Um em cada três jovens portugueses estão desempregados. Portugal é, à luz das últimas estatísticas europeias, o terceiro país da zona Euro com a taxa de desemprego mais elevada. Em dezembro, as estatísticas nacionais já somavam 800 mil desempregados e 30,8 % eram jovens. O cenário assusta os portugueses e não deixa confortável o Governo que, para lá de quais quer polémicas em torno da emigração, assume como missão inverter rapidamente esta tendência. Um caminho que Alexandre Miguel Mestre, o secretário de Estado da Juventude e Desporto, reconhece difícil mas acredita que “já no próximo ano o país possa recuperar o caminho do crescimento económico, a partir de iniciativas concretas lançadas ainda em 2012”.
O secretário de Estado falou à margem da conferência Emprego Jovem, Perspetiva e Horizonte, promovida pela Secretaria de Estado da Juventude e Desporto e pelo Instituto Português do Desporto e Juventude, que reuniu esta semana no ISCTE-IUL jovens, decisores políticos, empresários, empreendedores e académicos em torno da reflexão e apresentação de propostas para a dinamização de políticas públicas de promoção do emprego e do empreendedorismo jovem. Matérias que, segundo refere, “são para o Governo essenciais e que importa debater”.
A Organização Internacional do Trabalho (OIT) diz que Portugal, ao contrário de outros países da União Europeia, já entrou na crise com uma taxa de desemprego jovem elevada e que o abrandamento da atividade económica vai ainda piorar a situação. Alexandre Miguel Mestre reconhece as dificuldades, mas afirma que “a realidade que hoje vivemos, a par de muitos países da UE, não pode inibir o caminho de incentivo à reflexão conjunta sobre políticas de emprego, de estímulo à inovação, à criatividade, ao empreendedorismo e à aposta no auto emprego para que se possa dar uma resposta, a médio prazo, aos problemas com que hoje os jovens se deparam”. Tanto mais que, afirma: “O Governo está empenhado no sucesso dos jovens portugueses no país” (ver entrevista).
Um sucesso que terá de passar pela criação de políticas de incentivo à empregabilidade, mas também pelo empreendedorismo. No primeiro patamar, o secretário de Estado do Emprego, Pedro Silva Martins, anunciou para este ano incentivos financeiros às empresas que formem ou contratem jovens, no âmbito de um projeto fomentado pela Comissão Europeia. À margem também desta conferência, Pedro Silva Martins reconheceu que “Portugal tem, infelizmente, uma situação particularmente séria no domínio do desemprego jovem e é muito importante desenvolver medidas ativas de emprego que procurem ultrapassar esta situação”. A proposta da Comissão Europeia prevê, segundo Silva Martins, “a mobilização de verbas dos fundos comunitários de modo a que os países tenham mais recursos para dar incentivos às empresas para formar e contratar desempregados, em particular jovens”.
O apoio ao empreendedorismo e ao auto emprego é outra das vias que para o Governo pode ajudar a solucionar a questão do desemprego. O executivo apresentou recentemente o Programa +E+ i que contempla várias medidas vocacionadas para o empreendedorismo jovem, e o Governo está convicto que esta aposta, associada a uma maior proximidade entre universidades e o tecido empresarial pode gerar interessantes oportunidades de trabalho qualificado para os mais jovens.
Carlos Oliveira, o secretário de Estado do Empreendedorismo, Competitividade e Inovação é, de resto, um defensor de que o conhecimento gerado nas universidades deve ser transformado em valor económico que promova o emprego e o crescimento do país. O secretário de Estado do Empreendedorismo, afirmou recentemente que “cada empreendedor é um potencial gerador de emprego”.
Uma via, mas não uma fuga
Uma afirmação que Francisco Maria Balsemão, presidente da Associação Nacional de Jovens Empresários há muito corrobora. Contudo, o líder dos jovens empresários defendeu na conferência que “o empreendedorismo é uma via, mas não pode ser apenas encarado como uma fuga. O empreendedorismo que defendemos é um empreendedorismo consciente e qualificado”.
Francisco Maria Balsemão reconhece que o código laboral nacional não ajuda, por muitos progressos que se tenham feito com o último acordo alcançado e realça a importância de uma maior flexibilização do trabalho, sem a qual mesmo que se criem empresas não haverá dinamização nas contratações. “Ninguém gosta de despedir e para um empresário, quanto mais colaboradores integrar nas suas empresas mais poderoso se sente e maior o seu status na comunidade empresarial. O que defendo como flexibilização é a possibilidade uma regeneração natural dos quadros de pessoal em que as empresas possam, por exemplo, anualmente renovar 10% dos seus quadros com novas contratações”. O líder da ANJE acrescenta que “a mortalidade e a transformação dos atuais modelos de negócio é tão grande que esta possibilidade iria não só gerar dinâmica económica, como dinamizar o mercado de trabalho”.
Mas ainda que o empreendedorismo seja uma via, Francisco Maria Balsemão reconhece que também neste campo a crise trouxe algumas transformações. “O que temos percebido na ANJE é que ao nível do investimento e da ambição dos projetos, os empreendedores estão mais contidos. Antes tínhamos projetos mais megalómanos e com elevado capital inicial, hoje há muita gente que empreende por sobrevivência. Há muitos negócios nascidos em MBA, com forte componente tecnológica, de investigação e aspirações de internacionalização, mas temos muitos pequenos negócios, tradicionais, de necessidade, mas com igual potencial e igualmente importantes porque não só são soluções de auto emprego, como são capazes de gerar novos postos de trabalho”.
