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Empresas apostam na formação técnica

12.09.2003


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Ruben Eiras

Os empresários nacionais querem desenvolver
mais competências técnicas e a força de trabalho intermédia e operacional, com o objectivo de aumentar a qualidade, a eficácia e a eficiência dos processos produtivos


O MERCADO da formação em Portugal está a dar alguns sinais de mudança. Os últimos indicadores revelam que as empresas portuguesas vão apostar em grande força na formação de quadros técnicos.

De acordo com o último inquérito às necessidades de formação profissional das empresas, realizado pelo Departamento de Estatística do Trabalho, Emprego e Formação Profissional (DETEFP) do Ministério do Trabalho e Solidariedade, as entidades inquiridas perspectivam formar cerca de 193.700 pessoas para funções técnicas e profissões de nível intermédio.

O segmento com a segunda maior aposta é o dos "Operários, Artífices e Trabalhadores Similares", com cerca 145.300 pessoas.

Em contraste, a camada dos dirigentes e quadros superiores é a antepenúltima escolha dos empresários para efeitos de formação. Segundo Luís Bento, vice-presidente da Associação Portuguesa de Gestores e Técnicos de Recursos Humanos (APG), esta é uma "tendência natural, passada que foi a euforia da formação para quadros superiores".

Para este responsável, o guinar das empresas para a aposta no desenvolvimento de técnicos de nível intermédio é resultante de uma das grandes lacunas do sistema educativo português: "Forma milhares de licenciados - futuros quadros superiores - e muito poucos quadros intermédios, por desadequação do ensino técnico-profissional".

Por isso, Luís Bento advoga que as empresas estão a aprender, "à sua própria custa", a não esperar que o sistema educativo supra as suas lacunas e "têm que ser elas próprias a cuidar das suas necessidades".

Joaquim Lavadinho, director-geral da HumanQuare, uma empresa de consultoria em recursos humanos, também partilha desta perspectiva e sublinha que "não é de estranhar", já que são as profissões que estão associadas mais directamente ao processo de trabalho.

"Tanto os técnicos intermédios como os operários são grupos profissionais que estão relacionados com o núcleo central das tarefas técnicas, a zona na empresa onde estão localizadas algumas das chaves da produtividade, além da área de gestão", sublinha aquele especialista.

Todavia, Luís Bento ressalva que esta é uma tendência "a ler com cuidado" nos próximos anos, "para ver se não é uma moda", mas se revela "bom senso e preocupações reais com a tessitura profissional" das empresas portuguesas.

Outro indicador de mudança nas opções de formação por parte das empresas portuguesas é que 84,6% dos trabalhadores serão formados na própria empresa, contrariando um movimento ainda recente de mandar as pessoas para fora da empresa.

Para o dirigente da APG, isto revela uma maior preocupação com a modalidade de formação-acção, isto é, formação em sala complementada com a do próprio posto de trabalho, "afinal o local onde as coisas verdadeiramente acontecem".

No que diz respeito aos domínios de formação, o inquérito do DETEFP perspectiva que o marketing e publicidade sejam as áreas de preferência por parte das empresas.

Para ambos os especialistas, este comportamento indica uma crescente preocupação dos empresários para criarem marcas próprias e se adequarem aos mercados e o serviço aos clientes.

Outro estudo do DETEFP, desta feita sobre a execução das acções de formação profissional, mostra que a percentagem de empresas com acções de formação subiu de 13,5% em 2000 para 17,1% em 2001.

Todavia, nenhum dos especialistas está convencido de que este indicador demonstre uma maior adesão dos empresários nacionais ao investimento nas competências dos seus trabalhadores.

"Os indicadores gerais revelam que só 18,8% dos trabalhadores ao serviço teve acesso à formação profissional. É um número baixíssimo", salienta Luís Bento.

E Joaquim Lavadinho frisa que, em função dos restantes dados, só existe uma aposta generalizada na formação profissional nas empresas de maior dimensão.

Com efeito, cerca de 71% têm mais de 250 empregados, sendo dominantes os sectores das "Actividades financeiras" ou "Produção e distribuição de electricidade, gás e água", com 59% e 56%, respectivamente.

"Além disso, a metodologia seguida em 2001 foi diferente - exclui o Sistema de Aprendizagem - da utilizada em 2000, pelo que os resultados não são verdadeiramente comparáveis", sublinha Luís Bento.

O maior investimento nas profissões intermédias está relacionado com o aumento a produtividade

O mesmo documento também revela uma quebra no número de participantes e na duração média de horas na formação. Mas também aumentou o número de acções formativas.

Para Joaquim Lavadinho, a diminuição do número de participantes nas acções de formação em 2001 pode ser explicada pelo facto de ter "diminuído o número de acções de formação frequentadas por um mesmo trabalhador".

O dirigente da APG acrescenta ainda que este comportamento do mercado significa "claramente um desinvestimento na formação mais qualificante" e o predomínio de acções de curta duração, "exactamente aquelas destinadas ao lançamento de novos produtos e serviços".

Isto porque, de acordo com aquele responsável, a crise económica fez disparar os portefólios de produtos das empresas financeiras (bancos e seguradoras).

Mas Luís Bento contrapõe que estes dados também podem significar um movimento consistente de segmentação da formação, adequando os conteúdos e a duração às realidades de trabalho.

Joaquim Lavadinho também concorda, referindo que "a redução do número médio de horas por acção formativa e o crescimento do número de acções pode significar a existência de uma procura mais diversificada de conteúdos por parte das empresas, como também uma melhor estruturação no que respeita a cargas horárias".

No entanto, Luís Bento aconselha uma análise cautelosa. "Vamos esperar pelos dados de 2002 para podermos analisar com mais profundidade e verificar se é esta a tendência. Se efectivamente isso acontecer é um bom sinal de robustez para os sistemas de formação das empresas", remata.





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