Marisa Antunes
Não correram os 100 metros, nem a meia-maratona mas o espírito foi exactamente o mesmo dos Jogos Olímpicos de Pequim: ser o melhor entre os melhores. Durante três dias, a 1ª edição do evento Euroskills 2008, realizado em Roterdão, juntou 434 jovens, escolhidos a dedo nos seus respectivos países (estiveram 28 em concurso), para mostrarem quão bons são nos seus ofícios.
Nestas autênticas Olimpíadas das Profissões, enfermeiras, cabeleireiras, floristas, vitrinistas, cozinheiros, estiveram em acção, cronometrados ao minuto, a tentar desempenhar depressa e bem os desafios-mistério que lhes eram impostos durante esses três dias. Nos 50 mil metros quadrados do centro de congressos, da cidade holandesa, construíram-se troços de estrada, talhões de jardins, casas T0 que permitiram atestar a destreza e perfeição do trabalho dos carpinteiros, ladrilhadores, pedreiros, pintores, entre outros. Num outro «cluster» do recinto montavam-se carros e detectavam-se, a contra-relógio, avarias mecânicas. Logo ao lado, era preciso fazer a instalação de equipamentos de refrigeração numa cozinha, pouco mais à frente dava-se oportunidade aos «web designers» para brilharem na secção de «media», enquanto na área exterior faziam-se ferraduras «in loco» e colocavam-se nos respectivos cavalos.
Ao todo, foram cerca de 50 saídas profissionais que estiveram em exposição, com profissionais de carne e osso a demonstrarem perante milhares de pessoas, em especial a jovens, o exercício da sua profissão. Levado muito a sério pelas autoridades holandesas, a abertura do evento contou, entre outros, com a real presença da princesa Máxima da Holanda e do comissário europeu da Educação e da Cultura, Jan Figel.
A participação portuguesa, composta por oito jovens com idades até aos 25 anos, foi coordenada pelo Instituto do Emprego e Formação Profissional (ver caixa) que os seleccionou com base na sua boa «performance» nos centros de formação espalhados pelo país. E foi bem escolhida esta comitiva lusa. António Nabais, Joana Monteiro, Sandra Cordeiro, Filipe Barbosa, Ruslan Tutunaru, Tiago Soveral, José Correia e Alberto Miranda viveram dias intensos de competição com os concorrentes de outros países, mas também tiveram a oportunidade de trabalhar em equipa, num intercâmbio profissional e cultural que lhes permitiu enriquecer a sua experiência e trazer para Portugal três medalhas de ouro e várias outras distinções.
António Nabais, ex-formando do Centro de Formação Profissional de Castelo Branco, sagrou-se Campeão Europeu do Euroskills Roterdão com uma medalha de ouro na profissão de Frio e Climatização. O jovem recebeu também uma medalha de bronze por prémio em equipa e o galardão ‘The best of the best' atribuído pela Associação Europeia de Ar Condicionado e Refrigeração.
Além de António, também Joana Monteiro e Sandra Cordeiro, as duas jovens profissionais de «visual merchandising», mostraram em Roterdão o seu valor trazendo para casa uma medalha de ouro individual pelo seu desempenho. Igual distinção mereceu Bruno Medeiros, formado em carpintaria de limpos, que além da medalha de ouro individual foi o segundo melhor pontuado no conjunto de 434 concorrentes. Luís Vaz (electricidade e instalações) e Luís Filipe Barbosa (mecatrónica auto) arrecadaram medalhas de bronze individuais e de equipa, enquanto Tiago Soveral e Vasco Vaz, ambos de electrónica industrial alcançaram o quatro lugar no concurso e receberam o prémio excelência de trabalho em equipa.
A delegada oficial portuguesa, Conceição Matos, lembra que, para alguns, à semelhança do que tem acontecido nas edições internacionais dos Jogos das Profissões, essa experiência vai ainda mais além: “Este tipo de eventos representa também uma excelente oportunidade de carreira, pois muitos deles acabam por receber propostas de emprego e de estágios em várias partes do mundo”. Foi de facto o que sucedeu a António Nabais que regressou já com uma proposta de emprego.
