Virgílio Azevedo
KARL-Johan Lonnroth, director-geral-adjunto do Emprego
e Assuntos Sociais da UE, considera, em entrevista ao EXPRESSO, que a
meta do pleno emprego em 2010 definida na Estratégia de Lisboa
é difícil de atingir se o crescimento económico na
Europa mantiver as baixas taxas actuais. Mas face às políticas
de emprego já adoptadas ou definidas, Lonnroth acha que esse objectivo
é realista.
EXPRESSO - As últimas iniciativas da UE, devido à
recessão, mostram que a prioridade é crescer. O que é
mais importante: emprego ou crescimento?
KARL-JOHAN LONNROTH - Não se trata de escolher entre uma
coisa e outra, é preciso fazer ambas. Na política de coesão
social da UE temos uma situação em que se ganha sempre.
Não se pode ser competitivo na Europa se se afectar algumas áreas
ou algumas regiões a um cenário de baixo crescimento.
O objectivo da política de coesão é exactamente
tentar, em primeiro lugar, eliminar as disparidades na Europa, situar
as regiões subdesenvolvidas e as suas populações
ao mesmo nível de partida que as regiões mais competitivas.
E depois há a competitividade dinâmica: quando se tiver
eliminado as disparidades e todas as populações estiverem
ao mesmo nível, haverá que promover uma estrutura de mudança
para todos.
EXP. - O desemprego na UE (8,8%) é preocupante?
K.-J.L. - Estamos preocupados com os últimos números.
A contracção económica actual é demasiado
acentuada e já se prolonga há tempo demais, e isto começa
a conduzir a uma situação em que o desemprego volta a
aumentar.
No entanto, temos agora uma situação um pouco melhor que
em meados dos anos noventa, porque agora estamos munidos de políticas
que tornaram o desemprego e os mercados de trabalho mais resistentes
a choques. Antes do Tratado de Maastricht, não tínhamos
uma política orientada para a estabilidade, uma política
macroeconómica. E antes das cimeiras do Luxemburgo e de Lisboa,
não tínhamos uma estratégia europeia de emprego
baseada em reformas estruturais.
Essas reformas contribuíram para tornar o crescimento mais intensivo
em termos de emprego: comparando os ciclos económicos, a expansão
do final da década de noventa com a do final da década
de oitenta, o desemprego aumentou muito mais depressa nesta última.
E começou a crescer muito mais devagar e tarde agora do que nos
anos noventa.
EXP. - Mas há Estados onde o desemprego é mais agudo...
K.-J.L. - Na Alemanha e em alguns países mediterrânicos
(Grécia, Itália e França, onde se concentram três
quartos dos desempregados), o desemprego é particularmente elevado
- e é por isso que estamos a concentrar-nos especialmente nestes
países para os ajudar a reformar os seus mercados de trabalho.
Sabemos que a situação da Alemanha é muito complexa.
As estruturas precisam de ser reformadas. O Governo está a tentar
fazê-lo, mas as coisas estão a avançar relativamente
devagar. Entretanto, a UE e a credibilidade do euro talvez estejam a
ser prejudicadas pelo facto de a situação do emprego estar
tão má nalguns países.
EXP. - E Portugal?
K.-J.L. - Quanto a Portugal, eu diria que o copo está
meio-cheio mais do que meio-vazio. As taxas de emprego são relativamente
altas, e se considerarmos apenas esses números, o país
parece estar a sair-se relativamente bem. E a taxa de desemprego é
mais baixa do que na Europa em geral, embora o crescimento da economia
tenha sido fraco nos últimos dois anos e o desemprego esteja
a aumentar.
Porém, se olharmos para além destes números, é
claro que Portugal enfrenta uma série de riscos e desafios no
futuro, porque tem uma produtividade muito baixa. A nossa preocupação,
em Bruxelas, é que Portugal possa estar fechado num ciclo vicioso
de baixa competência, baixa produtividade e baixo custo do trabalho,
que resulte numa menor competitividade em relação a outros
países europeus - e este cenário pode conduzir a uma perspectiva
de baixo crescimento a longo prazo. É preciso quebrar esse ciclo
para cumprir os objectivos da Estratégia de Lisboa e os requisitos
de crescimento mais elevado.
EXP. - Essa é a grande causa do desemprego estrutural em Portugal?
