Maribela Freitas e Ruben Eiras
A TAXA de crescimento da produtividade dos trabalhadores portugueses tem vindo a decrescer nos últimos 40 anos. Com efeito, conforme demonstram os números do relatório da Comissão Europeia sobre a economia da UE de 2004, até 1999, no conjunto da Europa dos 12 (Reino Unido, França, Bélgica, Luxemburgo, Espanha, Grécia, Itália, Holanda, Alemanha, Irlanda, Dinamarca e Finlândia), Portugal apresentou sempre valores superiores à média europeia (ver tabela em baixo).
Todavia, a partir de 2000, o país começou a divergir na produtividade:
a taxa de crescimento chegou a ser negativa em 2003. No ano passado,
registou-se um ligeiro aumento mas, as previsões não antevêem, nos próximos
tempos, um desempenho acima da performance da Europa dos 12.
«A evolução dos últimos anos tem sido preocupante»,
sublinha Leonor Modesto, economista e docente na Universidade Católica,
que considera, aliás, que «este desempenho da produtividade
pode ser considerado desastroso», frisa.
Não obstante este cenário, é possível, segundo alguns especialistas
em economia e recursos humanos, aumentar a produtividade com algumas
pequenas mudanças de comportamento e de hábitos de trabalho. A principal
pedra- -de-toque para o crescimento da produtividade é a mudança de
atitude face à organização do trabalho e do tempo. «Não é necessário
trabalhar durante mais tempo, mas sim melhor. O trabalho em Portugal
é pouco produtivo porque se trabalha mal. E uma razão determinante para
isso é a má organização do processo laboral. Um trabalhador será sempre
pouco produtivo se for mal orientado», frisa António José Morgado,
economista e docente da Universidade Nova de Lisboa.
Amândio da Fonseca, director-geral da Egor, corrobora esta perspectiva,
sublinhando que as empresas são, em parte, responsáveis pela escassez
de produtividade dos seus quadros. Para inverter esta situação, aquele
responsável defende que «a empresa tem que tomar medidas de
racionalização dos processos, definindo bem o conteúdo funcional de
cada um dos postos de trabalho existentes».
Neste plano, Maria Patriarca, directora da TMI Portugal, salienta que
a empresa também tem a obrigação de definir claramente os seus objectivos
e comunicá-los à sua força laboral. «Só assim as pessoas têm
condições para classificar as tarefas de acordo com a sua importância,
para poderem estabelecer prioridades. Se esta a informação não está
disponível ao nível individual, torna-se mais complicado saber se estamos
a trabalhar para atingir resultados alinhados com os objectivos empresariais»,
observa. Se este for o caso, o resultado é o desperdício de tempo em
actividades não produtivas.
Mais responsabilidade no trabalho
Mas esta «revolução cultural» da produtividade não depende só da mudança
de estilo de gestão dos empresários — os empregados também têm a sua
quota parte de mudança.
A nível do trabalhador português, de acordo com Maria Patriarca, o principal
obstáculo ao crescimento da produtividade é a fraca noção de responsabilidade
individual no desempenho das funções. «Ficamos facilmente satisfeitos
connosco quando identificamos ‘os culpados’ da situação’»,
afirma aquela especialista. Ou seja, a partir do momento em que o trabalhador
percepciona que são os «outros» que o interrompem, que não planeiam
e lhe pedem «as coisas para ontem», a atitude normal
é «ficar tranquilo».
«O argumento é de que a empresa ou organização não nos dá as
condições ideais», explica Maria Patriarca. «Se a culpa
não é nossa, o nosso papel é de vítima, não de pessoa co-responsável
pela procura de soluções. E a vítima, por definição, o que tem de fazer
é queixar-se, não é contribuir para procura de soluções», esclarece.
Um comportamento que urge mudar.
Outra acção a levar a cabo para rentabilizar o tempo de trabalho é a
redução dos tempos mortos. Maus hábitos, tais como cafés a mais ou almoços
demorados, devem ser erradicados. Uma das soluções pode passar pela
«existência de um café ou cantina no local de trabalho, o que
promove o convívio entre colegas e afasta este tipo de comportamentos»,
sugere Mário Costa, director-geral da Select. Jorge Gomes, docente da
área da psicologia das organizações no Instituto Superior de Psicologia
Aplicada, acrescenta ainda que o profissional deverá evitar a visualização
excessiva da Internet e aprimorar-se na gestão do tempo, «cumprindo
os prazos estipulados para a finalização dos trabalhos».
