Dizer que a geração dos baby boomers (nascida entre a década de 50 e 60) tem maiores dificuldades em adaptar-se à tecnologia e por isso é preferível apostar na contratação de perfis mais juniores, é um argumento que facilmente cai por terra se pensarmos, por exemplo, que dificilmente um recém-licenciado ou um profissional nos primeiros anos de carreira terá a experiência necessária para liderar uma negociação em contexto de adversidade, gerir a motivação de uma equipa num cenário de crise ou assegurar com sucesso tantos outros desafios que a gestão quotidiana de uma organização exige. Empresas de sucesso são as que combinam em equilíbrio diferentes níveis de senioridade empresarial, porque a diversidade de visões e experiências só pode fazer parte da solução e nunca ser um problema. Mas em Portugal, a idade ainda é um factor de discriminação nos processos de recrutamento.
Não é aos 40 nem aos 45, ao contrário da ideia que se generalizou, que se torna mais difícil encontrar emprego. É aos 50 anos que os profissionais começam a travar duras batalhas para vencer o desemprego ou a procura de novas oportunidades de carreira. Alexandra Andrade, diretora-geral da empresa da Spring Professionals, especializada no recrutamento de quadros médios superiores, explica que “a partir desta idade encontramos muitos profissionais de qualidade no mercado que só encontram oportunidades como freelancers”. O que leva as empresas a não optarem por estes profissionais? Para especialista, os argumentos mais ouvidos entre as organizações são “o facto de serem seniores demais, ou estarem há demasiado tempo fora do mercado, terem 'vícios' de trabalho adquiridos” ou até a ambição das empresas serem associadas a marcas com um ADN cultural jovem.?Há outro factor que também pesa na decisão dos empregadores: os custos.
“A discriminação acontece principalmente porque existem jovens qualificados à procura de emprego, que aceitam desempenhar funções por valores inferiores e os profissionais mais seniores têm de assumir uma posição mais flexível ao nível de valores salariais”, explica. Existe em muitos casos uma elevada discrepância entre os valores salariais praticados hoje e há cinco ou dez anos atrás. “Cabe aos profissionais esta adaptação”, enfatiza Alexandra Andrade. Marta Melo, diretora do Centro de Gestão de Carreira do The Lisbon MBA (TLMBA), uma formação executiva muito procurada por profissionais à procura de uma valorização da sua carreira, prefere não falar em discriminação etária nas contratações, argumentando que “a idade do candidato a contratar está diretamente relacionada com a senioridade requerida para a função”. Contudo, reconhece que “o que pode acontecer, por vezes, é que a empresa está limitada no valor que poderá pagar ao candidato, e como sabemos a experiência é sinónimo de salário elevado e, como tal, as empresas acabam por procurar profissionais com menos anos de experiência”.
Vantagens do recrutamento sénior
Alexandra Andrade reconhece que, aos poucos, a tendência de penalizar a senioridade começa a dar sinais de inversão e “hoje em dia as empresas já realizam um esforço maior na contratação de profissionais acima dos 40 anos”, mas ainda há um longo caminho a percorrer. Num país envelhecido, a dinamização do mercado de trabalho para profissionais mais seniores é um desafio. Cumpri-lo com sucesso implica antes de mais colocar de lado uma serie de preconceitos que continuam a limitar a contratação destes profissionais. Uma limitação que segundo a diretora da Spring não é apenas nacional. “A nossa realidade reflete a realidade nacional”, explica acrescentando que “há um esforço para começar a contrariar o mercado, valorizando os profissionais que se encontram nestas faixas etárias e que são pessoas qualificadas, seniores, aptas, com espírito crítico, com uma motivação e sentido de responsabilidade acrescidas e por isso, válidas para desempenhar as funções a que se candidatam”.
E são múltiplas as mais-valias que um profissional experiente pode trazer a uma empresa. Contrariamente ao que é comum argumentar-se e esterótipo que se criou sobre a aversão dos perfis mais seniores à inovação e tecnologia, um estudo recente da escola de negócios da Universidade de Sydney demonstra que as empresas que integram profissionais mais experientes são mais inovadoras (ver caixa). Mas há outras vantagens em “contratar experiência”. Para Marta Melo, “sem dúvida que o payback da contratação de profissionais com experiência num determinado sector ou função é uma verdadeira mais-valia”. A líder de carreiras do TLMBA realça que “para além das competências técnicas, há toda uma dimensão de competências mais comportamentais que deve ser valorizada. A maturidade para gerir momentos de maior adversidade, a resiliência para enfrentar os problemas e apresentar soluções diferenciadas ou a capacidade para lidar e gerir de forma eficaz as emoções”. A experiência é fonte de auto-conhecimento e facilidade de definição do que é verdadeiramente importante e, garante, “traz muitas vezes o bom senso que tantas vezes escasseia na gestão de diversas situações”.