K.-J.L. - Não sei dizer ao certo, mas é seguramente
uma das causas da vossa reduzida capacidade para gerir mudanças
estruturais, porque a nova economia europeia, para ser competitiva,
requer um avanço em direcção a tecnologias mais
sofisticadas, mais inovação, etc., e se Portugal não
conseguir apanhar esse comboio vai haver problemas estruturais no mercado
de emprego, incluindo desemprego de longo prazo.
EXP. - Os fundos estruturais têm desempenhado um papel importante
na criação de emprego?
K.-J.L. - Têm sido absolutamente cruciais. Portugal é
o quinto maior receptor dos fundos, que financiam mais de metade da
despesa - 2000 milhões de euros por ano - que o país tem
com políticas do mercado de trabalho. Assim, os fundos estruturais
têm um papel muito importante e tiveram um grande impacto na reforma
das vossas estruturas de formação e educação.
EXP. - Está em discussão a ideia de penalizar os países
que não obtiveram bons resultados no emprego, cortando nos fundos
estruturais. Concorda?
K.-J.L. - Essa ideia, de momento, já não é
muito popular. É verdade que a Comissão Europeia quis
criar a chamada reserva para o desempenho, colocando de lado alguns
fundos para beneficiar os programas que deram melhores resultados, e
essa reserva será agora desbloqueada com a análise intercalar
dos fundos estruturais, na próxima Primavera.
Talvez se vá favorecer um aumento desse elemento, mas não
se pode considerar um sistema totalmente competitivo, pois nesse caso
os fundos não iriam para onde são mais necessários
mas para os países que têm maior capacidade de apresentar
projectos.
EXP. - A Estratégia de Lisboa quer o pleno emprego na UE em 2010.
Acha isso possível?
K.-J.L. - Se o crescimento económico se mantiver a menos
de 1% como actualmente, pode ser difícil atingir esse objectivo.
No entanto, estamos a falar de uma tendência, porque se prevê
que a economia da UE volte a crescer mais a partir de 2004. Além
disso, a produtividade decaiu um pouco na Europa; logo, não será
necessário tanto crescimento para que o emprego comece a aumentar.
Mas vendo os objectivos da Estratégia de Lisboa do ponto de vista
das políticas de emprego, a meta do pleno emprego é realista,
contanto que estejam aplicadas as políticas certas e as reformas
recomendadas nos relatórios da Comissão Europeia. Países
como os escandinavos, que têm políticas que cobrem não
só subsídios ao emprego mas também investimentos
em novas tecnologias, inovação e formação
contínua, ao mesmo tempo que têm políticas de crescimento,
revelam um desempenho muito melhor.
EXP. - Mas as políticas existentes são suficientes?
K.-J.L. - Temos de fazer mais em termos de reformas estruturais
do mercado de emprego. Em particular, penso que temos de investir mais
no capital humano e na inovação, elementos cruciais para
a competitividade e o crescimento.
Os Estados-membros da UE investem actualmente 5% do PIB em formação
e educação, e as empresas privadas investem menos de 2%.
É muito pouco. Além disso, este número é
uma média, varia muito consoante os Estados-membros. Nos países
candidatos à adesão, por exemplo, as empresas não
investem na educação da sua força de trabalho.
EXP. - A nova iniciativa de crescimento da UE e os novos projectos
aprovados na área das infra-estruturas são muito importantes
para criar emprego?
K.-J.L. - A iniciativa tem dois objectivos. Gerar confiança
nos agentes económicos e criar o ambiente necessário ao
crescimento. Os novos projectos, embora tenham muito pouco efeito no
emprego a curto prazo, podem ter efeitos importantes a longo prazo.
Melhores transportes, melhores tecnologias, fazem com que a economia
europeia funcione melhor e constituem um impulso para que os outros
invistam também.
EXP. - Com o alargamento da UE, aplicar a estratégia de emprego
é um novo desafio?
K.-J.L. - Sim, é um desafio porque os países candidatos
têm um PIB "per capita" que é 40% da média
da UE, em muitos casos a sua produtividade é ainda mais baixa
que a portuguesa, e têm taxas de emprego mais reduzidas que as
da União. Mas também existem elementos positivos, porque
o seu crescimento tem sido muito mais alto, o que pode levar a um reforço
do crescimento médio na UE.