Cátia Mateus, Fernanda Pedro, Maribela
Freitas e Ruben Eiras
RUI BRITO, 27 anos, demorou três anos até
encontrar a sua vocação. Inserido numa família com
fortes tradições na advocacia, não lhe foi dado muito
espaço para optar por outra via. O pai já o encarava como
advogado mesmo antes de entrar para a universidade. Um ano foi quanto
passou na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. "Não
resisti mais. Não era, definitivamente, a minha vocação",
confessa. Transitou para Relações Internacionais, mas também
não ficou por aí. À terceira foi de vez. "Gestão
é definitivamente aquilo que me fascina até porque tenho
já um projecto empresarial em gestação",
explica Rui Brito. Reconhece que, "muitas vezes a família
influencia-nos a seguir por uma área que não é a
melhor para o nosso perfil e é muito complicado ganhar algumas
batalhas aos 18 ou 19 anos".
A vocação é fundamental, mas não chega
Sem receios, assume que "a decisão de tirar um curso
de Gestão depois de duas experiências na área das
humanidades não tem a ver com razões económicas".
Embora reconheça que o mercado de trabalho na área das
letras está muito mais saturado, garante que a sua escolha "é
mesmo uma questão de vocação e gosto profissional".
A alternativa de Rui Brito em tentar estudar uma área que gosta
já depois de ter definido o seu percurso profissional é
um exemplo que pode ser seguido por outros jovens. E, na verdade, essa
solução é por vezes aconselhada pelos orientadores
de carreira.
Segundo Hélia Moura, directora de serviços de informação
e orientação do Instituto do Emprego e Formação
Profissional (IEFP), a orientação profissional passa muito
pelo papel de conselheiro e nunca de decisor, "porque esse cabe
apenas à pessoa que está a iniciar a sua carreira".
Mas Hélia Moura refere que, por vezes, aquilo que os jovens consideram
por vocação pode ser, na realidade, um interesse momentâneo
e, "por isso, aconselhamos a que eles desenvolvam essa actividade
apenas como um hóbi e só depois devem escolher".
O primado da vocação
Segundo Jorge Manuel Ribeiro, director nacional da área de recrutamento
e selecção do Grupo Select Vedior, os factores mais determinantes
na escolha de um curso superior são, em primeiro lugar, "a
vocação do candidato" e, em segundo lugar, "a
perspectiva de empregabilidade".
Para Maria José Bravo, responsável da empresa de recursos
humanos Selgec, "hoje os jovens avaliam bem as componentes vocacional
e económica na altura de seleccionar o curso a que irão
concorrer".
A especialista adianta que se há alguns anos a preocupação
era frequentar os cursos que davam prestígio, actualmente os
jovens dão grande atenção às saídas
profissionais. Maria José Bravo esclarece que "há
já a mentalidade de que a vocação está acima
de tudo" (ver caixa).
O exemplo de Joana Reis é paradigmático desta tendência.
Com 25 anos, a escolha da licenciatura em Ciências da Comunicação
e da Cultura na vertente de Jornalismo surgiu através do gosto
pessoal pelas letras. Foi a partir do 10º ano de escolaridade que
esse desejo se tornou mais claro e a opção pela comunicação
social aconteceu depois de estudar as várias oportunidades de
percurso profissional no mundo das letras.
Relativamente ao peso das saídas profissionais do curso que escolheu,
Joana Reis refere que esse factor não influenciou a sua decisão,
já que "actualmente em qualquer área é
difícil a inserção no mercado de trabalho e por
isso investi naquilo que gostava". Reconhece que não
sofreu qualquer influência para seguir este curso, nem mesmo por
parte da família.
Neste momento encontra-se a estagiar mas não quer fazer muitos
planos para o futuro, porque o "mais importante é agarrar
as oportunidades que surgem, deixar seguir o curso das coisas e acima
de tudo mostrar muita vontade de trabalhar".
A marca do professor
De acordo com Cristina Silva, professora universitária da área
da psicologia educacional, docente do Instituto Superior de Psicologia
Aplicada (ISPA), outros factores que poderão condicionar a escolha
de um curso são a pressão familiar para seguir determinado
caminho, a perspectiva da remuneração que algumas profissões
poderão proporcionar.
Além disso, sublinha que "a influência de um professor
pode ser decisiva, nomeadamente se se gosta muito da disciplina que
este lecciona. O problema é que muitas vezes se segue esse caminho
sem ter consciência dos currículos e das saídas
profissionais que este oferece", esclarece.
Na questão da orientação para um caminho profissional
as escolas devem desempenhar um papel. "A escola deve ter uma
palavra a dizer no auxílio para a orientação do
aluno relativamente ao curso que este quer tirar. Ou seja, proporcionar
os currículos, levá-los à recolha de informação
e à verificação de saídas profissionais",
remata Cristina Silva.
TRABALHAR COM PRAZER
QUANDO escolhem uma licenciatura, os jovens universitários portugueses
valorizam acima de tudo um trabalho que lhes dê prazer e que seja
ajustado à sua vocação.Este é um dos resultados
de um recente estudo denominado "Diversidade na Universidade"
conduzido em conjunto pelo Observatório Permanente da Juventude
Portuguesa, um organismo do Instituto Português da Juventude,
e uma equipa de investigadores do ISCTE. Os dados foram recolhidos com
base em mais 200.000 inquéritos distribuídos por várias
instituições de ensino superior nacional. Segundo aquela
investigação, os outros factores que influenciam mais
na escolha de um curso são o desejo de completar a formação
para desenvolver potencialidades pessoais, conquistar uma profissão
qualificada e razoavelmente bem remunerada e conseguir intervir na vida
social.