Fernanda Pedro
CONSIDERADA uma das maiores escolas de formação
profissional do país, a Marinha Portuguesa prepara-se para uma
reestruturação do seu sistema formativo. Esta renovação
pretende estreitar a relação entre o seu modelo e o sistema
educativo e de formação profissional nacional, bem como
implantar uma política formativa capaz de satisfazer as necessidades
da Marinha e valorizar os seus recursos humanos. Com este objectivo definido,
a Marinha Portuguesa caminha para a criação da Escola de
Tecnologias Navais (ETNA).
Uma escola que irá integrar num único estabelecimento
os departamentos de formação e escolas que constituem
os actuais Grupo nº 1 e Grupo nº 2 da Escola da Armada.
A ETNA funcionará na base naval do Alfeite como um grande pólo
tecnológico de formação profissional acreditada
no país.
Enquanto aquela não chega, a Marinha alterou a sua estrutura
orgânica a título experimental, passando a adoptar o modelo
departamental.
Assim, foram desactivadas algumas escolas e, em sua substituição,
foram criados os departamentos de operações, o departamento
de comunicações e sistemas de informação
e o gabinete de tecnologia educativa.
Além disso, também entraram em funcionamento os departamentos
de formação militar naval e de armas. Mantiveram-se as
escolas de marinharia, a de limitação de avarias e a de
tecnologias de educação e treino.
Na verdade, a renovação do sistema de formação
pretende, acima de tudo, "potenciar os recursos humanos da Marinha",
revela Ramos Gouveia, comandante do Grupo nº 2 de Escolas da Armada.
Além deste objectivo prioritário, o comandante Ramos Gouveia
refere que a instituição pretende caminhar para as parcerias
com o exterior, "porque é fundamental criar sinergias
entre a formação militar e a civil".
Não é por isso de estranhar que muitos dos cursos de formação
ministrados aqui sejam acreditados pelo Inofor. Para já são
três - Técnicas de Formação, Alistamento
de Electrotécnico e o básico de Segurança Contra
Incêndios -, mas o comandante pretende que em breve todos os cursos
sejam certificados.
Numa ronda pelos vários departamentos existentes no Grupo nº
2 das Escolas da Armada, instalado na base do Alfeite, a componente
formação respira-se em todos os recantos da escola.
Mantendo o rigor e a disciplina inerentes a uma carreira militar, as
aulas decorrem dentro do normal funcionamento de uma escola profissional,
com a vantagem de utilizarem os mais recentes e sofisticados equipamentos.
O comandante Ramos Gouveia reconhece que esse facto se deve à
longevidade da escola e à importância da sua missão:
"Não nos podemos esquecer que os nossos alunos têm
de estar preparados para desempenhar as suas funções logo
após o período de formação".
Na realidade, a preparação para o desempenho de funções
é a grande prioridade da Marinha, que faz questão em dar
aos alunos todas as ferramentas de que necessitam.
Um exemplo é o domínio da língua inglesa, um conhecimento
fundamental quando se navega, visto que as comunicações
com outros navios estrangeiros são realizados em inglês.
De acordo com o primeiro-tenente Mouzinho de Oliveira, responsável
por este departamento, a sua missão destina-se a satisfazer as
necessidades do ensino de língua inglesa, "nomeadamente
nos cargos, missões e cursos cujo exercício ou participação
exijam níveis específicos de proficiência nesta
língua".
O fascínio da electrónica
O departamento de armas e electrónica é o mais procurado
pelos jovens. Aqui compete executar os planos de curso aprovados nos
domínios da manutenção de sistemas de armas, sensores,
comunicações e equipamentos destinados a guerra no mar.
"Este curso é certificado e os sargentos adquirem qualificações
para procurar saídas profissionais mesmo no exterior",
explica o primeiro-tenente Duarte Palma, chefe deste departamento.
Neste curso, existem várias parcerias com instituições
de ensino superior, como, por exemplo, o Instituto Superior de Engenharia
de Lisboa.
A formação realizada neste departamento culmina com a
apresentação da Prova de Aptidão Profissional (PAP),
um requisito importante para o reconhecimento da certificação
profissional de nível III do Curso de Formação
de Sargentos Electrónicos.
Carla Fernandes e Carla Pedro são duas das três primeiras
mulheres na Marinha a obter a patente de sargentos-electrónicos.
Terminaram a PAP em Dezembro de 2003.
Explicaram a importância da formação nas suas carreiras,
mas não deixaram de realçar que só o futuro poderá
confirmá-la. "Quando estivermos a bordo de um navio a
desempenhar as nossas funções é que iremos consolidar
os nossos conhecimentos", refere Carla Fernandes.
Para lá de fornecerem as bases ao nível da formação
para uma carreira militar, os vários departamentos têm
também em funcionamento cursos de especialização.
O Grupo nº 2 da Armada ministra cerca de 206 cursos por ano, dos
quais 31 são de carreira e 175 de actualização
e aperfeiçoamento. Por ali passam cerca de 5600 alunos, que obtêm
taxas de aprovação na ordem dos 95%.
Para o futuro, além da Escola de Tecnologias Navais, a Marinha
Portuguesa irá apostar no "e-learning".
O comandante Ramos Gouveia revelou ainda que o Centro de Recrutamento
da Armada vai proceder, já no próximo mês, a uma
campanha de divulgação junto das escolas, "para
mostrar aos jovens o que a Marinha Portuguesa pode oferecer em termos
de futuro profissional".
A excelência no combate aos incêndios
MESMO com um extenso leque de cursos de formação da Marinha,
a Escola de Limitação de Avarias (ELA) destaca-se de todas
as outras. Isto, porque em Portugal só se faz formação
deste tipo de prevenções nesta escola.
Os sapadores bombeiros, o Instituto Superior Técnico e muito
outras entidades tal como a Galp, por não possuírem os
equipamentos necessários nem a certificação que
lhes dê competências para assegurar a formação
em áreas específicas de salvamento e sobrevivência
no mar e aos incêndios, procuram a ELA.
Todos os dias o parque de incêndios está ocupado, quer
por militares quer por civis. Na realidade, a ELA é a única
escola certificada a dar formação nestas áreas.
O conceito de limitação de avarias engloba a prevenção
e o combate a incêndios, a manutenção e o restabelecimento
da flutuabilidade e da estabilidade, o controlo e o combate a alagamentos
e a execução de escoramentos, a defesa nuclear, biológica
e química e o salvamento e a sobrevivência no mar.
Recentemente, a ELA alargou as suas acções de formação
às áreas da higiene e segurança no trabalho, protecção
ambiental e socorrismo elementar.
Aberta a formar civis, acaba por sofrer com a elevada procura por parte
do exterior. O capitão-tenente Dias Ferreira, director da instituição,
refere mesmo que a escola não consegue dar resposta a todos os
pedidos de formação que lhe chegam diariamente.
Mesmo com vontade de ajudar todos os que procuram a ELA, Dias Ferreira
alerta para o facto da Marinha não poder desviar-se da sua missão
militar. "Terá de ser o Estado a resolver essa situação
criando uma escola civil para dar este tipo de formação",
salienta.
Só em 2003 a ELA formou 4039 indivíduos, 2932 militares
e 1107 civis. Para o futuro, a Marinha pretende construir a vila d'ELA,
um espaço equipado como se de povoação se tratasse
para simular medidas de segurança.