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Educação pouco empreendedora

08.02.2003


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Ruben Eiras

PORTUGAL é o único país da UE cujo Governo não mostra qualquer compromisso político para incluir o empreendedorismo no sistema educativo.


A conclusão é da Comissão Europeia, num recente relatório de um grupo de peritos sobre as iniciativas de educação e formação para o desenvolvimento do espírito empreendedor.

A equipa de investigadores elaborou a análise com base num conjunto específico de indicadores-chave. Foram retratados o ensino do empreendedorismo no básico e secundário, a formação de professores na temática, a cooperação entre escolas e empresas na promoção da capacidade de iniciativa e as disciplinas e actividades nesta área no segmento universitário.

De acordo com os resultados daquela pesquisa, a maioria dos Estados-membros demonstra vontade política a nível governamental para promover o ensino do empreendedorismo a vários níveis do sistema de educação.

Todavia, em Portugal, o cenário é totalmente o oposto.
Segundo aqueles especialistas, as acções que estão a ser desenvolvidas - seminários e visitas, por exemplo - pelos ministérios da Educação e da Economia, como as das organizações privadas com ligações estreitas a instituições educativas, estão totalmente separadas do sistema educativo nacional.

"O empreendedorismo é um tema novo e todos nós sabemos que o nosso sistema de ensino é extremamente renitente a incorporar, no seu corpo disciplinar, as contribuições que vêm da vida prática e, muito particularmente, da vida empresarial", refere Mário Ceitil, docente na Universidade Lusófona e director-geral da Cegoc.

"Não podemos praticar um tipo de ensino assente em métodos de aprendizagem tradicionais, que estimulam a memorização, a incorporação apócrifa e acrítica de conhecimentos e a assimilação passiva de valores", critica.

Com efeito, a passividade atravessa toda a estrutura educativa. O relatório europeu indica que no ensino primário não existem "quaisquer medidas específicas para promover o empreendedorismo" e que as iniciativas para desenvolver as competências empreendedoras nas escolas secundárias possuem "uma aplicação limitada e ocasional".

Contudo, o documento enfatiza que é crucial fomentar o espírito empreendedor neste último grau de ensino, para servir de "semente" na futura vida profissional dos jovens trabalhadores e na sua passagem para o ensino superior.

A nível universitário, o panorama já é mais animador. O estudo realça que já prosperam uma série de programas de formação avançada em gestão e empreendedorismo - ainda que de uma forma descoordenada -, os quais são frequentados por potenciais empresários e alguns professores.

Para inverter esta situação, Mário Ceitil defende que o ensino deve ser exigente, provocatório e criar no aluno o sentimento do risco da "não-aprendizagem". "A vida não é fácil. E, portanto, a aprendizagem para a vida também não o deve ser. Por isso, os alunos têm que ser instados a dar o melhor de si e a sentir a 'dor' de conseguirem ser criativos e originais", reforça.

Só que para realizar esta mudança de mentalidade nos estudantes, a do corpo docente também tem de seguir o mesmo caminho. Ricardo Luz, director da Gestluz, uma empresa de formação centrada na inovação, ressalva que os professores devem manter um contacto permanente com empreendedores e com toda a sua envolvente empresarial.

A ligação entre a escola e a empresa assentaria na definição de objectivos para projectos educativos e projectos pessoais de desenvolvimento, "com a atribuição de meios para a obtenção dessas metas, acompanhamento e controlo das acções, avaliação dos resultados e a respectiva recompensa pelo seu mérito", refere.

Uma posição também defendida por Crespo de Carvalho, professor no Instituto de Desenvolvimento da Gestão Empresarial (Indeg) do ISCTE e autor do recente livro Ensino Superior: Modelo de Gestão, Mérito e Responsabilização. Para este académico, é fundamental que o corpo docente, no caso do ensino superior, passe a ser avaliado por indicadores de "performance" completos e objectivos.

A título de exemplo, Crespo de Carvalho menciona o grau de prestação de serviços à comunidade por parte do docente, os recursos financeiros que este consegue para a instituição, a qualidade da supervisão de estudantes de doutoramento e mestrado, os projectos em que está inserido, as publicações académicas e profissionais e o seu nível de presença no exterior, isto é, ligação às empresas e aos fóruns de contacto com a realidade quotidiana.

Quanto à metodologia de ensino, aquele docente defende que esta deverá assentar nos "estudos de casos, das simulações de situações reais e do estudo de contextos empresariais diversos por forma a que os alunos, a partir daí, possam retirar as ilações conceptuais e criar o melhor ambiente para a exploração e a compreensão da teoria, numa perspectiva prática" (ver caixa).

Todavia, Crespo de Carvalho volta a sublinhar que nenhuma destas medidas será possível se o financiamento do ensino superior público não for realizado em função dos resultados e a remuneração dos docentes se basear no mérito, na avaliação por resultados e em grelhas de avaliação integradas, completas e passíveis de serem aplicadas





Professores com espírito de risco

O GRUPO de peritos da Comissão Europeia identificou o perfil do docente que ensina o empreendedorismo, cujo método de ensino deverá integrar duas componentes:

Comportamental - educar para criar atitudes e competências empreendedoras, processo que envolve o desenvolvimento de determinadas qualidades pessoais, mas não directamente focalizado na criação de novos negócios

Técnico - formar sobre as técnicas de como criar um negócio

Estratégias educativas a serem desenvolvidas segundo cada nível de ensino

Educação básica: fomentar as qualidades pessoais, como a criatividade, o espírito de iniciativa e independência, bases da atitude empreendedora. Desenvolver formas de aprendizagem activas e autónomas que forneçam aos jovens conhecimento e contacto precoces com o mundo dos negócios, de modo a compreenderem o papel dos empreendedores na comunidade. As actividades a ser efectuadas poderão ser projectos, aprender por brincar, a apresentação de estudos de caso simples e visitas a empresas locais.

Educação secundária: aumentar a consciencialização dos alunos para o auto-emprego como uma possível opção de carreira, passando a mensagem de que é possível não só ser empregado, mas também um empreendedor. Aprender fazendo, por exemplo, ao gerir mini-empresas. Formação específica em como criar um negócio, especialmente em escolas técnicoprofissionais.

Educação superior: formação sobre como criar e gerir um negócio, incluindo a concepção de um plano de negócios real e das competências associadas com os métodos de identificação e acesso a oportunidades de negócio. Encorajar e apoiar ideias de negócio embrionárias - providenciar empréstimos especiais, mentorização, infra-estruturas -, para que projectos munidos de uma pesquisa profunda possam ser postos em prática e finalmente chegarem ao mercado.






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