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"O capital humano é o 'gatilho' do crescimento"

Na época em Amândio da Fonseca que criou a EGOR, há 30 anos, o sector do recrutamento vivia um dos principais momentos de viragem da sua história rumo à profissionalização. Em três décadas muito mudou e novos desafios e necessidades se criaram no mercado de trabalho nacional e nas estratégias de identificação e retenção de talento. Foi deles que falámos com o administrador da EGOR, o grupo de recrutamento que esta semana cumpre 30 anos de atividade. 

04.06.2016 | Por Cátia Mateus


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A EGOR celebra esta semana 30 anos de atividade. Tem por isso uma visão privilegiada da evolução das tendências de identificação, recrutamento e gestão de talento. O que é que mudou nas últimas três décadas em Portugal?
Mudou tudo. Ou quase tudo. Evoluiu-se de uma indústria paroquial e doméstica baseada sobretudo na utilização de testes, na qual o recrutamento por anúncio constituía a principal fonte de pesquisa de candidatos, para um “state of art“ no qual a captação e avaliação do talento se atualizam diariamente com as mais recentes tecnologias. No entanto, a principal mudança resulta da alteração das mentalidades das organizações e dos profissionais do setor. Nas empresas privadas, as afinidades familiares ou eletivas, que pautavam frequentemente as decisões de admissão, foram substituídas - com a emergência de uma geração qualificada de profissionais das ciências humanas e de gestores sensibilizados para a importância do fator humano nas organizações-, por critérios mais exigentes de seleção. A entrada no setor do recrutamento de empresas multinacionais e o desenvolvimento de novas técnicas no âmbito do recrutamento por competências e da inteligência emocional, a par com a colocação de profissionais na direção e gestão de pessoal, permitiu ao setor colocar-se na vanguarda das melhores práticas internacionais.

E o mercado de trabalho propriamente dito, como evoluiu?
Nas últimas décadas, foram turbulentas as mudanças em termos de política, economia, cultura e educação e também nos novos papéis das pessoas nas organizações, na família e na sociedade em geral. A passagem de um país com uma industrialização incipiente para uma sociedade baseada na globalização do conhecimento e da informação, gerou a exclusão de muitas centenas de milhares de pessoas incapazes de se adaptarem a novos figurinos e exigências do mundo do trabalho. Numa outra vertente, os baixos níveis de qualificação da maioria dos candidatos ao primeiro emprego, contribuiu para o aumento do desemprego jovem e de uma geração limitada a tarefas e serviços com pouco valor acrescentado.

Que aspetos destacaria como mais positivos, e negativos, nesta evolução?
Apesar dos elevados custos das várias crises suportados nas últimas décadas, o país efetuou progressos muito importantes em todos os setores de atividade. A transformação tecnológica, induzida pela integração europeia e pelo investimento estrangeiro, projetou o ensino português para patamares de grande qualidade não apenas em universidades de excelência mas também através de um crescimento acelerado do ensino profissional. A democratização da educação e a disseminação do ensino médio e superior no interior do país, contribuiu para uma aceleração da qualificação dos jovens e para a sua integração num mercado de trabalho alargado criado pelo espaço europeu. Os aspetos mais negativos resultam do fato dos investimentos financeiros do Estado no ensino primário e secundário, continuarem a ser insuficientes. No plano político, a sucessão de reformas erráticas ao sabor dos interesses corporativos e a ausência de uma definição estratégica a longo prazo, constituem os erros mais flagrantes de sucessivos Governos.

Na sua opinião, que grandes desafios mantém Portugal por cumprir em matéria de empregabilidade?
Atendendo a que são as empresas e a iniciativa privada que promovem a empregabilidade, os verdadeiros desafios residem na capacidade do Estado para exercer o papel de regulador entre interesses que, sendo complementares, não são semelhantes. Conjugar a responsabilidade de captar investimentos para a economia, promover condições de educação, saúde, estabilidade e confiança para os cidadãos e garantir a proteção e defesa dos interesses legítimos de quem trabalha constituem alguns dos principais problemas com que os governos se defrontam em Portugal, tal como noutros muitos países.

Que medidas considera determinantes para cumprir esses desafios?
As condições de fundo para resolver a maioria dos grandes desafios nacionais com reflexo direto na empregabilidade, centram-se à volta da inexistência de uma visão nacional partilhada pelos principais partidos que transmita aos investidores nacionais e internacionais uma imagem Institucional consistente e duradoura e no plano interno um projeto a longo prazo no qual os investimentos no sistema educativo constituam o principal objetivo nacional. Se tivesse que identificar os grandes problemas nacionais no campo do emprego qual seria? Existem vários grandes problemas com reflexo direto no campo do emprego. Vão desde a existência seis centenas de milhares de desempregados de longa duração que, por motivos de natureza etária e ausência das condições mínimas de adaptação ao atual mercado de trabalho, dificilmente voltarão a empregar-se e, noutro extremo, tendo em conta as perspetivas de fraco crescimento do PIB nos próximos anos, a reduzida capacidade do mercado de trabalho de absorver as vagas de jovens com baixa escolaridade que todos os anos procuram o primeiro emprego.

