Ruben Eiras, em Sestri Levante, Itália
Com um maior enfoque na normalização, a
indústria de formação à distância começa
a entrar na sua fase de maturidade.
O que são 'standards'?
A ADOPÇÃO de normas na construção
de conteúdos e aplicações de "e-learning"
irá dominar o desenvolvimento da indústria de formação
à distância europeia no presente ano.
A tendência confirmou-se na E-learning Results Summit 2003, um evento
que na semana passada reuniu durante dois dias a "nata" das
mais altas entidades internacionais de normalização e certificação
na área do "e-learning", realizado em Sestri Levante,
uma das vilas que salpicam a Riviera italiana, a cintura costeira do norte
da península banhada pelas águas calmas e cálidas
do Mediterrâneo.
O certame foi organizado pela Giunti Interactive Labs, a empresa de "e-learning"
da Giunti, o maior grupo editorial italiano.
Para o leitor que não está familiarizado com este tema,
o recente despertar da Europa para a questão das normas (ou standards)
- um conjunto específico de características que um produto
ou processo deverão exibir - de "e-learning" é
uma reacção à liderança americana nesta área.
No caso da formação à distância via electrónica,
as normas a serem cumpridas situam-se nos domínios tecnológico
e pedagógico, tanto no desenho das plataformas tecnológicas
como nos conteúdos.
Actualmente, na indústria do "e-learning" existem cerca
de 12 organizações que estão a trabalhar na criação
de "standards" para o sector, sendo a maioria norte-americanas.
Quando estes ficarem definitivamente estabelecidos, serão os critérios
que pautarão a actividade de todas as pessoas envolvidas na indústria
de "e-learning" (ver caixa).
Dentro das várias organizações que estão a
desenvolver iniciativas de normalização as quatro maiores
são a Aviation Industry CBT (Computer-Based Training) Committee
(AICC), a ADLNet - Advanced Distributed Learning (ADL) Sharable Content
Object Reference Model (SCORM), o Institute of Electrical and Electronics
Engineers (IEEE) Learning Technology Standards Committee (LTSC) e o IMS
Global Learning Consortium, Inc. (IMS). Da Europa, só se destaca
até ao momento o ARIADNE, um conjunto de especificações
pedagógicas e multilinguísticas.
No entanto, neste momento não existe um consenso estabilizado sobre
os "standards", mas o SCORM - desenvolvido pelo Departamento
de Defesa dos EUA - é o conjunto de normas com maior adopção
nos mercados avançados de "e-learning", como o francês
ou o norte-americano.
IMS gera consenso
Todavia, começam a emergir alguns sinais de convergência
entre o Velho Continente e os EUA, através da centralização
no desenvolvimento das normas agregadas no IMS.
O discurso da maioria dos intervenientes na E-learning Results Summit
2003 - incluindo o do Conselho Europeu de Normalização (CEN)
- aparentou indicar uma maior aceitação deste corpo de "standards".
As razões invocadas são a sua maior flexibilidade e capacidade
de customização dos conteúdos às especificidades
culturais, linguísticas e industriais de um sector ou país.
Um factor crítico para a Europa, dada a sua diversidade linguística.
"Normalizar o 'e-learning' não significa que todos vão
passar a fazer as mesmas coisas, castrando a criatividade", ressalva
Edward Walker, CEO do IMS. "Significa, primeiro, que os sistemas
devem ser interoperáveis, ou seja, as aplicações
de 'e-learning' conseguem partilhar todos os conteúdos e localizar
todos os dados", explica.
Aquele responsável acrescenta ainda que a normalização
do fabrico dos conteúdos e das aplicações de formação
à distância é um garante da sua qualidade, já
que obrigará os produtores a incluírem a utilidade e a acessibilidade
como características "sine qua non" dos seus produtos.
"Caso contrário, os seus conteúdos ficarão
excluídos do mercado, porque não cumprem as normas",
esclarece Edward Walker.
Uma opinião que não é partilhada por Roberta Stock,
presidente do Q PLC Group, uma empresa britânica de formação
e que também foi oradora no certame. "Os 'standards' actuais,
como o SCORM, são limitadores da criatividade e estão a
espartilhar a indústria. Se continuarmos neste caminho, vamos regredir
25 anos no campo pedagógico. Por exemplo, como é que se
podem aplicar normas de sequenciamento de conteúdos numa simulação,
quando a interacção deste tipo de conteúdo com o
formando é totalmente aleatória e caótica?",
indaga aquela especialista.
Uma pergunta para a qual ainda não existe resposta. Frabicio Cardinali,
CEO da Giunti Interactive Labs e membro do corpo directivo do IMS, adopta
uma posição intermédia: "Para os conteúdos
e aplicações onde é possível aplicar as normas,
deveremos fazê-lo. Quanto aos restantes onde tal ainda não
se verifica, é continuar o esforço de investigação
e desenvolvimento". Uma filosofia seguida pela empresa italiana,
que o EXPRESSO irá revelar na próxima semana, numa entrevista
exclusiva para Portugal com Frabicio Cardinali.
O que são 'standards'?
AS INICIATIVAS de criação de 'standards'
têm centrado a sua acção sobre o desenvolvimento de
conteúdos e o seu processo de descoberta, a portabilidade de formação
baseada em computador, a interoperabilidade do conteúdo produzido
por diferentes vendedores, a sequenciação de cursos, a integração
de conteúdo em sistemas de gestão da aprendizagem, metadados
(descrição e indexação) dos objectos de aprendizagem
e protocolos de intercâmbio de dados.
Os 'standards' são referidos como sendo cruciais para a flexibilização
e crescimento da indústria de 'e-learning', cujos actores se estão
a esforçar para assegurar um desenvolvimento integrado. As iniciativas
de normalização focalizam-se basicamente em três aspectos:
- Portabilidade do conteúdo - quando o conteúdo é
separado do sistema de fornecimento proprietário, a organização
pode consolidar, organizar e conceber as suas iniciativas de 'e-learning'
no sistema de gestão da aprendizagem (LMS) da sua escolha. Isto
possibilita a customização dos conteúdos, logo há
maior flexibilidade e menores custos operacionais para as empresas.
- Granularidade - as novas especificações suportam a metodologia
do objecto de aprendizagem permitindo a inclusão de unidades de
informação mais pequenas e actualizadas. Os objectos de
aprendizagem adicionam o 'just-enough' à aprendizagem 'just-in-time'.
- Interoperabilidade - a aplicação de interoperabilidade
começa quando diferentes aplicações de 'e-learning'
conseguem partilhar conteúdo e localizar dados. Estas especificações
abrem a possibilidade de trocar e aceder a conteúdos.
Actualmente, os conjuntos de normas que estão a ser adoptados pela
maioria dos produtores de conteúdos são as do SCORM e do
IMS. A Saf-Novabase está neste momento desenvolver um projecto
de investigação que visa retratar a adopção
das normas SCORM no mercado português.
A iniciativa é financiada pelo Programa Operacional de Emprego,
Formação e Desenvolvimento Social (POEFDS) e segundo Mário
Figueira, administrador da Saf-Novabase, os resultados serão divulgados
no final deste ano.