Human Capital : uma expressão actual do nosso
futuro
Nuno Nogueira
Compreender e traduzir o conceito de "human capital"
é determinante na percepção que podemos ter do potencial
humano subjacente e intrínseco ao indivíduo, per se e no
contexto social em que se insere.
Inicialmente e do ponto de vista económico o capital humano consubstanciava-se,
na teoria dominante, na expressão "força de trabalho"
não sendo objecto de estudo próprio nem de autonomia relevante
no pensamento económico e social. Na verdade, apenas se falava
e teorizava sobre a força de trabalho e esta enquadrada no estudo
dos factores produtivos enquanto elementos da função produção
e como tal como um bem homogéneo e objecto de transacção.
Foi Arthur Cecil Pigou que introduziu inicialmente o conceito quando
referiu que "There is such a thing as investment in human capital
as well as investment in material capital. So soon as this is recognised,
the distinction between economy in consumption and economy in investment
becomes blurred. For, up to a point, consumption is investment in personal
productive capacity. This is specially important in connection with children:
to reduce unduly expenditure on their consumption may greatly lower their
efficiency in after-life." (Pigou, 1928, "A Study in Public
Finance", p. 29).
Não deixa de ser curiosa a ideia de que o consumo não é
algo que se perde por inteiro no âmbito e cômputo geral da
economia e da sociedade, mas que se transforma, traduzindo-se em investimento
- especialmente quando aplicado em bens que potenciem o crescimento intelectual
e científico dos "consumidores" em causa. Neste contexto,
não existe em si diferença entre consumo e investimento
mas sim entre diferentes tipos de investimento: investimento em capital
humano e investimento em capital físico / material.
No neoclassicismo, Jacob Mincer foi pioneiro na introdução
do termo, seguindo-se Gary Bechker da Escola de Chicago. Bechker com o
seu livro intitulado Human Capital, publicado em 1964, tornou-se uma referência
durante muitos anos. Na perspectiva então publicada, o capital
humano era considerado similar a outros factores físicos de produção,
tal como máquinas, advogando-se que se podia investir em capital
humano (via educação, formação, tratamento
médico) e perspectivar que a rentabilidade global do investimento
global dependeria em parte do investimento realizado em capital humano.
Marx abordou também o termo no seu artigo "The Emancipation
Question", em 1859, no New-York Daily Tribune, segundo o qual e no
contexto do capitalismo, existe uma troca entre a força de trabalho
proporcionada pelos trabalhadores e os salários por estes recebidos
e uma diferença clara entre a capacidade de determinado individuo
para trabalhar (aquilo a que pode chamar a sua força de trabalho)
e a sua prática de trabalho.
Na perspectiva de Marx, um trabalhador livre não pode vender capital
humano em troca de remuneração, pelo que human capital não
é tangível nesse sentido. Mesmo um escravo, cujo capital
humano pode ser vendível, não obtém uma remuneração
própria para ele próprio, mas sim para o seu "proprietário".
No contexto do capitalismo, para obter rendimento, o trabalhador tem de
concordar com as condições de trabalho (incluindo obediência
a certas regras) de um empregador que o pretenda contratar durante um
determinado período de tempo. Embora o capital humano represente
para o trabalhador determinado benefícios não o liberta
de estar dependente dessa relação laboral no sentido de
assegurar a sua sobrevivência.
Actualmente a realidade social e económica em que se enquadra
o conceito de capital humano reflecte as diferentes perspectivas em que
o mesmo foi teoricamente trabalhado e contextualizado.
Efectivamente existe uma relação laboral que implica determinadas
relações de dependência entre os indivíduos
que exercem determinada profissão e colocam em prática,
pelo menos parcialmente, o seu capital humano. Certo é também
que essa prática reflecte determinada remuneração
que se consubstancia como a rentabilidade materializável obtida
pelo indivíduo pelo exercício parcial do seu capital humano
e do investimento que previamente terá realizado. Nas relações
comerciais entre empresas existem idênticas relações
de dependência entre fornecedores e clientes que não impedem
a obtenção de maiores ou menores rentabilidades económicas
consoante os investimentos realizados por ambas as partes.
Assim, actualmente, as teorias económicas e sociais reflectem
um conceito de capital humano infinitamente que inclui variáveis
não mensuráveis e de difícil definição
tais como o carácter pessoal do individuo, o seu "eu"
intrínseco, a sua personalidade indecifrável a priori, apenas
visível nas suas atitudes e comportamentos ou até o seu
background familiar e social e outras variáveis materializáveis
tais como o stock de activos, técnicas e competências adquiridas
pelos indivíduos durante um determinado período de tempo
ao longo de toda a sua vida.
É esse conjunto de variáveis que permite a obtenção
de determinado fluxo de rendimentos que é comparável ao
rendimento obtível com investimentos em outros activos.