Ruben Eiras
"Gestores devem focar no longo prazo"
OS GESTORES portugueses são eficazes a obter resultados no curto
prazo, mas falham redondamente na criação de negócios
sustentados num horizonte longínquo.
Para ajudar a mudar o rumo da elite empresarial do país, Márcia
Trigo, directora da Escola de Negócios da Universidade Autónoma
de Lisboa (UAL), abriu a oferta de formação avançada
a quadros e empresários que não possuam licenciatura,
mas detentores de um percurso profissional com provas dadas no mercado.
EXPRESSO - Os gestores portugueses são pouco profissionais?
MÁRCIA TRIGO - A resposta tem pelo menos dois registos.
Num, de curto prazo, focado nos processos e na eficiência, os
gestores portugueses são em geral considerados bons profissionais.
No longo prazo, medido sobretudo pelos resultados sustentados da empresa,
os gestores portugueses são considerados pouco profissionais.
EXP. - E quais são as suas maiores lacunas?
M.T. - No Índice da Competitividade, realizado pelo Institute
for Management Development, o desempenho dos gestores corresponde a
um dos piores da economia nacional, em especial nos critérios
de visão e orientação estratégica, orientação
para o cliente, "marketing" internacional, produtividade,
formação no interior da empresa e espírito empreendedor,
só para mencionar alguns.
EXP. - Que medidas deverão ser tomadas para inverter esta
situação?
M.T. - Há que melhorar a qualidade da formação
inicial e pós-graduada, designadamente as de "Formação
Executiva" e de "Executives MBA", leccionadas em "Business
schools" mistas.
É um modelo de ensino que combina o melhor da universidade e
do mundo empresarial, orientado pelo princípio da "realidade
e da acção" e muito menos comprometido com o "academismo"
de muitas das nossas universidades.
EXP. - Essa interligação entre a universidade e a empresa
é uma questão que já é recorrente do discurso
educativo e político. Mas a sua prática ainda vai no adro...
M.T. - Trata-se de dois sistemas com grande desconfiança
mútua, decorrente de histórias institucionais paralelas
e até mesmo opostas.
Por isso, neste domínio, as mudanças são difíceis,
lentas e muitas vezes não desejadas por muitos dos seus actores
e autores. Se fosse fácil, já estava feito e não
está.
Mas já começaram a dar-se os primeiros passos nas formações
pós-graduadas, nos MBA Executivos e nas formações
"in company training".
São acções formativas monitorizadas por escolas
de negócios, que negoceiam formações "à
medida" da empresa cliente, numa virtuosa interface universidade-empresa.
Também aqui seguimos tardiamente o que outros países,
incluindo a Espanha, já fazem há anos.
EXP. - Com efeito, assiste-se a uma explosão de escolas de
negócios no mercado universitário português. Qual
é a diferenciação da UAL neste nicho educativo?
M.T. - A partir de uma larga experiência de formação
pós-graduada - em especial a monitorizada pelo Instituto Sócrates
-, na "Business school" da UAL definimos, com os diversos
parceiros, uma "Carta de Qualidade e Responsabilidade Social",
a qual integra sete princípios orientadores da sua intervenção
neste mercado.
Destes, destacam-se a constituição de uma rede de parceiros
com relevância nas áreas de intervenção de
cada um dos Executive MBA e Pós-Graduações Executivas,
uma avaliação completa de cada curso e dos seus docentes
e a abertura dos cursos aos públicos não-tradicionais,
ou seja, pessoas com histórias profissionais relevantes, mesmo
ao nível do "top management", que não possuem
uma licenciatura mas pretendem aprofundar e reforçar as suas
competências empresariais, de gestão e de liderança.
Valorizamos e reconhecemos as qualificações e competências
não-formais, como é hoje corrente em universidades com
forte ligação à realidade empresarial e tecnológica.
Empreendedorismo desde pequenino
EXP. - Um dos vossos MBA é precisamente sobre "Business
and Entrepreneurship - Espírito Empreendedor". O empreendedorismo
pode ser ensinado? Não é uma característica que
é inata?
M.T. - O espírito empreendedor aprende-se e desenvolve-se.
Muitos investigadores, a partir de estudos empíricos, demonstram
que se aprende a ser empresário, a correr riscos, a inovar e
a ser empreendedor.
Mas este tipo de debate já atravessou há quase duas décadas
o próprio ensino da gestão, quando entre nós se
criaram as primeiras licenciaturas em gestão e os primeiros cursos
para quadros e empresários.
Nasce-se ou aprende-se a ser gestor, perguntava-se então? Peter
Drucker juntou-se à discussão, em 1986, com a edição
da sua obra Inovation and Entrepreneurship.
Nessa altura, era eu directora da AIP-COPRAI e, a partir desse livro
de Drucker, realizámos vários cursos dirigidos a jovens
candidatos a empreendedores. A maioria deles são hoje empresários
de sucesso ou gestores empreendedores.
EXP. - E basta agir apenas a nível do ensino avançado
no leccionamento do espírito empreendedor?
M.T. - Não. É crucial incutir este ensino desde
tenra idade. O "Índice de Empreendedorismo 2002", que
Portugal não integrou, revela que os países com maior
percentagem da sua população em actividade empreendedora
são os que mais investem na formação em empreendedorismo
desde a escola básica.
"Há que basear a formação executiva num
modelo misto, combinando universidade
e empresa"