Cátia Mateus e Marisa Antunes
NAS empresas que integram o índice bolsista nacional (PSI-20) a percentagem de mulheres em cargos de administração é meramente residual. Com efeito, nas 20 empresas cotadas em bolsa, apenas cinco possuem uma mulher no seu conselho de administração. Os casos do BPI, da Media Capital, da Mota-Engil, da Corticeira Amorim e da Semapa são exemplos positivos, mas ainda insuficientes para marcar uma viragem visível no país.
Todavia, esta ausência de mulheres em cargos de chefia não é um problema apenas nacional. De acordo com o estudo «Corporate Governance 2005» - realizado pela Heidrick & Struggles - Portugal, Itália e Espanha são os países onde as empresas menos apostam na diversidade de sexos em cargos de administração. Estes países apresentam as menores percentagens de liderança feminina da Europa, com valores que rondam um e quatro por cento, contra os 18% da Suécia, o país com maior número de mulheres em lugares de administração.
Contudo, segundo o estudo, entre 2003 e 2005 o número de elementos do sexo feminino com funções de administração nos países da Europa cresceu cerca de 22%. Mas ainda assim, 46% das empresas europeias ainda não têm nenhuma mulher neste cargo. Portugal é mesmo, à luz deste estudo, o caso mais preocupante.
Rosalina Machado, presidente da Ogilvy & Mather continua, pois, a ser uma excepção no cenário empresarial português. «Há vinte anos, quando me tornei a primeira mulher à frente de uma multinacional em Portugal, era também a única mulher a dirigir a Ogilvy entre as 58 empresas que existiam um pouco por todo o mundo», recorda a administradora.
Ainda se recorda da forma como foi tratada pelos seus congéneres, na primeira reunião mundial a que compareceu e que juntou em Itália os 58 presidentes da multinacional de publicidade. «Olharam-me todos de lado, de pé-atrás. Mas foi só dessa vez. No ano seguinte já me trataram de igual para igual», lembra Rosalina Machado.
Apesar da discriminação a que as mulheres continuam a ser sujeitas, a responsável da Ogilvy defende que a tendência é definitivamente para a mudança. «Cada vez mais os empregadores vão buscar o melhor profissional para o lugar, seja este um homem ou uma mulher», refere Rosalina Machado.
Uma mudança de postura que assenta também na maior abertura do mercado de emprego às mulheres. «Antigamente, tudo era mais complicado e os pais apostavam mais nos filhos homens pois às mulheres estava destinada a vida doméstica. Elas não conseguiam ter o mesmo acesso à preparação técnica», acrescenta.
Rui Duarte Moura, docente universitário e presidente da Associação Portuguesa de Profissionais em Sociologia Industrial, das Organizações e do Trabalho (APSIOT), salienta que «embora as estatísticas portuguesas mostrem que existe um desequilibro entre homens e mulheres em cargos de liderança, essa diferença é cada vez menor».
Queda da fecundidade
A realidade nacional, segundo diz, não difere muito dos restantes países europeus revelando uma tendência claramente emergente para as líderes femininas. Uma conjuntura que se deve a dois factores decisivos: «a maior escolaridade das mulheres nas gerações mais jovens comparativamente com os homens e a queda da fecundidade». É que «se uma dá mais competências às mulheres, a outra permite-lhes uma maior disponibilidade laboral», salienta.
Ainda assim, Rui Duarte Moura considera que os factores clássicos (família e papel social da mulher) continuam a contribuir de forma significativa para a desigualdade ainda existente. Isto porque as dificuldades associadas às mulheres nos cargos de topo não se prendem com a capacidade de liderança.
A melhoria das condições de vida e o acesso à educação levaram as mulheres a procurar formação especializada, suplantando mesmo em número, nas faculdades, os seus colegas masculinos. Mas se a ascensão dos profissionais de ambos os sexos se processa de forma similar nos primeiros anos de carreira, tudo muda de figura a partir dos trinta, quando as mulheres tentam conciliar a maternidade com o trabalho.
«Em Portugal, as infra-estruturas de apoio à família - como os infantários, as escolas, as actividades de tempos livres - funcionam mal, com preços caros e horários desajustados, o que torna tudo mais difícil para a mulher que quer conciliar a sua vida familiar e profissional», sublinha Ana Bela Pereira da Silva, presidente da Associação Portuguesa das Mulheres Empresárias (APME).
Empresas penalizadas
Entraves que acabam por prejudicar não só as mulheres mas as próprias organizações. «As empresas só têm a ganhar com o contributo das mulheres, que levaram para as organizações aquilo que já faziam dentro das suas famílias, ou seja, a gestão de equipas, gestão de orçamentos, definição de objectivos e toda a conjugação entre a emoção e razão», acentua a responsável.
Rosalina Machado corrobora: «As mulheres têm uma gestão mais humanizada e preocupam-se mais com as pessoas com quem trabalham». Uma humanização que, apesar de tudo, não as deixa mais vulneráveis quando é necessário tomar atitudes mais duras, como em caso de despedimentos, defende a presidente da Ogilvy. «É mais doloroso para as mulheres assumir essas responsabilidades mas não têm medo de o fazer, porque somos mais rápidas a decidir. O que é bom é bom, o que é mau é mau», diz Rosalina Machado.
Gestão feminina
«O SUCESSO das mulheres não deve ser obtido através da adopção do modelo de gestão masculino», defende Rui Duarte Moura, presidente da Associação Portuguesa de Profissionais em Sociologia Industrial, das Organizações de Trabalho (APSIOT).
Para o especialista, as mulheres já perceberam que a sua grande vantagem em relação aos líderes masculinos reside nas características distintivas que possuem.
Líderes natas no seio da família, desde tenra idade, «as mulheres são mais resistentes e pacientes do que os homens, mais intuitivas, gerem melhor o equilíbrio entre a emoção e a razão, partilham mais o poder e a informação», refere Rui Duarte Moura.
Características que podem ser fundamentais para o sucesso e para atingir objectivos dentro de uma organização.
Na essência, o responsável, acredita que «as mulheres que conseguem transportar as virtudes que possuem em funções familiares para o cargo de liderança obtêm, geralmente, muito sucesso».
Rui Duarte Moura arrisca mesmo considerar o «modelo de gestão feminina mais harmonioso» e acrescenta que a conquista por parte das mulheres dos cargos de liderança é notória e irreversível.
«Terminada a era dos músculos e inaugurada a época do cérebro, a paridade entre a mulher e o homem é imparável», esclarece. Perante isto, conclui o especialista, «o novo paradigma laboral introduz menos autoritarismo, mais descentralização e exercício de cidadania».