align=justify>Cátia Mateus e Marisa Antunes
Cada profissão tem o seu risco, mas há algumas com maior propensão à ocorrência de danos físicos ou episódios de violência. Bombeiros, polícias, enfermeiros e até professores são alguns dos profissionais que quotidianamente desafiam os riscos. No Verão, são os bombeiros quem mais arrisca. Há uma semana, o incêndio provocado pela incúria de um jovem agricultor, ao utilizar uma máquina agrícola, com propensão para fazer faíscas, provocou a morte de seis bombeiros, em Famalicão da Serra. No ano passado, foram 12 os soldados da paz que perderam a vida para salvar a de outros.
Autênticas vítimas da maldade, loucura e negligência alheia, os bombeiros sofrem ainda com a falta de condições que poderiam senão travar, pelo menos diminuir a tendência crescente de mortes. «Enquanto profissional de risco tenho de estar devidamente protegido para proteger. Mas isso nem sempre acontece», realça Fernando Curto, presidente da Associação Nacional dos Bombeiros Profissionais (ANBP).
Às deficiências nos meios terrestres e aéreos, somam-se carências tão básicas como as de vestuário. «Os bombeiros não podem andar a apagar fogos em mangas de camisa. Precisam de fatos especiais, botas, máscaras. Mas nem sempre há dinheiro para este equipamento», reforça o responsável da ANPB. Mas não só. Um maior controlo dos meios aéreos (fundamentais para dominar os incêndios mais intensos), por parte do Governo e uma aposta na profissionalização do sector (com o consequente reforço na organização), poderiam diminuir o número de vidas a lamentar, defende ainda Fernando Curto. Existem em Portugal, dez mil bombeiros profissionalizados e cerca de 25 mil voluntários.
Na lista das profissões cujo desempenho tem um risco associado estão também os enfermeiros. Anabela Silva soma 10 anos ao serviço da enfermagem. Ao longo do seu percurso profissional já passou por várias unidades hospitalares. Em todas elas, confessa, «o grau de risco está sempre presente seja ao nível da exposição a contágios ou a actos de violência por parte de doentes ou dos seus familiares». Anabela experienciou uma situação de violência há cerca de oito anos. «Estava de serviço ao hospital na noite da passagem de ano, que é sempre uma altura em que se cometem excessos, e fui agredida por um jovem alcoolizado no momento em que tentava socorrê-lo», relembra. Teve de receber tratamento hospitalar e ainda hoje tem dificuldade em lidar com situações semelhantes.
Segundo Guadalupe Simões, do Sindicato dos Enfermeiros Portugueses (SEP), «a natureza dos episódios de agressão para com enfermeiros é variada, sendo a mais comum a agressão verbal», explica. A responsável refere que existem poucos dados sobre esta problemática, «muito por culpa dos profissionais de saúde que têm uma tendência para desvalorizar as situações com que são confrontados raramente comunicando aos seus superiores situações de agressão».
Guadalupe Simões esclarece que entre as maiores ameaças de que os enfermeiros são alvo figuram as picadas, quedas, contusões, problemas osteomusculares e os acidentes de viação, com os enfermeiros que fazem domícilios. A responsável do SEP não nega contudo que «há casos de enfermeiros que morreram com patologias decorrentes de contágio por picadas de agulhas infectadas, acidentes de viação e até espancados por doentes».
Em Portugal a questão dos riscos profissionais associados à prática da enfermagem é pouco estudada e por isso são poucas as medidas de prevenção que já tomaram. Uma realidade que segundo Guadalupe Simões contrasta com o caso do Canadá onde, «há dez anos que se têm vindo a desenvolver fortíssimas campanhas de sensibilização da população por causa das agressões de que os enfermeiros são vítimas e que são uma das consequências do abandono da profissão».
Ser professor, em Portugal, também já foi mais fácil. Que o diga Patrícia Oliveira, docente numa escola secundária da área da grande Lisboa (cujo nome prefere não revelar), que recentemente foi alvo de uma tentativa de agressão, em plena sala de aula, por parte de um aluno descontente com os resultados do ano lectivo.
A professora de 29 anos lembra ainda que a violência de que os professores são alvo quotidianamente não é apenas de ordem física. «Diariamente há relatos de danos materiais causados, por exemplo, nas viaturas dos professores, sem esquecer a agressividade verbal dos alunos face aos docentes», regista. Patrícia Oliveira, não hesita em afirmar que «neste momento parecemos estar perante a cultura do desrespeito e a autoridade que sempre caracterizou a figura do professor, parece ter perdido o valor».
Para ajudar os docentes na gestão da violência escolar vai ser criada a linha SOS Professor, com técnicos especializados que darão não só apoio psicológico, jurídico e de mediação de conflitos. «A linha telefónica vai começar a funcionar já no início do ano lectivo e qualquer professor que se sinta coagido ou pressionado poderá ligar-nos», pormenoriza João Grancho, presidente da Associação Nacional de Professores (ANP). Reconhecer que se está perante um «problema real» é o primeiro passo para combater o fenómeno crescente de violência, realça João Grancho.
Só no ano lectivo de 2004/2005, 79 professores (e 139 funcionários escolares) foram agredidos por alunos ou seus familiares. Entre as cerca de 100 medidas sugeridas pela ANP ao Governo para diminuir a agressividade nas escolas, está, por exemplo, o recurso a técnicos sociais de educação, figuras já vulgarizadas nas escolas americanas, dinamarquesas ou finlandesas, para mediar conflitos e acompanhar de perto as crianças mais problemáticas.
Profissionais de risco, por excelência, os agentes da Polícia de Segurança Pública (PSP) têm assistido nos últimos anos a um aumento das ameaças à sua integridade física. São agredidos, atropelados, baleados. Alguns acabam por morrer. Só neste ano, nos primeiros quatro meses, 256 polícias ficaram feridos devido a confrontos corporais, atropelamento, utilização de objectos contundentes, arma branca, «spray», arma de fogo, entre outras causas de violência. Isto significa que, em média, por cada semana que passou, 16 profissionais da PSP sofreram ferimentos, a um ritmo de dois por dia.