Numa altura em que o Governo se prepara para avançar com maior regulação do trabalho nas plataformas digitais — incluindo a presunção de laboralidade, ou seja, da existência de um contrato de trabalho, com base em indícios específicos —, 87% dos estafetas das principais plataformas digitais a operar em Portugal dizem que querem continuar como freelancers. Ainda assim, dois em cada três (66%) querem ter mais benefícios e proteção social. Estas são duas das principais conclusões do estudo “O impacto social e laboral das plataformas digitais de entregas em Portugal”, promovido pela Bolt, Glovo e Uber e conduzido pelo ISCTE Executive Education.
O estudo, desenvolvido com base num inquérito disponibilizado pelas três plataformas ao universo total dos seus estafetas entre 21 de dezembro de 2021 e 3 de janeiro de 2022, contou com uma amostra final após tratamento de 2057 respostas, “que garante a representatividade do universo em análise”, afirma José Crespo de Carvalho, presidente do ISCTE Executive Education. O Expresso questionou qual a dimensão desse universo, mas não recebeu resposta. E traça um retrato de quem são estes estafetas: quase todos homens (89%); na sua maioria estrangeiros oriundos de fora da União Europeia (53%); têm uma relação de prestação de serviços diretamente com os operadores das plataformas (67%); na colaboração com as plataformas valorizam sobretudo a flexibilidade laboral (49%), e mais de metade (52%) têm outro emprego. Além disso, quase nove em cada dez estafetas (87%) dizem que a sua situação económica melhorou desde que começaram a trabalhar com as plataformas.
São características que ajudam a explicar que a grande maioria dos inquiridos (87%) queira continuar como freelancer. Contudo, não como até aqui. Mais de metade (53%) quer manter esse regime mas com mais benefícios e proteção social. E outros 13% desejam ser contratados por uma única empresa, com salário e horários fixos e mais benefícios sociais. Já 34% indicam querer continuar como freelancers, reconhecendo que essa opção tem menos benefícios e proteção social. E há alguma resistência a maior regulamentação da atividade: 54% dos estafetas consideram que terá impactos negativos, nomeadamente levando a uma redução dos ganhos.
Numa posição conjunta, as plataformas referem que “este estudo dá voz aos estafetas numa altura em que se discutem mudanças que, em primeiro lugar, os vão afetar a eles”. E destacam: “Fazer reformas laborais sem conhecer e compreender as motivações e
preocupações de quem escolhe trabalhar por esta via é fazer reformas no escuro, e, como indústria, queremos contribuir para que isso não aconteça.”