A consultora imobiliária Remax já o percebeu. A empresa tem vindo a desenvolver uma política de inclusão de profissionais seniores com bons resultados práticos. Beatriz Rubio, CEO da Remax Portugal, explica que atualmente “cerca de 1400 pessoas que trabalham para a rede imobiliária têm mais de 50 anos e percursos de vida diversos”. A maioria destas pessoas (mais de 1200) são agentes, mas também há donos de agências (81) e recursos administrativos (80) que trabalham nas agências imobiliárias. A líder da Remax Portugal reconhece que “as pessoas a partir dos 40/45 anos têm dificuldade em reentrar no mercado de trabalho e nas multinacionais, em particular, mas são muito válidas”. Beatriz Rubio realça a riqueza da experiência profissional e a sabedoria destes profissionais que, reforça, “dependendo das funções, poderão ter uma performance mais adequada aos objetivos pretendidos”. No sector imobiliário, “a atitude com que enfrentamos o trabalho é determinante para o sucesso”, explica a CEO acrescentando o peso decisivo da experiência e da maturidade nesta atitude. O agente mais experiente da Remax tem 79 anos e segundo Beatriz Rubio “estas 1400 pessoas seniores que integram a equipa têm um peso de 1/3 na faturação total da rede”.
Integração é para Marta Melo o segredo do sucesso. A líder do centro de carreiras do TLMBA realça que “a integração de várias gerações de profissionais numa empresa é um factor crítico de sucesso numa organização” acrescentando que “a transmissão e troca de conhecimento entre gerações é uma mais-valia para qualquer empresa no mercado”. Alexandra Andrade, a diretora da Spring corrobora a afirmação reconhecendo, porém, que é ainda necessário que as empresas entendam que “este tipo de profissionais representam valor” e facilitem a sua inserção no mercado de trabalho, “apoiando e manifestando interesse na sua integração”. Para Alexandra Andrade é não não só fundamental como urgente, que os representantes políticos discutam estas questões e aprovem leis nesse sentido. Tanto mais que para a especialista a presença de perfis seniores nas empresas não dever ser vista como um problema, mas antes como a solução para muitos dos desafios atuais das organizações, pela experiência e conhecimento que conferem aos processos de gestão.
Empresas que recrutam seniores são mais inovadoras
A discriminação etária nos processos de recrutamento, que ocorre não apenas em Portugal mas também noutros países, está fundamentada em falsas premissas. Esta é a conclusão a que chegou a investigadora Leanne Cutcher, professora associada da escola de gestão e negócios da Universidade de Sydney (University of Sydney Business School) num estudo onde analisou o impacto da diversidade de gerações nas organizações e onde concluiu que as empresas que empregam perfis seniores têm maior propensão a inovar.
“Ao contrário dos preconceitos e estereótipos que se foram generalizando, as empresas mais inovadoras são aquelas para quem a idade dos seus funcionários não é relevante”, explica a investigadora. Uma das empresas mais inovadoras, entre as várias analisadas no estudo conduzido por Leanne Cutcher e a sua equipa, foi a Siemens Healthcare Austrália, uma tecnológica vocacionada na área da saúde, com um CEO jovem a gerir uma equipa com uma média de idades na ordem dos 65 anos. Para o CEO da empresa, Michael Shaw, o foco não está, nem nunca esteve na idade. “A Siemens escolhe as melhores pessoas para a função e para mim é irrelevante se a pessoa em causa tem 20 anos ou 60. Aquilo que procuro são os melhores talentos com a melhor atitude”, realçou no âmbito do estudo.
Segundo a investigadora, a Siemens Healthcare percebeu que a ideia generalizada de que os perfis mais jovens têm falta de experiência e os mais seniores excesso dela era totalmente descabida e limitava a troca de ideias e propensão para inovar na empresa. “Onde a idade não importa é onde mais se inova”, conclui Leanne Cutcher acrescentando que em organizações muito agarradas ao facto idade, os perfis mais seniores que têm boas ideias “não as partilham porque alguém lhes disse que são demasiado velhos e agarrados ao passado”. Para a investigadora, “há uma ideia falsa e generalizada de que só as pessoas jovens podem inovar e ter ideias disruptivas e criativas. A investigação que conduzimos prova o contrário: os perfis mais seniores não só são motores de inovação, como são parte da solução sustentável para uma série de desafios que se colocam nas organizações atuais ”.