Uma outra competência a desenvolver para aumentar a produtividade é
a capacidade de ser um profissional «multitarefa», ou seja, ser capaz
de executar duas a três tarefas em simultâneo, como por exemplo, ler
um «e-mail» e responder, ao mesmo tempo que atende um telefonema.
Autodisciplina é fundamental
Segundo Maria Patriarca, para que o trabalhador «multitarefa» seja bem
sucedido e a qualidade do trabalho não seja afectada, além de muita
autodisciplina, é aconselhável que o grau de interdependência entre
as diferentes tarefas seja elevado, «concorrendo todas para
um mesmo objectivo, para evitar uma grande dispersão».
Contudo, a liderança também tem de ser coerente: as chefias têm de dar
o exemplo e não descurar o investimento no capital humano. «O
empresário tem de dar formação adequada ao posto de trabalho, incentivar
os trabalhadores a todos os níveis, premiar a assiduidade e o mérito
e definir objectivos. Se as pessoas os cumprirem, devem ser recompensadas»,
conclui Mário Costa.
As 6 regras de ouro
1. Incentivos: Como todos os agentes económicos, os
trabalhadores reagem a incentivos. Para tal, é necessário que o esforço
e o empenhamento sejam recompensados. É prioritário que a remuneração
auferida e a progressão na carreira sejam claramente dependentes do
desempenho, com prémios para boas «performances» e penalizações para
maus resultados. A lei laboral portuguesa vigente, apesar das recentes
tentativas de alterações, não permite em certos casos este tipo de actuação:
por exemplo, na função pública, as carreiras são pouco ou nada influenciadas
pela «performance».
2. Formação: Para sermos mais produtivos precisamos
de ser mais qualificados. É necessário mais investimento público e privado
em formação. Contudo, esta tem de ser adequada aos objectivos. Não basta
gastar mais em acções formativas — 10 é preciso determinar qual o tipo
de formação em que devemos investir.
3. Gestão: O enquadramento geral não favorece muito
a produtividade. As nossas empresas, sobretudo as pequenas, as quais
representam uma fatia importante do tecido empresarial português, são
frequentemente mal geridas: não existem objectivos claros quer em matéria
de mercado a servir, investimentos a realizar, tecnologias a incentivar
ou tipo de técnicos a contratar e formar. É preciso uma melhor gestão
das operações e dos objectivos se queremos ser mais produtivos.
4. Concorrência: O peso do Estado na economia e a existência,
em vários sectores, de situações ambíguas em termos de ambiente concorrencial,
não favorecem nem a produtividade nem a inovação. Portugal, para ser
mais produtivo, precisa de menos Estado produtivo e de mais ambiente
concorrencial.
5. Inovação: Ser mais produtivo não é apenas produzir
mais. É também produzir melhor e com mais qualidade. Produzir produtos
mais sofisticados, tecnologicamente mais avançados que valem mais dinheiro.
Para isso, é preciso inovar, investir em novas tecnologias e na formação
de trabalhadores que as saibam explorar.
6. Disciplina: Finalmente, é preciso mais disciplina
e exemplo: no trabalho, nas empresas e na contabilidade pública.
Fonte: Leonor Modesto, economista, 2005
Taxa de crescimento da produtividade do trabalho (%) face
à Europa dos 12 (*)
s
1961-1973
1974-1985
1986-1990
1991-1995
1996-2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
Portugal
6.6
2.6
4.6
2.3
1.8
0.3
0.1
-0.8
0.9
1.1
1.2
EU12
4.8
2.1
1.9
1.9
1.2
0.3
0.4
0.5
1.7
1.1
1.2
Fonte: European Economy 2004, Anexo Estatístico
(*) Reino Unido, França, Bélgica, Luxemburgo,
Espanha, Grécia, Itália, Holanda, Alemanha, Irlanda, Dinamarca,
Finlândia