Mudar mentalidades
Carlos Vintém, do IEFP, que acumula também as funções de membro de direcção da entidade que organiza estas olimpíadas das profissões, a ESPO (European Skills Promotion Organisation) reforça, salientando que estas iniciativas contribuem para enaltecer a importância das profissões técnicas para as economias europeias: “Existem profissões técnicas muito bem pagas e em grande falta no nosso país. Mas mudar mentalidades leva tempo e muitas vezes a culpa nem é do jovem, mas da família que o impede de seguir uma profissão mais manual”.
Determinado, Filipe Barbosa, um dos jovens candidatos, não se deixa de todo influenciar. Tendo entrado num curso superior, cedo se desiludiu com tanta teoria e resolveu procurar o que buscava na área da mecânica, num curso mais prático. “Continuo em Engenharia Mecânica no Instituto Superior de Engenharia de Lisboa — estou no segundo ano —, mas fiquei muito satisfeito com a formação técnica em mecatrónica que realizei no Centro de formação Profissional Automóvel”, conta o jovem. Um curso que lhe abriu as portas da Auto-Europa.
A área da mecatrónica é precisamente uma das que mais se destacam em Portugal, ao nível da procura por parte das entidades empregadoras, como refere José Leitão, director do departamento de Formação Profissional do IEFP. Mas não só. “Continua a haver muita saída nas áreas do sector terciário e também nos chegam muitos pedidos aos centros de formação para os sectores mais industriais, ao nível das novas tecnologias, no ramo automóvel e ainda ao nível do design, em especial o design de moda”, acrescentou ainda ao ExpressoEmprego.
Na senda do Euroskills, a presidência francesa da União Europeia tem planos já para o próximo mês. Sarkozy convidou 10 mil jovens, muitos deles participantes no evento que se realizou na Holanda, para fazerem parte de uma nova jornada de promoção e divulgação das profissões intermédias. Porque é neles que assenta o futuro e o sucesso das economias, conforme salientou o comissário europeu, Jan Figel.
A um passo da meta
Presente no Euroskills 2008, Francisco Madelino, presidente do Instituto do Emprego e Formação Profissional falou da importância da formação profissional para inverter os níveis do desemprego em Portugal.
Expresso: Este evento demonstra bem o papel que os profissionais das áreas mais técnicas desempenham nas economias europeias. Em Portugal, um maior enfoque nesta área poderia ser uma saída para inverter a crise de emprego?
Francisco Madelino: A formação profissional é uma saída fundamental para resolver este problema do desemprego em Portugal. Uma boa parte dos países da União Europeia leva já um relativo avanço nesta matéria: 50% dos alunos do ensino secundário estão direccionados para a via profissional, que no entanto, não lhes impede também o acesso ao ensino superior. Em Portugal, só a partir de 1986, com a entrada comunitária, se abordou a questão. Há uma década não havia mais de 10% dos alunos na via profissionalizante e há ano e meio eram já 30%.E continuamos no bom caminho para atingir a meta que se pretende dos tais 50%.
Exp: Traduzido em números…
F.M.: Dos cerca de 340 mil alunos do secundário atingir uma fasquia entre os 160, 170 mil estudantes nas áreas de formação profissional.
Exp: E o que se pode fazer para atingir essa meta?
F.M.: Primeiro é preciso ultrapassar a ideia instalada em muitas pessoas que a formação profissional é uma opção de segunda. As formações intermédia são muito procuradas e a pressão da remuneração em áreas como a climatização, electricidade ou manutenção de equipamentos industrias é superior a muitos cursos teóricos do ensino superior. Por outro lado, é preciso ver que em muitos países europeus existe o chamado sistema de alternância em que parte da formação dos estudantes é feita nas próprias empresas. Na Alemanha, por exemplo, as empresas abrem todos os anos um milhão de vagas para admitir estes alunos.