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Código de Trabalho 'baralha' advogados

Código de Trabalho 'baralha' advogados

As recentes alterações ao Código do Trabalho têm “muitas pontas soltas”, acusam os juristas.

12.04.2018 | Por Cátia Mateus


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As mudanças introduzidas no Código do Trabalho, relativas ao regime jurídico aplicável à transmissão de estabelecimento e ao reforço da proteção dos trabalhadores envolvidos nestes processos, entraram em vigor na passada semana, a 20 de março (Lei nº14/2018), mas estão a deixar apreensivos os advogados. Tudo porque embora a lei venha, tecnicamente, proteger os profissionais em situações de transferência para outras empresas - como é agora o caso emblemático da Altice -, permitindo-lhes inclusivé opor-se a essa transmissão, o exercício dessa oposição está sustentado em critérios que à luz do Direito podem ser considerados “pouco objetivos”.
 
A 13ª alteração ao Código do Trabalho merece a aprovação dos especialistas, mas com algumas reservas. Genericamente, as mudanças introduzidas (ver caixa), ainda que benéficas sob o ponto de vista da proteção dos trabalhadores, levantam questões práticas que podem bloquear o processo de transmissão de estabelecimento ou, pelo menos, torná-lo muito mais demorado.
 
Entre as principais alterações introduzidas estão o dever de informação da Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT)-  que passa a decidir, não apenas sobre a eventual aplicação de coimas, mas também sobre se os contratos de trabalho são ou não transmitidos para a entidade adquirente- e o envolvimento da Direção-geral do Emprego e das Relações de Trabalho (DGERT), em moldes semelhantes aqueles em que já atuava em casos de despedimento coletivo. 
 
Processos mais lentos
Sandra Silveira, advogada da Cuatrecasas, Gonçalves Pereira & Associados, e Marta de Oliveira Trindade, especialista em Direito do Trabalho da Abreu Advogados, admitem que a intervenção da ACT, vai exigir uma adaptação das estruturas para dar resposta à exigência destes processos. Uma necessidade que pode não estar ainda assegurada. O Expresso tentou apurar junto da ACT se a equipa que acompanhará estes processos já está no terreno, sem sucesso.  
 
Mas esta não é a maior preocupação dos advogados. É na possibilidade de oposição do trabalhador à transmissão e à resolução do contrato após a transmissão que os advogados encontram as principais fragilidades. “Há na redação deste texto muitas pontas soltas”, afirma Marta de Oliveira Trindade acrescentando que “a grande defesa para esta alteração que era o  direito do trabalhador à oposição da transmissão, é afinal a parte mais frágil do documento”. Sandra Silveira corrobora a opinião.
 
A Lei nº14/2018 determina que o trabalhador pode exercer o direito de oposição à transmissão da empresa “quando aquela possa causar-lhe prejuízo sério, nomeadamente por manifesta falta de solvabilidade ou situação financeira difícil do adquirente ou, ainda, se a política da organização do trabalho deste não lhe mereça confiança”, explica Sandra Silveira. Ora para as advogadas, se o conceito de “prejuízo sério” abarca questões como a mudança de localização da empresa ou de horário de trabalho, o conceito “política da organização do trabalho”, que sustenta esta oposição, é um conceito vago, aberto a múltiplas interpretações e que certamente vai complicar muitos destes processos. “Falamos de quê quando aludimos à política da organização?”, questiona Marta de Oliveira Trindade, defendendo que a previsão de oposição deveria ter bases de fundamentação mais claras.
 
O processo de fundamentação é outra das fragilidades. O trabalhador tem apenas que notificar o empregador, por escrito, de que não quer transitar para a nova empresa, elencando os seus motivos. “Não está obrigado a fazer prova deles e não está previsto o que é que o empregador pode fazer face à recusa do trabalhador, nem uma resposta por parte da empresa adquirente. Presume-se que seja ou não frágil o argumento do profissional, não vai para a empresa adquirente”, explica a advogada.
 
Outra das questões que deixa dúvidas nesta revisão do Código de Trabalho é a possibilidade de resolução do contrato por parte do trabalhador, após a transmissão,  no prazo de 30 dias subsequentes ao conhecimento dos factos. “Não é claro este prazo uma vez que os 30 dias não são contados após a entrada em funções na nova empresa, mas sim após o conhecimento dos factos que motivam a recusa em transitar para a empresa. Agora imagine que esses factos só ocorrem um ano depois, cabem neste conceito?”, questiona Sandra Silveira antecipando inúmeros problemas decorrentes das fragilidades do documento promulgado que não tem efeitos retroativos e por isso não se aplicará a processos de transmissão anteriores a 20 de março.
 
O que muda
 
Direito de oposição do trabalhador à transmissão
Os trabalhadores passam a poder opor-se à transmissão do respetivo contrato de trabalho, desde que fundamentada. A oposição poderá ocorrer sempre que possa causar “prejuízo sério” ao trabalhador, nomeadamente por “falta de solvabilidade ou situação financeira difícil do adquirente”, ou quando a política da organização do trabalho “não lhe merecer confiança”. 

Possibilidade de resolução do contrato pelo trabalhador
A transferência da posição do empregador no contrato de trabalho pode constituir justa causa para o despedimento, sempre que se verifique um dos fundamentos previstos para o direito à oposição por parte do trabalhador. O trabalhador que pretenda resolver o contrato nestes termos tem direito a uma compensação igual à prevista no despedimento coletivo.

Dever de informação
As empresas passam a ter de informar a Autoridade para as Condições de Trabalho sobre a situação de transmissão e o conteúdo do contrato. A informação está disponível para consulta pelos trabalhadores ou seus representante, e está prevista a possibilidade de intervenção da Direção-geral do Emprego e das Relações de Trabalho, nas negociações ou a pedido de qualquer uma das partes.

Responsabilidade solidária
O transmitente passa a responder solidariamente pelos créditos do trabalhador emergentes do contrato de trabalho, da sua violação ou cessação, bem como pelos encargos sociais correspondentes, vencidos até à data da transmissão, cessação ou reversão, durante os dois anos subsequentes.


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