Paula R. Santos
EMPREGADORES, representantes dos trabalhadores e analistas estão
de acordo: é urgente apostar na formação da mão-de-obra
de um sector que já contribui com 13 mil milhões de euros
para o PIB nacional, mas que poderia contribuir com muito mais. O sector
é o do turismo, e emprega mais de 500 mil pessoas.
«A formação é o grande
calcanhar de Aquiles», aponta Atílio Forte, presidente
da Confederação do Turismo Português (CTP), que
agrupa todas as entidades empregadoras que actuam nesta área,
desde a hotelaria, à restauração, passando pelas
agências de viagens e companhias aéreas.
Esta semana, a CTP levou as suas preocupações até
ao ministro do Trabalho, Vieira da Silva, e recebeu a garantia de «um
forte empenhamento do Governo» na implementação
do Plano Estratégico para o Desenvolvimento dos Recursos Humanos
no Turismo (ver caixa), adiantou Atílio Forte. Este plano, uma
iniciativa da Confederação que conta com o apoio de quatro
ministérios (Trabalho, Economia, Ensino Superior e Educação)
e das duas centrais sindicais (CGTP e UGT), pretende pôr ordem
na formação profissional no espaço de uma década.
Por enquanto, o cenário não é muito animador. «É
um sector com muitas carências profissionais. Cada vez há
mais pessoas a trabalhar, mas menos formação. E a formação
que existe é muito maltratada», critica Rudolfo Caseiro,
presidente do Sindicato dos Trabalhadores na Hotelaria, Turismo, Restaurantes
e Similares do Sul.
Além disso, o excesso de mão-de-obra barata e pouco qualificada
acaba por ditar os patamares salariais. «Os poucos profissionais
qualificados que vão surgindo, não encontram em Portugal
ordenados compatíveis com a sua formação e acabam
por partir para o estrangeiro, principalmente para a Alemanha, Suíça
ou Inglaterra», refere o sindicalista. «Um cozinheiro
profissional, de um hotel de quatro estrelas, em Portugal, ganha em
média cerca de 850 euros. No estrangeiro recebe quatro vezes
mais, na ordem dos 3.400 euros», exemplifica.
Também Licínio Cunha, investigador e docente da Economia
do Turismo, na Universidade Lusófona, destaca o «número
insuficiente de profissionais altamente qualificados» nesta
área. Isto apesar de existir «um número razoável
de cursos - mais precisamente 47 cursos superiores e politécnicos
-, mas de qualidade insuficiente», reforça o professor.
«A quase totalidade dos cursos foi concebida, mais por conveniência
dos institutos que os criaram, do que em função das necessidades
do mercado do trabalho», sublinha Licínio Cunha. Uma
ideia reforçada por Atílio Forte, lembrando que uma grande
parte das entidades formadoras tem feito «um aproveitamento
dos fundos nacionais e da União Europeia», sem olhar
às reais carências do sector.
Uma filosofia de gestão de recursos humanos que não se
compadece com as actuais exigências do turismo. «A actividade
turística está cada vez mais exigente e necessita de pessoas
que assumam lugares de gestão qualificada», aponta
Licínio Cunha. «As câmaras municipais, por exemplo,
que são provavelmente a força mais influente no turismo
português, não têm, na sua maioria, pessoas qualificadas
nesta área», critica o docente.
Um estudo realizado pelo Centro de Investigações Sociais
e Empresariais (CISE) da Universidade Lusófona e coordenado por
Licínio Cunha mostra que as motivações dos turistas
estrangeiros que visitam Portugal vão além das praias
algarvias, existindo muita apetência para o chamado turismo no
espaço rural. O inquérito feito a 5.040 visitantes, de
dez nacionalidades, à chegada a Portugal, revelou também
que a maioria dos turistas tem habilitações académicas
de nível superior, o que lhes confere um maior grau de exigência
no atendimento e nos serviços prestados.
Joaquim Fernandes lida diariamente com estes turistas «culturalmente
ricos», como lhes chama. Há dez anos, o guia turístico
trocou o jornalismo pelas paisagens deslumbrantes da Serra da Estrela,
que partilha entusiasticamente com grupos de visitantes, essencialmente
de Espanha, França e Reino Unido.
«São pessoas com um grande 'background' cultural e que
querem descobrir a História de Portugal passeando a pé
e embrenhando-se na natureza», conta Joaquim Fernandes, que
está em constante formação. Os circuitos pedestres
que se prolongam pelas aldeias históricas, leva os turistas a
questionar não só aspectos da fauna e flora da região,
mas dos monumentos e do ambiente envolvente.
«Em Portugal, a formação que é dada aos
profissionais do turismo é muito pobre e não é
pertinente. Os turistas não querem saber em detalhe toda a história
de um monumento, mas antes inserir o monumento dentro de um contexto»,
resume Joaquim Fernandes.
Mão-de-Obra mais 'vigiada'
Até 2015, a Confederação do Turismo Português
espera que todos os trabalhadores do sector passem a ter carteira profissional.
O plano pretende ainda elevar o grau de habilitação mínima
para estes profissionais, fixando-o no 12.º ano de escolaridade.
Numa primeira etapa, pretende-se apurar as reais necessidades do mercado
ao nível da procura de mão-de-obra qualificada. Parte-se
depois, e em termos gerais, para a definição dos perfis
profissionais e pela reestruturação e certificação
dos cursos técnicos e académicos.