Não é novidade que a tecnologia faz mover a economia e que na era do big data as competências tecnológicas são fundamentais para integrar e triunfar no mercado de trabalho. Mas os imperativos do recrutamento puramente orientado para a tecnologia, que nos últimos anos se impôs em muitas organização em todo o mundo, podem estar a mudar. Os investigadores da Bentley University, nos Estados Unidos, analisaram 24 milhões de ofertas de emprego em nove indústrias, à procura das competências-chave solicitadas aos candidatos, e concluiram que os recrutadores procuram cada vez mais profissionais multifacetados, que possuam sólidas competências tecnológicas combinadas com competências comportamentais (soft skills) nos domínios da comunicação e colaboração. Para os investigadores, 2016 é já o ano dos “híbridos” - os profissionais que são competitivos em ambos os domínios, o tecnológico e o comportamental - e para estar na mira dos rerutadores e ser apetecível aos olhos das empresas, não chega ser muito bom tecnicamente se não o for a nível comportamental.
?Pode um profissional com provas dadas em matéria de tecnologia ser preterido num emprego outro candidato que não seja tão bom tecnicamente, mas que se destaque pela sua capacidade de comunicação, trabalho em equipa e relacionamento com os colegas? Pode. E segundo Susan Brennan, vice-presidente do Centro de Carreiras da Bentley University, é isso que está neste momento a acontecer no mercado de trabalho. “As empresas podem referir-se a este equilíbrio como hard skills versus soft skills (competências técnicas versus comportamentais), QI (quociente intelectual) versus QE (quociente emocional) ou até falar em lado esquerdo e lado direito do cérebro, mas seja qual for a terminologia utilizada, o que é relevante é que os candidatos têm de demonstrar profundas competências em ambas as esferas para serem considerados notáveis para as empresas e para as funções a que se candidatam”.
Inteligência emocional é fundamental
O atual contexto de trabalho impõe às empresas a necessidade de integrarem profissionais versáteis, com uma ampla capacidade de adaptação é mudança e cooperação. A tecnologia é importante. O big data dita as regas e leva as empresas a realizarem níveis de investimento consideráveis, seja na inovação ou nas contratações, apostando em recrutamentos cirúrgicos em áreas de domínio tecnológico, como a análise de dados. Mas se é necessário quem saiba compilar, analisar dados, aplicando-os ao quotidiano da gestão empresarial, não é menos necessário que nas empresas esses especialistas saibam comunicar a relevância e o impacto do seu trabalho diário para o negócio. “Isto não se faz isoladamente, com ótimos perfis tecnológicos, muito bons tecnicamente, mas que não são capazes de cooperar ou comunicar com outros elementos ou outras equipas da empresa. As competências comportamentais ao nível da comunicação, cooperação e trabalho em equipa são fundamentais”, explica a vice-presidente do Centro de Carreiras da Bentley University.
Mas além destas razões, a pesquisa conduzida pela universidade apontou outras para o facto da combinação equilibrada entre as competências técnicas e comportamentais estar, cada vez mais, na linha da frequente dos requisitos das empresas quando analisam o perfil de um candidato, seja qual for a função. Gloria Cordes Larson, a presidente da Bentley University, realça a mudança geracional que se assiste hoje nas empresas. Em comentário ao estudo, a presidente fala da saída dos baby boomers (profissionais nascidos até 1964) do mercado laboral, levando consigo décadas de conhecimento empresarial e competências de gestão. “Esta mudança torna a necessidade de recrutar competências emocionais ainda mais vital para as empresas”, explica Larson acrescentando que “estas competências são fundamentais não só para permitir a transferência de conhecimento dos profissionais seniores para os mais jovens que estão agora a integrar o mercado de trabalho, mas também porque a versatilidade dos profissionais é hoje determinante para o sucesso das organizações”.
Como se contratam os 'híbridos'
O melhor profissional híbrido combina um equilíbrio entre as competências técnicas inerentes à sua sua formação de base, com formação adicional (ou gosto pessoal) no domínio das artes e das ciências. Esta é segundo Susan Brennan a melhor fórmula para identificar os perfis 'híbridos' de que as organizações atuais necessitam. Quando esta diversidade de competências não se apresenta validada formalmente, em termos académicos - por exemplo, se as competências do candidato no domínio das artes foram desenvolvidas por gosto pessoal ou como um hóbi - as questões colocadas e a forma como é conduzida a entrevista de seleção são, segundo a responsável, essenciais para testar a adequação do candidato á função.
Utilizar uma metodologia de entrevista focada nas questões comportamentais é a aposta certa. Segundo a responsável do Centro de Carreiras da universidade de Bentley, validar as competências técnicas necessárias a um emprego híbrido é a etapa mais fácil de um processo de seleção. Já “validar a forma como um candidato atua quando uma combinação de competências técnicas, emocionais e comportamentais é requerida, é mais difícil”.
As questões colocadas, realça, devem estar ligadas a situações reais da companhia, de preferência dilemas com que o profissionais terá de lidar no dia-a-dia, caso venha a ser selecionado para a função. ?Exemplos concretos podem ser, levar o candidato a descrever como agiria se tivesse de lidar com um elemento hóstil na sua equipa, ou com uma chefia que sucessivamente contrariasse as suas ideias, ou ainda que passos daria para resolver um problema concreto de um cliente muito insatisfeito. “Levar os candidatos a descreverem erros que tenham cometido em funções anteriores e como os resolveram pode também ser uma boa forma de identificar os profissionais híbridos que as empresas tanto procuram”, reforça.