Cátia Mateus
O PANORAMA do Trabalho Temporário (TT) está
a mudar em Portugal. Fruto da actual conjuntura económica que agudizou
o índice de desemprego, ou de uma mudança de mentalidade
face ao TT, as empresas do sector são cada vez mais procuradas
por profissionais qualificados.
De técnicos, a licenciados, ou até detentores de pós-graduações
e mestrados, o novo trabalhador temporário é tendencialmente
um jovem em busca de um lugar num mercado cada vez mais competitivo.
Mas este perfil começa também a integrar trabalhadores altamente
qualificados, com muita experiência profissional que por opção
decidem trabalhar através de empresas de TT, numa tentativa de
manter acesa a chama do desafio.
Há um ano e meio Ana Pereira concluiu a sua licenciatura em Gestão.
Fora dos anfiteatros da universidade encontrou um mercado de trabalho
onde "facilidade" é uma palavra que não se impõe.
Sem pudores afirma que "a universidade não prepara para
o mundo laboral". Depois de várias entrevistas falhadas
e de uma experiência profissional desmotivante, bateu pela primeira
vez à porta de uma empresa de TT. "Pior do que não
trabalhar na minha área era estar sem fazer nada. Comecei a pensar
que esta seria uma forma de ir ganhando experiência profissional
e algum dinheiro", relembra.
Passou por vários empregos e actualmente é uma "habituée"
do TT. "Obviamente que não quero ficar assim para sempre,
mas quando vejo o estado do mercado de trabalho e a precariedade em que
se encontram alguns colegas meus e penso que por agora talvez não
seja má ideia ser temporária", confessa Ana Pereira.
Uma postura que segundo Marcelino Pena Costa, presidente da Associação
Portuguesa das Empresas de Trabalho Temporário (APETT) tem vindo
a ganhar adeptos. Para o responsável, "há uma adesão
crescente de trabalhadores qualificados e altamente qualificados aos serviços
das ETT, no que respeita à aceitação de trabalhos
de curta, média ou longa duração".
Marcelino Pena Costa confessa que a associação a que preside
não tem ainda dados concretos no que respeita à percentagem
desta adesão, mas acredita que "deverá rondar os
25%". Um crescimento que o presidente da APETT não sustenta
com o actual panorama de estagnação de contratações
mas que diz ser "fruto de um trabalho de esclarecimento levado
a cabo pelas principais ETT quanto aos benefícios na utilização
dos seus serviços".
Adaptabilidade é o segredo do sucesso
Uma ideia também corroborada por Fernando Tavares, responsável
pelo departamento de Lisboa da empresa de TT Denci Portugal, para quem
"os trabalhadores estão cada vez mais conscientes de que
não há nada mais permanente que a mudança e que só
há uma solução: adaptar-se". Fernando Tavares
destaca que, "houve uma mudança de mentalidade por parte
do trabalhador que vê na empresa de TT uma entidade idónea
para o cumprimento das obrigações patronais".
Também para João Lourenço, presidente da empresa
de TT Atlanco, os crescentes índices de adesão dos trabalhadores
qualificados às empresas de TT apenas significa que "a
actividade de TT atingiu já a maturidade necessária para
que seja eleita cada vez mais por diferentes tipos de trabalhadores, com
qualificações variadas, ajudando também o facto da
lei prever que as condições dos TT sejam equivalentes às
dos trabalhadores-quadros da empresa utilizadora".
Aos serviços das ETT recorrem de forma crescente jovens ou recém-licenciados
com boas qualificações, mas pouca experiência profissional.
As áreas são distintas: Recursos Humanos, História,
Línguas, Contabilidade, Gestão, Economia, Direito, Sociologia,
Banca e até áreas mais técnicas como a Engenharia
e profissões especializadas na área da metalo-mecâncica.
Mas se são muitos os que recorrem às ETT sem qualquer experiência
profissional, Marcelino Pena Costa destaca também um outro tipo
de profissionais que encontra no TT uma saída. "Há
profissionais altamente qualificados e com muita experiência profissional
que decidiram, por opção, trabalhar através de empresas
de TT porque assim se sentem permanentemente desafiados e livres para
gerirem a sua carreira à medida das suas decisões pessoais",
explica. Segundo o presidente da APETT, "estes trabalhadores recusam
normalmente propostas de integração nas empresas utilizadoras
porque essa não é a forma que escolheram para viver a sua
vida".
Oportunidade para novos desafios
Regra geral os candidatos a TT procuram, segundo Fernando Tavares, "funções
dentro da sua área de formação, mas face à
escassez de oferta que afecta muitos sectores, acabam por aceitar trabalho
noutras áreas". Mas Marcelino Pena Costa salienta também
a existência de um grupo de profissionais que encontram no TT "uma
oportunidade para experimentar outras áreas onde os seus conhecimentos
não se aplicam directamente mas que se sentem capazes de, com alguma
formação, chegarem a bons desempenhos".
Para João Lourenço, as ofertas que surgem nas empresas de
TT também terão contribuído para atrair novos candidatos.
"Existem hoje situações de projectos específicos
em que se recorre ao TT como meio de contratação, nomeadamente
na instalação de novas empresas em Portugal, ou participação
em projectos pontuais em Portugal por empresas estrangeiras que não
têm estrutura em território nacional, em que os quadros técnicos
e de direcção também são contratados em regime
temporário", refere.
Entre estes profissionais do TT, não paira a dúvida de que
a procura desta forma de trabalho por profissionais cada vez mais qualificados
é uma tendência a continuar. Defendem que o trabalho temporário
é uma excelente ferramenta na progressão de carreira e aquisição
de novas experiências profissionais.
E para Marcelino Pena Costa é tudo um sinal dos tempos. O responsável
explica que "hoje, um trabalhador, seja ele qual for, se não
se actualizar e adquirir novas e diversificadas competências, quer
profissionais quer pessoais, sabe que tem um 'prazo de validade profissional'
cada vez mais curto arriscando-se a ficar desadequado para lidar com os
novos modelos da sua profissão".