Notícias

Empreender em tempo de crise

Em Portugal, são ainda poucos os que resolvem vencer o desemprego criando o seu próprio negócio, provando que o despesdimento pode ter um final feliz
25.08.2006


  PARTILHAR



Cátia Mateus EM JUNHO de 2006, eram 19.700 os jovens com idade inferior a 25 anos que procuravam trabalho há mais de dois anos, segundo dados do Instituto Nacional de Estatística. A mesma fonte revela que o desemprego de longa duração tem vindo a disparar entre os jovens, totalizando um crescimento na ordem dos 72% quando comparado com igual período do ano anterior. Mas mesmo face a esta conjuntura, são poucos os jovens que decidem transformar este momento de crise numa oportunidade através da criação do seu auto-emprego. A iniciativa empresarial ainda não é, para muitos, uma via a ponderar. As dificuldades continuam a não estimular o empreendedorismo e as excepções à regra teimam em ser poucas.


Mariana Mattos personaliza essa excepção. Aos 29 anos, a jovem «designer» de comunicação visual decidiu contrariar o desemprego criando o seu próprio negócio. A XS Design — uma empresa especializada em design de comunicação vocacionado para o público infantil — entra no mercado este mês, fruto de um investimento pessoal da empreendedora e da necessidade de vencer num mercado de trabalho cada vez mais inacessível.

Depois de ter sido forçada a deixar o seu emprego na sequência de cortes orçamentais, Mariana Mattos teve dificuldade em voltar a trabalhar na sua área. Face ao inevitável impunha-se uma atitude. Sem perfil para esperar, percebeu que para trabalhar naquilo que gosta teria de ser ela a criar o seu próprio emprego. Procurou no projecto FAME, organizado pelo Instituto para o Fomento e Desenvolvimento do Empreendedorismo em Portugal (IFDEP), o apoio formativo que necessitava para a criação da sua empresa e lançou-se no mundo empresarial.

Mariana Mattos é da opinião que «esta ideia de dependermos apenas de nós assusta um pouco». Mas esclarece que «a vida não é apenas um cheque certo ao fim do mês. Há mais realização que isso, há mais desafios e para os concretizar é necessário risco». Contudo, a jovem não nega que para quem está desempregado, arriscar o pouco dinheiro que se tem na criação de uma empresa é uma decisão difícil de tomar.

Mas se Mariana Mattos assumiu esse risco, a maioria dos desempregados não o faz. Teresa Sampaio, de 42 anos, ponderou a ideia de criar um negócio próprio quando ficou desempregada. Chegou a equacionar recorrer ao apoio do Instituto do Emprego e Formação Profissional e receber integralmente as prestações do subsídio de desemprego a que teria direito para criar a sua empresa, mas desistiu. «O risco era muito grande. Eu podia investir tudo e depois a empresa não dava certo e eu ficava ainda pior economicamente. Assim, o subsídio de desemprego permite que eu vá estruturando melhor o negócio que quero criar», argumenta. Teresa está desempregada há nove meses.

Para António Henriques, presidente do IFDEP, este receio de assumir o risco é algo comum e torna-se maior numa situação de desemprego. O especialista considera que «os portugueses não são muito adeptos de trocar o certo pelo incerto e são ainda poucos os que aproveitam um momento de crise (como é a situação de desemprego) para gerar novas oportunidades de trabalho para si ou para os outros».

Ainda assim, explica que a última edição do programa FAME, realizada no Porto, «reuniu um número interessante de jovens mulheres desempregadas com aspirações a criarem a sua própria empresa. Muitos desses projecto estão já em vias de concretização». Mas reconhece que a maior parte das pessoas não arrisca abandonar a segurança de um subsídio de desemprego para criar um negócio próprio.

A comprová-lo estão os números. Segundo dados do IEFP, em 2005, apenas 1608 desempregados beneficiaram do programa «Apoios a Projectos de Emprego promovidos por beneficiários de prestações de desemprego». Fátima Cerqueira, responsável pelo gabinete de comunicação do instituto, ressalva que «alguns dos projectos apoiados podem ter sido equiparados a Iniciativas Locais de Emprego já que além de criarem o seu posto de trabalho, os promotores geraram outros empregos». Segundo a responsável, «o Programa de Estímulo à Oferta de Emprego, integra um conjunto de modalidades de apoio a projectos de criação de emprego, por conta própria ou de outrem». Entre estas modalidades figura aquela que permite aos desempregados aceder, de uma só vez, à totalidade das prestações de subsídio a que têm direito e aplicá-las na criação da sua empresa.

Para que isto seja possível, Fátima Cerqueira explica que «os beneficiários têm de reunir um conjunto de requisitos legais e apresentarem ao IEFP um projecto que assegure o seu próprio emprego a tempo inteiro». Além deste apoio, o IEFP assegura ainda outros no domínio da formação, acompanhamento do projecto e consultoria. Ainda assim, estes apoios parecem não ser suficientes para levar os portugueses a assumirem o risco como uma oportunidade de valorização pessoal e profissional.

O desemprego não constitui ainda um desafio suficiente para empreender. Em 1990, o emprego por conta própria representava 26% do total de emprego da economia nacional. No ano passado, essa percentagem era de apenas 23%.





DEIXE O SEU COMENTÁRIO





ÚLTIMOS EMPREGOS