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Somos tecnológicos?

11.03.2005


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Maribela Freitas e Ruben Eiras

SE PORTUGAL não duplicar as taxas de formação e de emprego nas áreas de ciência e tecnologia na próxima década, o país arrisca-se a definhar num atraso crónico na convergência de qualificações tecnológicas com a UE. De acordo com o Eurostat, apesar de Portugal apresentar o dobro do ritmo de crescimento do emprego tecnológico, em comparação com a média da UE (ver tabela em baixo), a percentagem de jovens entre os 25 e os 34 anos de idade que escolhe a área tecnológica está muito abaixo da média europeia. Por outro lado, e ainda segundo a mesma fonte, o país possui quase sempre metade dos valores em todas as categorias do emprego científico.


Carmen Pinheiro é uma das excepções à regra. Tem 31 de anos de idade, é doutorada na área da engenharia química e trabalha há quase um ano na direcção técnica da fábrica da Compal. «É difícil conseguir trabalho numa empresa quando se possui um doutoramento. Não existem muitas empresas em Portugal a apostarem na área de investigação & desenvolvimento (I&D), o que dificulta a inserção profissional desta população», lamenta.

Doutorados mostram-se às empresas

Esta trabalhadora altamente qualificada conseguiu o emprego através do programa de inserção de doutorados e mestres em empresas da Agência de Inovação (Adi) . «Este tipo de iniciativas são muito importantes, já que possibilitam aos doutorados conhecerem as empresas e divulgarem as suas competências», reforça.

António Brandão Moniz, sociólogo industrial e docente da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa, afirma, porém, que o Estado não se pode limitar a medidas voluntaristas deste género. O salto qualitativo no emprego depende da introdução de reformas estruturais no sistema educativo e empresarial. «A alteração desta situação vai requerer um enorme esforço de investimento em todos os níveis de educação, mas sobretudo nos superiores, e no secundário. A preparação formativa na área científica e tecnológica é fundamental», defende o sociólogo.

Este responsável defende que o grupo profissional dos «cientistas e engenheiros» (que representa perto de 3% da população activa portuguesa) deveria crescer acima da taxa anual de 1% registada entre 2000 e 2003. «Temos de passar dos actuais 3% para o dobro desse peso relativo nos próximos anos. Isso implicaria níveis de crescimento anual a rondar os 10%», refere aquele sociólogo.

Mas não basta só multiplicar a formação de capital humano altamente qualificado. A dinamização de investimento empresarial de alto valor acrescentado é urgente. «São precisos mais empreendedores deste calibre. Só que em Portugal a abordagem tecnológica é realizada por arrastamento — ou nos é trazida por multinacionais ou é empurrada por fundos europeus», argumenta Francisco Lopes dos Santos, director da Agesfal, uma empresa de formação em gestão.

Luc Soete, especialista em economia da inovação e docente na Universidade de Maastricht, corrobora estas perspectivas. «Portugal está em fase de arranque, no bom caminho, mas tem de acelerar o passo», salienta o investigador, que esteve em Lisboa na semana passada como orador na conferência sobre a «Sociedade em Rede e a Economia do Conhecimento» promovida pela Presidência da República, a qual teve lugar no Centro Cultural de Belém.

Para este professor holandês, o problema português centra-se na falta de massa crítica das sinergias entre o tecido empresarial e o I&D. «Um estudo recente que elaborei sobre a economia do conhecimento mostra uma emergência consolidada de PME tecnológicas de iniciativa local no país e o aumento de criadores de inovação — as barreiras são a falta de escala e a baixa difusão do saber pelo resto do tecido empresarial, especialmente na indústria», refere.

Basta ver os números. Segundo o Eurostat, a dimensão do emprego tecnológico e científico no sector é de apenas 7,7% do total de postos de trabalho, enquanto que a média europeia é de 13,3% (ver tabela em baixo). Em contrapartida, o sector dos serviços está bem mais próximo da bitola europeia.

«Parece claro que o espaço de evolução do emprego tecnológico nacional será sobretudo nos serviços», sublinha Francisco Lopes dos Santos. Neste plano, o painel de especialistas contactado pelo EXPRESSO enumera que os segmentos de actividade mais dinâmicos são os das telecomunicações, dos serviços às empresas, do «software» e os financeiros.

Porém, de acordo com António Brandão Moniz, o facto destes sectores serem os mais globalizados e da inovação ser uma competência crítica poderá induzir, no médio prazo, à sua deslocalização. «Se estas empresas forem muito inovadoras em Portugal, podem ser adquiridas por outras entidades e as actividades produtivas serem relocalizadas em países como a Hungria ou a República Checa, onde com o mesmo nível de qualificação se pagam salários muito mais baixos, sendo por isso atractivos para as grandes empresas que decidem com base em custos de trabalho», alerta o docente.

Dado este panorama, aquele especialista sugere que Portugal tem que estabelecer uma estratégia de posicionamento na cadeia de valor global. «Temos que desenvolver um conjunto de actividades a montante e a jusante que dê significado à sua localização e desenvolvimento em Portugal, mesmo que estas se desenvolvam a nível internacional», remata.

Apoios ao emprego

EM PORTUGAL existem apoios à contratação e sítios da Internet onde se pode procurar emprego nesta área. A Fundação para a Ciência e Tecnologia, do Ministério da Ciência, Inovação e Ensino Superior visa incentivar a investigação científica e o desenvolvimento tecnológico nacionais através do financiamento de bolsas, projectos e instituições de investigação científica

Esta entidade dispõe de linhas de apoio à inserção profissional de investigadores doutorados quer estejam em Portugal ou no estrangeiro. Entre estas conta-se a linha de apoio à contratação de doutorados e mestres nas empresas, que pode ser solicitada através da Agência de Inovação (ADI) e que já inseriu 103 doutorados e 98 mestres.

No sítio da Internet http://www.astrolabium.pt — Portal de mobilidade de investigadores, poderá aceder a informações úteis como oportunidades de emprego e de bolsas. As empresas podem também introduzir ofertas de trabalho. Já o sítio da Internet http://www.degraucientifico.pt foi criado pela ADI para fomentar o contacto entre candidatos altamente qualificados e empresas de carácter científico.

Por sua vez, em Julho de 2004 foi criado o primeiro Núcleo de Investigação e Desenvolvimento Tecnológico no Sector Empresarial através do sistema de apoio à sua criação da (ADI). De acordo com Joaquim Borges Gouveia, administrador da ADI, «já foram criados cerca de 40». Estes núcleos visam, entre outros objectivos, criar competências internas de I&DT nas empresas, bem como estimular a sua apetência para prosseguir essas valências.

Emprego tecnológico, em % da população activa


Cientistas e engenheiros Crescimento 2000-2003 (%) População licenciada em C&T Crescimento
2000-2003 (%)
População empregada em C&T Crescimento 2000-2003 (%) Portugal 1,25 1 5,4 3 9,12 1,5 UE 15 2,99 2,1 9,96 2,5 17,25 2,4

Emprego tecnológico, em % por sectores

s Indústria Serviços Serviços intensivos em conhecimento(*) s População empregada em C&T População empregada em C&T População empregada em C&T Portugal 3,4 7,7 11,2 UE 15 9,8 13,3 17,1

(*) inclui empresas de software, educação, saúde
Fonte: Eurostat, 2004





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