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Do outro lado da fronteira

O número de portugueses a trabalhar em Espanha não pára de crescer. São já 75 mil os que escolheram o país vizinho para viver e trabalhar. Um número que aumentou cerca de 4% entre Janeiro e Abril deste ano
25.05.2007


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Cátia Mateus
Os dados divulgados pelo Ministério do Trabalho e Assuntos Sociais (MTAS) espanhol não deixam margem para dúvidas. Está em curso uma autêntica ‘romaria' de trabalhadores portugueses que procuram no país vizinho melhores condições de vida e oportunidades de trabalho que Portugal parece não conseguir assegurar. Em apenas três meses (de Janeiro a Abril deste ano), o número de portugueses a residir e laborar em Espanha aumentou cerca de quatro por cento superando a barreira dos 75 mil trabalhadores. De acordo com os dados do ministério espanhol, o aumento do número de portugueses superou mesmo o do total de estrangeiros em Espanha, que totalizou apenas uma subida de 1,3%. Numa análise à escala europeia, a presença portuguesa em território vizinho é apenas superada pela Roménia que viu fugir para Espanha cerca de 187 mil trabalhadores.


Em termos mundiais, os portugueses são a quinta maior força de trabalho estrangeira em Espanha. À frente neste «ranking» de nacionalidades estão as comunidades marroquina (276.444), equatoriana (268.700), romena (186.812) e colombiana (143.520). A grande maioria dos portugueses emigrados no país vizinho trabalha, segundo o estudo, nos sectores da construção civil, agricultura, florestas e hotelaria. Madrid, Galiza (sobretudo Ourense, Pontevedra e Corunha), Castela e Leão e Andaluzia são as regiões que acolhem maior percentagem de trabalhadores portugueses.

Estes dados não espantam Ana Loya, administradora da Ray Human Capital. A especialista não tem dúvidas de que “neste momento estamos a anos luz da economia espanhola e haverá seguramente muito melhores oportunidades de emprego lá do que em Portugal nesta fase”. Foi com base nesta premissa que Diogo Trindade trocou Lisboa pela Galiza onde actualmente trabalha numa empresa ligada ao sector têxtil.

Diogo não obedece ao padrão típico do trabalhador português em Espanha. É licenciado em gestão, mas encontrou no mercado espanhol uma oportunidade de trabalho aliciante. “Antes de tomar a opção de vir, obviamente procurei trabalhar em Portugal, no meu país, junto da minha família. Mas perante o inevitável e às dificuldades de conseguir um emprego sólido, com possibilidades de carreira e um salário atractivo, decidi que a solução era mudar de país e quanto mais cedo melhor”, relembra. Diogo está há três anos em Espanha e não tem perspectivas de regressar a Portugal, “não para já, pelo menos. Não na situação económica e laboral que o país vive”, enfatiza.

Diogo não é caso único. Teresa Damas, de 27 anos, deixou o Porto há um ano para integrar os quadros de uma empresa de publicidade em Madrid. Está satisfeita com a decisão e não pensa voltar a Portugal. “Se analisar as condições que um jovem recém-licenciado tem aí e as que tem cá, fica claro porque não penso voltar. Na minha área, é pedir-me que escolha entre trabalho incerto precário, instável, mal pago e um emprego com possibilidades de progressão na carreira, com um óptimo salário, benefícios sociais que não tenho aí. A escolha não é difícil”, frisa Teresa.

Uma opinião inteiramente corroborada por Ana Loya, que refere mesmo que “abona muito a favor da inteligência dos portugueses que procurem melhores condições de vida e assumam de uma vez por todas que hoje são trabalhadores globais e não trabalhadores portugueses. O mercado de trabalho abriu-se a outra escala”. A especialista acredita que os números do relatório do MTAS espelham a crescente procura do país vizinho por parte de empresas multinacionais que procuram um mercado competitivo e vantajoso para se fixarem, mas também o encerramento sucessivo de muitas empresas em Portugal. “Não é vantajoso para as empresas fixarem-se cá. É muito difícil explicar a um estrangeiro a lei laboral portuguesa sem o assustar e sem o fazer pensar que temos uma legislação suicida em matéria, por exemplo, de segurança social onde não há tecto máximo para descontos. Mais difícil é convencê-lo a investir cá e por isso Espanha é um mercado muito mais atractivo”, reforça, lamentando não ver “uma luz ao fundo do túnel, nesta matéria”.

A administradora da Ray Human Capital adianta que “actualmente, é mais fácil para nós conseguirmos encontrar profissionais dispostos a ir para Barcelona ou Madrid do que para o Porto ou Viseu, o que espelha o descontentamento dos trabalhadores portugueses”. Talvez por essa razão, Ana Loya veja esta ‘investida nacional em Espanha' como “uma oportunidade de empregabilidade que convém agarrar, mas que exige um trabalho de preparação que começa logo em casa, culturalmente”. Para a especialista é bastante claro que os jovens devem preparar-se desde cedo para competir à escala internacional, “e nisso a participação em programas como o Erasmus pode ser bastante útil”. Por outro lado, graceja, “a médio/longo prazo temos forçosamente de aprender mandarim. A curtíssimo prazo temos, definitivamente, de aprender espanhol”.




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