Liete Lajas
O PERCURSO de João Cantiga Esteves
poderia comparar-se ao de tantos outros licenciados em Economia, não
fosse a sua paixão emergente pelos produtos derivados - contratos
a prazo em que ambas as partes, compradores e vendedores, acordam a troca
de um activo (por exemplo, mercadorias como crude ou água).
Bloco de notas
Empreendedorismo em Portugal
Desde sempre associado a várias empresas, assumindo
cargos de administração, é do outro lado do Atlântico,
nos EUA, que este também professor universitário, "Master
of Science" (MSc) em Planeamento Económico e com um MBA em
Finanças Internacionais descobre o seu verdadeiro prazer, o mundo
dos derivados.
Na altura, na década de 80, esta era uma área pouco desenvolvida
em Portugal - despontou há menos de dez anos -, mas que João
Cantiga Esteves estudou e trabalhou, por mais de oito anos, no "país
das oportunidades".
Daí em diante o seu trajecto estava delineado. A proposta para
liderar um projecto de abordagem de risco em Portugal surgiu e Cantiga
Esteves não recusou o desafio. "A iniciativa é muito
importante. Uma pessoa que trabalhe, como foi o meu caso, há vários
anos associado a empresas, é um imperativo avançar e, sobretudo,
construir para nós o que realizámos para outros. Senti essa
necessidade, era um desafio e as pessoas têm de ter coragem, têm
de assumir riscos".
Assim, com a sua experiência, os contactos adquiridos e algumas
parcerias internacionais, a par do núcleo de accionistas e as restantes
pessoas em contexto empresarial, a Ephi-Ciência Financeira começa
a ganhar forma. O seu objectivo: "afirmar-se no panorama empresarial
português como uma empresa totalmente vocacionada para a cobertura
de riscos".
Um projecto ambicioso, mas viável segundo o "partner",
já que, no início do século XXI, a incerteza e a
volatilidade crescente dos mercados obrigam as empresas a confrontarem-se
diariamente com diversos tipos de riscos financeiros, dificultando substancialmente
a tarefa dos gestores.
A abordagem do risco sistemático, dividida em três grandes
áreas - preço de matérias-primas ("commodities"),
câmbio e taxas de juro -, será a oferta que a Ephi-Ciência
Financeira propõe às empresas portuguesas.
Mas em que consistem estes riscos? "É a incerteza em diversas
variáveis da empresa, que na prática se traduz na flutuação
da rentabilidade, dos 'cash-flows' e da competitividade perante os diversos
concorrentes", explica João Cantiga Esteves.
Aquele empreendedor passa a explicar o funcionamento do negócio:
"Por exemplo, se uma entidade decide adquirir uma determinada
quantidade de barris de petróleo a 30 dólares cada um no
mês de Junho, independentemente do preço subir ou descer,
a encomenda é vendida naquele valor estabelecido".
Segundo este especialista, muitas empresas justificam os seus maus resultados
pela ambiguidade dos mais variados factores, como o preço do barril
de Brent ou a cotação do dólar. "A tradição
do risco em Portugal ainda é inexistente. É algo que assusta
os gestores e, mais grave ainda, é o facto de muitos deles não
saberem em que consiste. O turismo é um claro exemplo de uma área
de negócio utilizadora destes novos instrumentos de 'hedging'.
É volátil e depende das condições climatéricas.
Para uma empresa que gere uma estância de esqui, o maior risco é
não haver neve", acrescenta.
Sinónimo da relevância da abordagem dos riscos e influência
nos lucros é a clara receptividade do tecido empresarial português.
"As organizações sentiam algum desespero ao serem
confrontadas com problemas que não eram o seu 'core-business'.
Ficámos com a sensação de que os gestores possuíam
a percepção destes problemas mas não tinham soluções".
Centrada nas pequenas e médias empresas, a consultora divide os
seus clientes por áreas de negócio, nomeadamente metais,
produtos agrícolas e energia. As empresas industriais e comerciais,
importadoras e exportadoras, dado que são confrontadas diariamente
com a volatilidade das matérias-primas, são as que mais
procuram uma solução de risco.
Perante o actual cenário do mercado português, João
Cantiga Esteves é peremptório ao referir que "o
nosso projecto foi todo ele muito bem pensado. Consideramos que 2003 vai
ser um bom ano para a empresa".
Bloco de notas
- As funções de patrão e
empregado apresentam diferenças significativas, mas ambas são
importantes. Em Portugal seria bom que os jovens aderissem à vida
de empresários;
- A sociedade depende da criação de empresas, pois
existe a necessidade de produção de riqueza. Portugal não
é excepção e há espaço suficiente,
é preciso apostar "com garra";
- O processo burocrático extremamente pesado ainda é
uma das dificuldades sentidas. Os problemas surgem e as pessoas não
devem inibir-se;
- Desenvolver o espírito de iniciativa. Em Portugal é
necessário que os jovens adiram ao empreendedorismo, porque a própria
solução de emprego passa por aí. Além disso,
as pessoas trazem do estrangeiro muitas ideias inovadoras, que se tornam
uma mais-valia para o país;
- Ter a percepção de que existem riscos. Se possível,
devemos quantificá-los, percebê-los, não meter "a
cabeça na areia", mas estarmos cientes que o risco é
um facto;
- Encarar a empresa como um projecto, como algo com continuidade,
a longo prazo.
- Ter a consciência de que a empresa é, de facto,o
"sangue" que deve correr na sociedade portuguesa