Essa radiografia atual ao mercado nacional permite identificar duas franjas distintas unidas pelo mesmo problema - o desemprego - os profissionais jovens e os seniores. Sabendo que não há receitas milagrosas e que o emprego não se cria por decreto, o que considera prioritário para inverter esta tendência e o destino de milhares de profissionais?
Sabemos todos que qualquer diminuição significativa dos números do desemprego só se materializará quando os de níveis de crescimento da economia portuguesa forem superiores a 2%. Para o conseguir, é indispensável apostar no investimento e na educação. Um e outro fator são inseparáveis. Se investirmos na educação mas não tivermos investimento estaremos – como hoje acontece - a educar para exportar massa cinzenta. Para atrair investimentos, é necessário ter estabilidade política e dispor de meios humanos preparados para responder a setores de atividade geradores de mais-valias substantivas.

Milhares de portugueses emigraram nos últimos anos, naquela que é a emigração mais qualificada de que há memória no país. Portugal está em condições de recuperar os "cérebros" perdidos?
A reversão da fuga de cérebros para os países desenvolvidos é hoje um problema que afeta todos os países com fraco crescimento económico e/ou falta de estabilidade política. Apesar dos esforços desenvolvidos, as evidências demonstram que a emigração qualificada só apresenta níveis significativos de regresso aos países de origem, quando as condições de vida e segurança que lhe são oferecidas são semelhantes às dos países de acolhimento. As exceções são aquelas em que - como está a acontecer em Angola, Moçambique ou no Brasil - as condições dos países de acolhimento se tornaram piores do que as do país de origem.

Quanto tempo demorará a fazê-lo e o que será necessário para que isso aconteça?
Para os emigrantes estabelecidos na Europa, a conjugação das vantagens económicas, a ausência de fronteiras e a facilidade de deslocação e comunicação, não incentivam o regresso a Portugal. Sobretudo, porque para um número crescente de jovens, a noção das nacionalidades perdeu importância face as inúmeras vantagens de um grande mercado de trabalho europeu, pleno de oportunidades de carreira que não encontram em Portugal. Portugal tem vindo a inverter a sua taxa de desemprego.

Acredita que esta recuperação é sustentável?
Tendo em conta a cadência com que as previsões oficiais de crescimento económico tem vindo a sofrer (sobretudo para baixo), é pouco provável que a taxa de desemprego atual possa vir a baixar. No entanto, variáveis como a sazonalidade e emigração, podem alterar positivamente as taxas de desemprego nos próximos meses.

Apesar da taxa de desemprego nacional ainda elevada, em vários sectores de atividade, como as Tecnologias, os empregadores falam em dificuldades de contratação apontando como causa não só a saída de talento do país como o gap entre as preferências dos jovens em matéria de formação superior e as necessidades do mercado. Em que áreas é isto mais expressivo e como resolver a questão?
Portugal é um país de geometria variável, onde alternam uma minoria de pessoas muito qualificados em pequenos nichos, com destaque para a área das tecnologias, como resultado duma aposta precoce há cerca de vinte anos nos sistemas de informação e que todos os países disputam. Noutra vertente, deparamo-nos com uma geração de licenciados cujas escolhas vocacionais não previram as tendências dos mercados de emprego e, que em muitos casos, paga hoje no purgatório de funções sem futuro, os custos da privatização do ensino superior e a ausência de políticas de educação ajustadas à economia real. A solução óbvia é a da requalificação para funções com empregabilidade no país ou no estrangeiro. Uma terceira dimensão do problema é constituída por uma larga maioria de jovens com baixa qualificação escolar, para a qual as oportunidades de emprego massivo se esgotaram com a crise económica e se debatem com a incógnita do primeiro emprego. Mais uma vez a formação constitui o investimento mais importante na aquisição de ferramentas que gerem empregabilidade.

O que podemos esperar da criação de emprego nacional a médio prazo?
Se as universidades e institutos superiores continuarem a investir na inovação e na qualidade do ensino e a crescente aposta e popularidade do ensino profissional se mantiver, teremos no mercado de trabalho uma geração de especialistas qualificados, quadros intermédios e técnicos que constituem o melhor argumento para atrair projetos de investimento, cativados por uma qualidade da mão-de-obra que noutras geografias não conseguem obter.

Quais são os grandes desafios da EGOR no atual contexto e as suas perspetivas de evolução?
Um guru do Sloan Institute no MIT previu, em tempos, que a duração média das empresas não ultrapassa a dúzia de anos. Tendo ultrapassado essa barreira, os grandes desafios da EGOR dependem quer de variáveis endógenas de crescimento e de continuidade, quer da evolução da economia portuguesa. O fato de atuarmos num setor que constitui o gatilho do crescimento – o capital humano – leva-me a acreditar que surgirão a seu tempo, as mudanças necessárias para garantir a continuidade de um projeto sobre o qual recai a responsabilidade de garantir algumas centenas de postos de trabalho.



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