocar-nos no ponto de partida. Que uma melhoria tem de acontecer, tem mas vai ser uma recuperação necessariamente demorada com a qual vamos ter de aprender, se quisermos emergir mais fortes, tanto a nível individual como das organizações.

Quer dizer que temos de mudar a forma como encaramos o emprego?

Os paradigmas do emprego mudaram radicalmente. As pessoas já não procuram apenas emprego, procuram uma atividade que as preencha e onde sintam que podem contribuir e que, findo esse capítulo, podem abraçar outro dentro da mesma organização ou fora dela. Isto representa também desafios para as empresas que querem reter os seus talentos, o que neste contexto nem sempre é fácil. É um desafio imenso para as organizações gerir talento na atualidade. Manter o incentivo nos recursos humanos será muito provavelmente, em conjunto com a correção do emprego que vai ter de acontecer, o grande desafio que as empresas terão de enfrentar. É papel da Randstad, com o seu expertise, ajudá-las.

Mas a taxa de desemprego é elevada, sobretudo entre jovens qualificados, e a Comissão Europeia aponta Portugal como o país onde há maior disparidade entre as qualificações e a natureza das funções desempenhadas pelos profissionais, referindo ainda que a tendência é para que o país crie apenas empregos pouco qualificados nos próximos anos ...
Acho que o que não é sustentável não se sustentará. Não é sustentável termos pessoas qualificadas a fazer trabalhos não qualificados ou pouco qualificados. As pessoas têm as suas ambições e vontades e as empresas têm necessidade de qualificar os seus recursos para que o seu desempenho gere valor na empresa. Se não nos qualificarmos como empresas, não conseguiremos manter o nosso direito de permanecer ativas no tecido empresarial. O desafio é grande, mas não acredito que se mantenha este desequilíbrio.

Mas reconhece que há uma disparidade entre aquilo que é a expectativa dos profissionais portugueses e a realidade.
..
Há. Em Portugal hoje temos mais licenciados e isso é positivo. Não pode nunca ser visto como algo negativo. Esta evolução permitiu-nos acompanhar um rácio que se verificava noutros países. É natural que tenhamos preocupação com a fuga de cérebros atual porque é crescente o número de profissionais qualificados que não encontrando oportunidades de carreira aliciantes no país, vão para fora. Este é um problema que tem de ser resolvido para o bem do país. Não é sustentável manter isto.

Qual é o papel das empresas do sector privado de emprego na inversão deste cenário?
É nossa responsabilidade contribuir positivamente para a resolução do problema. Obviamente não nos podemos substituir a outras entidades que, essas sim, tem uma responsabilidade primária de o fazer, mas temos o dever de contribuir para a solução. Temos alicerçado em anos de experiência formas de ajudar empresas e candidatos a encontrar resposta às suas aspirações.

A crise ajudou a mudar a imagem do Trabalho Temporário (TT) junto dos portugueses?
O TT é uma forma de chegar ao mercado de trabalho. Todos os anos há milhares de pessoas que, com a contribuição da Randstad, são empregadas. É uma missão que nos orgulha e que tem uma taxa de conversão de profissionais cada vez mais elevada. Além de ser uma forma de capitalizar experiência, o TT já gerou um número elevado de profissionais que integraram as organizações onde trabalharam como temporários.

Pode ser uma solução para profissionais mais seniores também?
Continuam a ser mais jovens em início de carreira, mas também porque até aqui não houve grande oferta para profissionais mais experientes.

Nos últimos anos tem-se perfilado uma sucessiva diminuição salarial, sob a bandeira da crise. Quando fala da necessária motivação dos portugueses para ultrapassar a crise, tem em mente também esta realidade?
Eu não tenho certeza absoluta de que de facto essa seja uma tendência generalizada. Reconheço que não é o caminho, mas também reconheço que haverá casos em que se estava a pagar acima do que seria razoável para o desempenho e a produtividade, seja do individuo ou da própria função.  O que acho fundamental é conseguirmos um aumento efetivo da produtividade e para isso temos de conseguir manter níveis de remuneração que possam ser adequados e competitivos tendo como meta a produtividade. As empresas são criadoras de valor, não são redutoras de salário. Não vejo que de forma maquiavélica as empresas reduzam remunerações às pessoas quando o que querem é gerar valor. Uma coisa depende da outra. Reconheço o desafio de gerar valor no atual contexto, mas a remuneração é apenas um fator de custo entre dezenas e em muitos casos, nem é o que mais pesa. Um salário reduzido significa ter alguém desmotivado e certamente não contribui para aumentar a produtividade.   

O desafio dos Recursos Humanos
Licenciado em Engenharia Civil pelo Instituto Superior de Engenharia de Lisboa, José Miguel Leonardo consolidou a sua carreira em múltiplos cargos de topo em cenários nacionais e internacionais. O novo diretor-geral da Randstad Portugal iniciou o seu percurso profissional na The Dow Chemical Company, em 1993. Na empresa alcançou os cargos de diretor Comercial, de marketing e de Desenvolvimento de Negócio, desempenhando funções em diversos países. Do seu currículo fazem ainda parte empresas como o fabricante de produtos especiais para a construção, Imperalum  e a Stanley Security, empresa do grupo Stanley Black & Decker, que liderou em Portugal e Itália.



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