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Opinião - E as medidas de apoio ao empreendedorismo?



01.01.2000



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E as medidas de apoio ao empreendedorismo?
(25-11-2005)

Armindo Monteiro
Presidente da Associação Nacional de Jovens Empresários

O Orçamento do Estado (OE) para 2006 traduz uma genuína vontade de consolidação orçamental, designadamente através da redução da despesa total das administrações públicas de 49,3% para 48,8% do PIB. É igualmente positivo o facto de o documento se basear em cenários macroeconómicos realistas e de, ao contrário de anos anteriores, não recorrer à suborçamentação ou a soluções extraordinárias para escamotear o verdadeiro défice público. Acresce que o OE prevê 100 milhões para o Plano Tecnológico, o que não deixa de ser animador para quem se tem batido por uma maior aposta na inovação e em I&D.


Contudo, não posso deixar de repudiar o facto de, uma vez mais, se procurar atingir a consolidação orçamental mais pelo lado da receita do que pelo lado da despesa. Na realidade, os contribuintes vão pagar mais 3000 milhões de euros em impostos e contribuições para a segurança social em 2006, o que corresponde a um acréscimo de 6% face a este ano. Por outro lado, e embora o orçamento aponte para uma subida de 1,9% do item "despesas com pessoal", o Governo assumiu que os aumentos salariais da função pública vão chegar pelo menos aos 2% (aproximando-se do valor da inflação, 2,3%), situação que deverá implicar um imediato agravamento do défice previsto (4,8%).

Mas o que contesto com mais veemência é o substancial aumento do limite máximo do Pagamento Especial por Conta (PEC), de 40 mil para 70 mil euros. Esta decisão vem penalizar fortemente as empresas com um volume de negócios significativo e que, ainda assim, apresentam prejuízos para efeitos fiscais. É que as condições de reembolso do PEC são bastante onerosas e dissuasoras, o que configura, na prática, um impedimento à devolução do dinheiro. Ou seja, com base em cálculos de receitas presumidas e assumindo a incapacidade da máquina tributária para controlar a fuga ao fisco, o Estado retém verbas que não lhe pertencem, circunstância que faz do PEC uma colecta mínima e, por isso, fiscalmente iníquo.

Esta situação é tanto mais grave quanto pensarmos que, no tecido empresarial português, as micro e pequenas empresas têm um peso considerável, correndo agora o risco de, mercê do agravamento do PEC, verem à partida a sua actividade bastante dificultada. Na minha opinião, este cenário consubstancia um claro desincentivo ao empreendedorismo jovem que, como sabemos, se manifesta em pequenos negócios não lucrativos nas suas fases iniciais de investimento.

Segundo o Global Entrepreneurship Monitor, a Taxa de Actividade Empreendedora desceu em Portugal de 7,1% em 2001 para 4% em 2004. No contexto europeu, Polónia e Irlanda são os países europeus que registam maior Taxa de Actividade Empreendedora em 2004: 8,8% e 7,7%, respectivamente.

Tomemos a Irlanda por exemplo. Como é sabido, o chamado "tigre celta" apostou na captação de investimento estrangeiro, designadamente multinacionais de cariz tecnológico. Para tanto criou um ambiente propício ao investimento, reduzindo drasticamente a carga fiscal e a burocracia. Além disso, fez-se valer da universalidade da sua língua e também do peso da diáspora irlandesa no mundo, em particular nos Estados Unidos.

Contudo, a dependência em relação a multinacionais afigurava-se perigosa para o país. A deslocalização de grandes empresas estrangeiras para zonas do globo com menos custos laborais é, também lá, uma ameaça a não desconsiderar. Perante este cenário, a Irlanda inverteu recentemente as suas políticas públicas de apoio ao desenvolvimento empresarial. A aposta vai agora no sentido da construção de uma sociedade de empreendedores, com a qual se procura equilibrar a dependência em relação às multinacionais.

Hoje, nascem na Irlanda 50 mil novas empresas por ano. Para aproveitar esta energia empreendedora, o Bank of Ireland em parceria com a Hewlett Packard e mais sete entidades irlandesas avançou para um pacote bancário dirigido a start-ups. O objectivo é apoiar 20 mil novas empresas todos os anos, com taxas de juros preferenciais, serviços bancários gratuitos durante dois anos e descontos em diversas áreas (equipamentos, publicidade, software, inscrições em associações, formação, etc.). Ou seja, as entidades públicas e privadas da Irlanda reagiram rapidamente ao ímpeto empreendedor da sua sociedade, criando condições favoráveis para a concretização e consolidação de projectos empresariais.

Portugal, que em 2001 tinha 7,1% de Taxa de Actividade Empreendedora, deixou-se dormir à sombra da conjuntura económica favorável, pouco fazendo para consolidar o empreendedorismo que então emergiu. O sistema fiscal continuou pesado, complexo e instável. A legislação laboral penalizadora para os empresários. O financiamento bancário inadequado a start-ups. O ensino pouco propenso à criação de uma mentalidade empreendedora e menos avessa ao risco. As universidades permaneceram de costas voltadas para as empresas, e vice-versa. A burocracia manteve-se como causa de ineficiência e morosidade. E o investimento empresarial em I&D quedou-se por valores muito abaixo da média europeia.

Neste caldo de cultura, era importante que através do último OE tivessem sido melhoradas as condições da actividade empresarial e fomentado o investimento por jovens empreendedores, designadamente criando um quadro fiscal mais competitivo. Bem sei que o cenário macroeconómico não é o mais favorável e o sistema tributário precisa de estabilidade, mas pequenas medidas de estímulo ao investimento poderiam e deveriam ter sido introduzidas neste orçamento.






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