Cátia Mateus
Combater os efeitos da crise nas empresas passa, e muito, pela habilidade do gestor em converter a gordura das organizações em músculo. Sim, leu bem. As organizações também podem ser obesas e com este peso excessivo perderem a sua capacidade de gerar valor e, com isso, a competitividade. A analogia pode parecer caricata mas faz parte de um dos princípios do Lean Thinking (pensamento magro), um modelo de gestão que soma já mais de 50 anos mas só agora começa a ganhar notoriedade entre as empresas portuguesas, fruto do sucesso que já alcançou em organizações como a Toyota. Em ano de contenções várias, pensar lean pode ser o caminho para vencer a crise.
“Nas organizações nada se perde, tudo se transforma”, defende João Paulo Pinto responsável pela Comunidade de Lean Thinking em Portugal. Mas para o especialista, o maior problema de uma organização é quando a maioria dos inputs se transforma em desperdício, comprometendo seriamente a competitividade dos negócios e levando os clientes a pagar mais do que o esperado por um produto ou serviço. “O que a filosofia lean faz é identificar as diversas formas de desaproveitamento e, após isso, delinear estratégias que visam a sua remoção”, explica.
Este modelo de gestão magra orienta-se por vários princípios (ver caixa) e João Paulo Pinto assegura que “o Lean Thinking é o antídoto para a crise”. A Comunidade Lean Thinking em Portugal tem vindo a realizar um esforço de divulgação deste conceito quer através do seu sítio em www.leanthinkingcommunity.org, quer através da realização de workshops, mas também pela via da investigação e da transferência de conhecimentos para o mundo académico e empresarial. De uma forma global, as empresas parecem estar segundo o especialista a aderir ao conceito e a compreender as suas reais potencialidades.
“Se uma empresa luta para ser competitiva, o Lean fornece-lhe as ferramentas e metodologias necessárias para, por exemplo, eliminar o desperdício (burocracias, stocks, defeitos, paragens e avarias), criar valor (porque apenas o valor justifica o tempo, o dinheiro e a atenção que dedicamos a algo)", explica. Como? O processo parece assentar apenas no envolvimento sistemático de todas as pessoas da cadeia de valor numa lógica de Going Lean. Por esta via é possível difundir a teoria da gestão magra em toda a organização. Uma estratégia facilitada pelo facto das ferramentas e metodologias utilizadas serem muito simples e produzirem resultados a todos os níveis, sem se basearem em complexos sistemas informáticos.
Trata-se de uma abordagem inovadora às práticas de gestão pela via do estabelecimento de relações de mútuo benefício (win-win) entre os diversos intervenientes da cadeia de criação de valor. Procurando a perfeição dos processos, o Lean sustenta-se numa atitude de permanente insatisfação e melhoria contínua, fazendo do tempo uma arma competitiva. O ponto de partida é o reconhecimento de que apenas uma pequena fracção do tempo e esforço de uma organização é convertida em valor real e uma vez delimitado o valor de um produto ou serviço na perspectiva do cliente, todas as actividades que não o acrescentem devem ser eliminadas.
Não é fácil determinar o momento exacto da entrada do Lean Thinking em Portugal, mas João Paulo Pinto acredita que o conceito chegou a terras lusas nos finais dos anos 80, pela mão da indústria automóvel até porque esta teoria deve grande parte do seu desenvolvimento à Toyota Motors Corporation. Desde então a sua aplicação a outros sectores de actividade como a metalomecânica, calçado, têxtil, saúde e até administração local tem sido uma realidade.
O especialista afiança que “há inúmeros exemplos de implementações Lean bem sucedidas na indústria e nos serviços em todo o mundo. Em Portugal, a Comunidade de Lean Thinking já teve oportunidade de fazer várias implantações e os resultados na indústria variam de um para dez. Por cada euro investido, o retorno ronda os dez euros”.
Crente de que esta filosofia de gestão terá um futuro promissor em Portugal e que pode ajudar muitas empresas a minimizarem os efeitos da crise, João Paulo Pinto enfatiza a ideia de que a crise se pode combater através de uma justa e eficiente cadeia de criação de valor, sem desperdícios. Só por esta via é possível reforçar a competitividade das organizações e promover o desenvolvimento das nações, numa lógica de melhorias contínuas e incessantes.
Princípios do pensamento Lean
1. Conhecer o cliente (stakeholder)
2. Criar valor para cada um dos stakeholders do negócio
3. Analisar a cadeia de valor, ou seja, a sequência de actividades e processos envolvidos na cadeia de valor
4. Optimizar os fluxos (sejam eles de materiais, informação, pessoas ou capital) porque sempre que há estagnação há valor que se perde
5. Adoptar uma lógica pull, ou seja, deixar o cliente dar início aos processos, actuando apenas quando é necessário e não numa lógica de just in case
6. Alcançar a perfeição nos processos de eliminação dos desperdício e na criação de valor
7. Inovar constantemente