Fernanda Pedro, Maribela Freitas e Ruben
Eiras
O ENSINO da ética profissional no jornalismo precisa
de ser reforçado para elevar a qualidade da profissão. Esta
é a conclusão retirada pelo EXPRESSO, a partir dos depoimentos
recolhidos junto de vários especialistas, sobre o estado da formação
de jornalistas em Portugal.
Com efeito, a opinião é unânime: tanto as universidades,
como o sistema de formação profissional dão uma
resposta insuficiente ao ensino dos valores no desempenho do jornalismo.
A pedra-de-toque para a plena tomada de consciência desta situação
deu-se com o recente roubo das cassetes com gravações
de conversas sobre o caso Casa Pia, efectuadas por Octávio Lopes,
jornalista do "Correio da Manhã". As gravações
foram realizadas sem conhecimento das fontes e o semanário "Independente"
publicou a transcrição das conversas sem ter autorização
de Octávio Lopes.
Perante isto, Francisco Rui Cádima, docente no departamento de
Ciências da Comunicação da Faculdade de Ciências
Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa e ex-presidente do
Observatório da Comunicação, sublinha que as matérias
de justiça são as mais sensíveis em relação
ao código moral da profissão. Porém, refere que
em todas as outras áreas "também não tem
havido uma grande preocupação ética no que se refere
ao tratamento da informação".
É por isso que o professor não dá relevância
ao assunto das cassetes roubadas. "Em toda a imprensa há
uma violação da ética e uma subversão da
lei, só que neste caso das cassetes, a questão da ética
foi o tema da notícia", explica o especialista, acrescentando
ainda que toda esta "telenovela" deve servir como uma lição:
"Além da velha questão do segredo de justiça,
todos aqueles que tiverem de falar com órgãos de comunicação
social devem salvaguardar-se o melhor possível".
Já para Alfredo Maia, presidente do Sindicato dos Jornalistas,
este caso levantou o véu a uma outra tendência: a destruição
do valor da camaradagem entre os jornalistas. "O que deveria
ser um valor inabalável e indiscutível está cada
vez mais vulnerável à competição",
salienta. "Mesmo que seja discutível a origem de determinado
material de um jornalista, nenhum camarada tem o direito de divulgar
o respectivo conteúdo e de contribuir para o seu descrédito
ou de concorrer para afectar a confiança nas relações
entre jornalistas e fontes de informação", defende
aquele responsável.
Os especialistas em comunicação contactados pelo EXPRESSO
asseguram que o sistema de educação e formação
português de jornalismo não está preparado para
lidar com a nova realidade dos "media", extremamente marcada
pela competição. Para Francisco Rui Cádima, o tema
sobre ética e deontologia profissional ministrado nos cursos
de jornalismo tem que ser reforçado. "O facto de, nos
cursos disponíveis, existir apenas uma cadeira nesta área
não resolve a situação", explica o docente.
Alfredo Maia, presidente do Sindicato dos Jornalistas, partilha da mesma
perspectiva: "Embora haja muitos cursos superiores, alguns apresentam
deficiências nas matérias relacionadas com o exercício
da profissão".
Nunes da Silva, responsável pelo departamento pedagógico
do Cenjor (Centro Protocolar de Formação Profissional
para Jornalistas), defende-se dizendo que nas questões de deontologia
e ética, "os cursos que ministramos têm um módulo
sobre esta matéria que serve para refrescar conhecimentos ou
veiculá-los pela primeira vez".
O mesmo responsável acrescenta que, "no ano passado,
no curso de Introdução ao Jornalismo para licenciados
fora destas áreas que queriam enveredar por esta actividade,
incidiu-se bastante sobre esta questão". Além
do módulo de ética e deontologia - que dura em média
12 horas, dependendo dos cursos -, existe um outro que respeita a fontes
de informação e pesquisa que está também
relacionado com as questões de deontologia e ética. Nunes
da Silva refere ainda que "na nossa escola a preocupação
com estas matérias é constante".
Para inverter o panorama, Francisco Rui Cádima defende que as
instituições superiores de ensino devem apostar em cursos
especializados neste tema, nomeadamente pós-graduações.
Outra medida defendida pelo mesmo docente é que todos os órgãos
de comunicação social deverão integrar directores
especialistas neste tema, de forma a salvaguardar a ética profissional.
ÉTICA NA WEB
Para que o leitor saiba mais sobre as questões da ética
e deontologia, pode consultar os seguintes sítios na Internet:
http://www.jornalistas.online.pt
- Aqui poderá ficar a par dos códigos deontológicos de vários países,
incluindo Portugal.
http://www.labcom.ubi.pt
- No laboratório de comunicação on-line encontra estudos sobre ética,
ensino e formação sobre esta área de actividade.
http://www.uta.fi/ethicnet
- Esta é uma base de dados sobre os códigos europeus de ética dos jornalistas.