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Até que ponto o contrato é negociável?
Já lá vai o tempo em que os contratos de
franchising eram assinados, depois de uma rápida leitura
prévia, à mesa das negociações.
Hoje em dia, os franchisados têm oportunidade de estudar
cláusula a cláusula. E de se informarem atempadamente
sobre o que é ou não negociável.
Ao contrário do que acontece em certos países
da Europa, como na Espanha e França, em Portugal o
contrato de franchising é um contrato atípico,
o que significa que não existe qualquer lei específica
que regule ou discipline o seu regime jurídico.
O princípio de liberdade contratual, consagrado no
Código Civil português, determina que as partes
têm a faculdade de fixar livremente o conteúdo
dos contratos, de celebrar contratos não previstos
na lei, de incluir nos contratos as cláusulas que entenderem
e até de reunir num mesmo contrato regras de dois ou
mais contratos, desde que o façam dentro dos limites
da lei.
Cada caso é um caso
Os juristas que habitualmente trabalham esta área são
unânimes em defender que a estrutura interna de um contrato
de franchising deverá ser sempre pensada em função
de cada caso concreto. É um erro cair na tentação
de adoptar minutas ou modelos contratuais pré-elaborados.
"Se as pessoas não entenderem isto dessa forma,
então é porque não entendem o espírito
do franchising", afirmam Paula Mendes e Rita Prates,
advogadas associadas da sociedade Abreu, Cardigos & Associados.
"É necessário um conhecimento muito profundo
de cada negócio para se poder fazer um contrato correcto",
adiantam.
Já dentro de uma rede, "é aconselhável
haver apenas um contrato único", indicam as mesmas
juristas. "Para além de ser mais fácil
para o franchisador controlar 30 contratos, todos, feitos
nos mesmos moldes, iria gerar grande confusão ter 30
franchisados a pagar, por exemplo, valores de royalties diferentes",
justificam.
O razoável como limite
Exactamente, que é que pode ser negociado num contrato
de franchising? Muita coisa, defendem os especialistas. "Há,
obviamente, pontos que são mais difíceis do
que outros, mas quando as questões são razoáveis,
digo, por experiência, que os franchisadores tendem
a aceitar as propostas apresentadas", refere Paula Mendes.
Então, que é que se entende por "razoável"?
Os exemplos são vários. Um dos aspectos em que
é comum os franchisadores levantarem entraves prende-se
com a questão da cessão e doação
dos direitos.
Num franchising, ao contrário do que sucede com outro
tipo de negócios, não é, por regra, possível
em caso de doença ou de morte transmitir aos herdeiros
ou vender a terceiros a participação numa marca.
Isto porque os contratos de franchising são celebrados
intuitu personae, ou seja, o franchisador concede o franchising
em atenção às características
pessoais, empresariais, económicas e morais da pessoa
do franchisado.
Mas um franchisado informado pode, com relativa facilidade,
tentar contornar este aspecto "exigindo, por hipótese,
que, caso venha a falecer, os seus herdeiros recolham algum
benefício, negociando um valor mínimo pelo qual
o franchising possa ser vendido, até ao próprio
franchisador", indicam Paula Mendes e Rita Prates.
Outro caso possível passa pela negociação
dos valores do franchising, aliás um dos pontos que
praticamente todos os franchisados tentam regatear (ver "Top
5 das exigências"). É quase impossível
que um franchisador aceite, por exemplo, negociar em absoluto
o valor dos royalties. "Mas já se o franchisado
sugerir um valor mais baixo para os primeiros seis meses ou
mesmo uma isenção para esse período inicial,
há casos em que é possível ter sucesso."
Mais concorrência, maior flexibilidade
O aumento da concorrência, com a entrada de um número
crescente de marcas no mercado, foi um dos factores que veio
contribuir para o aumento da flexibilidade negocial por parte
dos franchisadores. Paula Mendes ainda se recorda de quando,
"há uns anos, os franchisadores chegavam ao cúmulo
de apresentar contratos perfeitamente leoninos com um capítulo
dedicado aos 'direitos do franchisador e outro às obrigações
do franchisado'".
Do lado dos franchisados, o nível de informação
pode revelar-se fundamental na condução de uma
negociação bem-sucedida. "Costumo mesmo
dizer que um contrato é tanto mais negociável
quanto maior conhecimento o franchisado tem daquilo que é
o franchising", adianta a jurista (ver "Cinco dicas
fundamentais").
Contrariando a ideia de que os franchisadores preferem seleccionar
franchisados que não percebam muito do universo do
franchising, Paula Mendes e Rita Prates asseguram que no Brasil
há inclusivamente redes que impõem como condição
de adesão a frequência de cursos da especialidade.
"É que assim torna-se muito mais fácil
negociar", explicam.
Não se intimide
Quem olha pela primeira vez para um contrato de franchising
não deixa de sentir uma certa apreensão. "Para
um leigo, este tipo de contrato pode, de facto, parecer assustador",
reconhece Paula Mendes. O segredo está em não
se deixar intimidar.
Hoje em dia, é comum os franchisados terem acesso ao
contrato com muito mais antecedência do que sucedia
há uns anos. "Havia marcas que entregavam aos
franchisados contratos volumosos, cheios de anexos, e lhes
sugeriam que lessem e assinassem na própria altura",
recorda a jurista.
Actualmente, a ética e a deontologia falam mais alto
e os franchisados dispõem de todo o tempo necessário
para ler e reler as minutas propostas pelo franchisador. Em
certos casos, é aconselhável recorrer aos serviços
de um advogado que trabalhe esta área. Quem melhor
do que um especialista para indicar no concreto o que pode
ou não - e como - exigir do franchisador?
MARGARIDA RODRIGUES
Fonte: texto adaptado da revista Negocios
& Franchising do IIF-Instituto de Informação
em Franchising.