Ruben Eiras
O LICENCIAMENTO das empresas de trabalho
temporário deveria ser retirado da competência do Instituto
de Emprego e Formação Profissional (IEFP) e ser entregue
ao Instituto de Desenvolvimento e Inspecção das Condições
de Trabalho (IDICT). "O IEFP é incompetente para gerir
este processo, já que chegou a licenciar empresas sem alvará",
afirma Marcelino Pena Costa, presidente da Associação das
Empresas de Trabalho Temporário (APETT), em entrevista ao EXPRESSO.
Um veterano do trabalho
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De acordo com aquele responsável, o IDICT é a entidade mais
adequada para atribuir licenças de actividade às empresas
de trabalho temporário (ETT), uma vez que reforçaria a aplicação
das normas de higiene e segurança no trabalho nesta modalidade
laboral e não entraria em concorrência com as ETT.
"O
nosso negócio é colocar pessoas e o IEFP é, em certa
medida, nosso concorrente. Por isso, não é lógico
que seja a entidade reguladora deste segmento de mercado", argumenta.
Mas as críticas não
se ficam por aqui. Marcelino Pena Costa refere que a recolha estatística
sobre o trabalho temporário efectuada semestralmente pelo IEFP
está repleta de brechas por onde se esgueira a ilegalidade no sector.
"Não se sabe o ramo de actividade nem o sector das empresas
utilizadoras. Desta forma, não se consegue detectar as bolsas onde
a prevaricação da lei é mais perpetrada",
observa aquele responsável.
O dirigente da recente direcção da APETT não esconde
que ainda subsiste um clima de suspeição sobre o trabalho
temporário, dado o grau de incumprimento da lei ser significativo.
E até avança com números: as ETT ilegais são
cerca do dobro das legalizadas. "A média europeia do sector
é entre 2% a 2,5% do total do emprego. Em Portugal, este segmento
representa cerca de 1%. Por isso, o trabalho temporário 'encapotado'
deve andar à volta dos 1,5%", explica.
Para combater este flagelo, Marcelino Pena Costa volta a sublinhar que
deverá existir por parte da entidade estatal um maior rigor no
licenciamento das ETT, para alcançar um maior controlo nas cadeias
de subcontratação. "Dado que não existe uma
cadeia hierárquica na subcontratação, é difícil
detectar as ilegalidades quando as empresas não têm alvará",
esclarece.
Outra frente de batalha para qualificar esta modalidade laboral flexível
é uma maior aposta na formação em higiene e segurança
no trabalho. O presidente da APETT reconhece que durante muito tempo os
trabalhadores temporários eram "carne para canhão",
porque lhes eram sempre atribuídas as tarefas de maior risco e
sem a adequada protecção.
Marcelino Pena Costa salienta que é crucial mover uma acção
pedagógica de sensibilização das ETT e dos trabalhadores
para a higiene e segurança no trabalho. Para concretizar este objectivo,
a APETT iniciou uma série de seminários sectoriais trimestrais
sobre o tema.
Além disso, aquele responsável defende que o contrato laboral
do trabalhador temporário deverá proibir o exercício
de funções de alto risco na empresa utilizadora. A este
respeito, Marcelino Pena Costa revelou que decorrem conversações
entre a APETT e o IDICT para a inclusão obrigatória da descrição
das condições de trabalho nos contratos entre o trabalhador
temporário e a empresa utilizadora. "É um pequeno
passo para a prevenção, mas é melhor do que nada",
observa.
No capítulo do investimento das ETT na formação dos
trabalhadores temporários, o dirigente contesta os valores referidos
pela Fundação Europeia para a Melhoria das Condições
de Trabalho, que alega o incumprimento da percentagem de 1% do montante
da facturação previsto na lei. "Não há
uma tentativa de incumprimento, mas sim um benefício comercial",
contrapõe. Isto porque as empresas devem investir mais na formação
dos candidatos do que nos colaboradores. "Estes últimos
já adquirem muitas competências no exercício da função",
afirma.
Ainda sobre a formação, Marcelino Pena Costa sublinha que
esta deve ser orientada para o desenvolvimento de competências transversais,
para permitir ao trabalhador circular por vários postos de trabalho.
"É formação prática e não teórica,
como aquela que é fornecida pelo Estado", critica.
Um veterano do trabalho
COM 58 anos de idade e natural de Lisboa, Marcelino Pena
Costa é um dos veteranos do negócio do trabalho em Portugal.
Há duas décadas que comanda em Portugal a Manpower, um "franchising"
de trabalho temporário, e há um ano assumiu a direcção
da APETT. Para o seu mandato, tem como meta ganhar a confiança
dos associados e a credibilidade interna e externa. Confronta-se com uma
imagem denegrida do sector e uma enorme falta de informação,
devido à ilegalidade que grassa na actividade.
Com efeito, não existem números certos sobre volume de facturação,
pessoas colocadas ou sectores com maior utilização de trabalho
temporário. A sua estratégia passa por uma maior aproximação
ao IDICT e por conseguir um bom texto na lei especial do Códigodo
Trabalho.
Para que o crime deixe de compensar,as ETT cumpridoras vejam recompensada
a sua cidadania empresarial e o trabalho temporário seja encarado
como uma porta para a empregabilidade.
Sobre a nova legislação laboral, o dirigente discorda do
estatuto concedido ao trabalho temporário como lei especial. Marcelino
Pena Costa sugere queo trabalho temporário deveria estar incluído
na lei principal, junto do contrato a prazo, como se verifica na legislação
espanhola, a fim de evitar dar um "carácter marginal a
esta forma de trabalho".