A actividade privada de emprego em Portugal ultrapassou em 2008 a fasquia dos 1,2 milhões de euros. À luz dos dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), o mercado está em expansão e tem níveis que fazem frente aos alcançados pelas baixas taxas de colocação dos centros de emprego. Mas para Marcelino Pena Costa, presidente da Associação Portuguesa das Empresas do Sector Privado de Emprego, o sector que representa tem ainda grandes desafios pela frente. Numa conversa com o Expresso Emprego traçou aquilo a que chama a radiografia de um sector onde a ilegalidade ainda cresce a olhos vistos, sem travão e a Lei não é de grande ajuda.
Face a uma conjuntura económica adversa que crassa nas economias mundiais, o mercado do trabalho temporário tem, segundo Marcelino Pena Costa, reagido como todos os demais sectores da economia nacional que “não pretendam morrer”. O especialista explica que “perante a janela de oportunidades que a flexibilidade constitui, e face à atitude empreendedora das Empresas de Trabalho Temporário (ETTs) abrindo novos mercados, foi possível inverter a tendência de queda que se desenhou no primeiro semestre de 2009, pouco a pouco, conduzindo a um crescimento sustentado nas vendas”. Na verdade, de acordo com os dados da APESPE, “no final do primeiro trimestre deste ano, as ETTs voltaram ao volume de colocações e à criação de emprego nos níveis de cruzeiro normais da a actividade”, refere o presidente.
Reconhecendo que o desemprego tem sempre um impacto importante na actividade das ETTs, sobretudo, pelo aumento da oferta de trabalhadores em busca de colocação e novas oportunidades de emprego, Marcelino Pena Costa, não nega que “nos momentos de crise e de contenção económica como o que atravessamos é normal que as empresas se questionem sobre se vale a pena ou não contratar uma ETT para terem, em tempo, os trabalhadores qualificados e imediatamente produtivos que necessitam por um reduzido espaço de tempo. Contudo, esta é a opção mais segura, mais barata e mais eficiente”.
Nos últimos meses, Marcelino assume que “as ETTs têm tido uma dificuldade acrescida em resolver este acréscimo de mão-de-obra, por vezes muito qualificada, gerado pela subida do desemprego conseguindo a reintegração rápida destas pessoas. Mas acredita também que há um problema cultural que é preciso resolver. Na opinião do presidente da APESPE, “a escola não prepara os jovens para o mundo do trabalho, não lhe dá a conhecer o quotidiano de uma organização, nem as suas exigências”. O responsável enfatiza a ideia que “o trabalhador temporário tem de estar permanentemente atento às suas valências, competências e saberes mantendo as suas qualificações sempre actuais de modo a posicionar-se sempre como um elemento apetecível para o mercado”. Marcelino Pena Costa diz que para um trabalhador destes, não são expectáveis grandes dificuldades de colocação.
É a Lei que cria o desemprego
E se para os candidatos o desafio é este, para o mercado do trabalho temporário, a batalha trava-se noutras frentes. Para o líder da APESPE, a visão do legislador é demasiado curta e impede este sector de ocupar as oportunidades que se coloca e as quais, diz, “somos capazes de resolver de forma célere e com qualidade”. Marcelino Pena Costa argumenta que “não há razão para que as ETTs não possam prestar serviços temporários de outsourcing , nem para os trabalhadores temporários com contrato sem termo não poderem estar mais de um ano na empresa utilizadora”. O presidente da APESPE assume estas limitações como a “perversão total” dizendo mesmo que “é a Lei que cria o desemprego contra a vontade da triangulação que se estabeleceu, porque o trabalho temporário continua a criar emprego”.
Marcelino Pena Costa diz acreditar que “chegará o dia em que o sector público de emprego se sentirá obrigado a reconhecer que devemos ser tratados como parceiros e não como inimigos”. Até porque, perspectiva, “em Portugal, o trabalho temporário vai atingir os valores médios da União Europeia, quer a miopia de alguns queira, ou não”. Fundamental é, por isso, colocar um travão na ilegalidade que, segundo reconhece, “cresce a olhos vistos no sector” (ver caixa). “Quando uma lei como a nossa pretende regular todos os passos de uma actividade, empurra para a ilegalidade aqueles que não têm vontade de a cumprir ou, simplesmente, decidem não se estruturar”, explica referindo ainda que “a ilegalidade combate-se com acções concertadas entre as empresas nossas afiliadas e a IGT em acções de auto-regulação no mercado”. Para Marcelino Pena Costa, travar a ilegalidade não é difícil “nem é preciso inventar a roda ou perseguir as ETTs. Sabe-se que cumpre, basta actuar”, conclui.
Combate à ilegalidade
Anualmente, as empresas de trabalho temporário (ETTs) estão obrigadas a fazer prova de que não têm, por exemplo, dívidas à Segurança Social e nem ao Fisco para se podem manter em exercício de actividade legal. Fruto desta obrigatoriedade, o sector das ETTs sofreu uma quebra de 34 empresas desde Janeiro de 2010 até agora. “Das 265 empresas que tínhamos em Janeiro, temos actualmente 231. São sobretudo empresas que fecharam por incumprimento das suas obrigações legais e sociais”, explica o presidente da APESPE.
A precariedade do Alvará é contestada por Marcelino Pena Costa. “Sempre dissemos às entidades oficiais que esta opção de, uma vez por ano, se verificar o cumprimento da legalidade das ETTs não fazia mais do que afastar a Inspecção Geral do Trabalho das suas funções de rotina, pois torna-se mais simples esperar para ver e não é”. O responsável da APESPE adianta mesmo que “a maior parte das ETTs que ficaram sem alvará não pagaram Segurança Social e duvido muito que ao fim de 12 meses esta entidade consiga recuperar algum dinheiro”. Marcelino Pena Costa defende por isso um outro tipo de intervenção: “bastava que as três entidades – Instituto do Emprego e Formação Profissional, Autoridade para as Condições de Trabalho e Segurança Social – que têm responsabilidade sobre a actividade, se articulassem entre si e actuassem em tempo para que as situações de incumprimento não se eternizassem, mês após mês”.
A maioria das ETTs existentes em Portugal está sedeada na região de Lisboa e Vale do Tejo (156), logo seguidas pelo Norte do país onde estão registadas 50 empresas em funcionamento. O Centro tem apenas 12 ETTs, o Algarve sete e o Alentejo, seis. Marcelino Pena Costa estima que durante o corrente ano desapareçam do mercado, pelo menos mais 30 empresas e em Março de 2011, o mercado deverá reduzir ainda em mais 35/40 ETTs, “que entretanto são ressuscitadas por um ‘testa de ferro' e vão encerrando por incumprimento e reabrindo, sucessivamente, para prejuízo dos que estando estruturados e a cumprir a lei sofrem com esta concorrência desleal e totalmente impune”, concluí o líder da APESPE.