E Luís Reto, o reitor do ISCTE-IUL é um grande apologista deste potencial do empreendedorismo. A instituição que lidera - e que acolheu a conferência Emprego Jovem, Perspetiva e Horizonte - é uma das instituições de ensino nacionais com maior taxa de empregabilidade, mas também aquela que de algum modo foi pioneira no hastear da bandeira do empreendedorismo nas escolas. “O ISCTE felizmente ainda não sofre o flagelo do desemprego e, em algumas áreas, os nossos jovens têm taxas de empregabilidade que rondam os 100%, mas desde cedo percebemos que o empreendedorismo tem de ser tratado como uma via de carreira”, defende o reitor.
Luís Reto reconhece a necessidade de olhar para a problemática do desemprego jovem de um modo muito prático e ponderado e defende que “é preciso encontrar formas de combate que passam por políticas de emprego, empreendedorismo e outras, mas também por mostrar aos jovens que ser empreendedor é uma hipótese viável de carreira que pode não só gerar o seu próprio emprego como empregar outros e esta mentalidade ainda nos falta”.
O reitor do ISCTE-IUL assume que há entre os seus estudantes um sentimento contraditório. “Há muitos jovens desanimados e com receio da entrada no mercado de trabalho, mas também há uma série de outros jovens decididos a contrariar a tendência. Têm surgido nesta universidade inúmeros projetos, claramente impulsionados pela vontade dos jovens em demonstrar que é possível fazer acontecer em Portugal”, explica.
Mas para Luís Reto, há na temática do empreendedorismo jovem outra questão vital: a emigração. O reitor orgulha-se de liderar uma instituição de ensino global, voltada para o mercado internacional, que recebe anualmente mais de mil estudantes estrangeiros e que faz o que está ao seu alcance para que os seus alunos tenham experiências de trabalho internacionais.
“Nós forçamos os alunos a ter uma experiência internacional. Organizamos cursos no estrangeiro para que saiam daqui com uma visão cosmopolita e global da carreira e achamos que conhecer o mundo abre horizontes profissionais”, defende reconhecendo que a maioria dos alunos do ISCTE aspira voluntariamente a uma carreira internacional e não olha para a emigração como uma forma de resolver o desemprego, mas sim como uma vontade. E vai ainda mais longe: “quanto mais portugueses tivermos lá fora em posições de destaque - e temos muitos e bons -maiores as possibilidades de networking para as empresas portuguesas que desejam internacionalizar e mais portas se abrem à dinamização da economia nacional e, consequentemente, à criação de emprego para os portugueses”. Os profissionais e os empreendedores portugueses na diáspora podem ajudar as empresas nacionais a internacionalizar enquanto facilitadores de contactos e, segundo Luís Reto há já muitos e bons exemplos desta prática. De acordo com dados da Cotec, que promove o “Prémio Empreendedorismo Inovador na Diáspora Portuguesa, os empreendedores portugueses no estrangeiro já faturam mais de 4,5 mil milhões de euros e o seu potencial para o país é imenso.
Para Luís Reto esta globalização profissional qualificada vai muito além da mera resolução de um problema de desemprego nacional. É uma questão de dinamização e crescimento económico, de reforço do papel de Portugal no mundo e do reconhecimento da qualidade da qualificação dos profissionais portugueses. Diz o reitor que a inversão da escalda do desemprego nacional que faz um número crescente de vítimas entre os jovens tem frentes distintas de combate, mas “a curto prazo e na minha ótica, o empreendedorismo é a medida que se revela mais eficaz e com resultados mais imediatos”.
“Sou contra a chamada ‘fuga de cérebros'”
Alexandre Miguel Mestre
Secretário de Estado da Juventude e Desporto
P: Portugal tem uma taxa de desemprego dramaticamente elevada, sobretudo entre os jovens. Que perspetivas é possível traçar a médio prazo para inverter esta realidade?
R: A realidade difícil que hoje vivemos, a par de muitos outros países da UE, não pode inibir um caminho de incentivo à reflexão conjunta sobre políticas de emprego, de estímulo à inovação, à criatividade, ao empreendedorismo e à aposta no auto emprego para que se possa dar resposta, a médio prazo, aos problemas com que hoje os jovens se deparam.
P: Falou recentemente nas oportunidades da emigração. Preocupa-o ver os seus jovens forçados a procurar emprego no estrangeiro?
R: O Governo está empenhado no sucesso dos jovens portugueses no nosso país. Quando um jovem português procura oportunidades laborais no estrangeiro, no contexto em que a economia portuguesa vive atualmente, numa conjuntura difícil, devemos entender esse comportamento como natural e, sobretudo, circunstancial
P: Mas acha que faz sentido dizer que estamos perante uma fuga de cérebros ou entende esta saída como natural e até benéfica para o crescimento profissional dos jovens portugueses?
R: Disse no primeiro Conselho Consultivo da Juventude a que presidi que sou contra a chamada ‘fuga de cérebros'. Em todo o caso, há que ter presente que os jovens emigrantes portugueses são extremamente bem preparados e que a experiência de viver noutras realidades geográficas e culturais só pode ser positiva, o que ainda é mais verdade quando dessa vivência se pode retirar o fortalecimento de competências profissionais, para além de pessoais. Acredito também que esta saída é temporária e acontece sempre numa perspetiva de regresso.
P: E que medidas considera fundamentais para potenciar esse regresso?
R: É importante que alguns paradigmas se alterem. Como já disse, é fundamental apostar em políticas de auto emprego, na inovação e no empreendedorismo aliados às melhores práticas mundiais para que qualquer cidadão seja capaz de, no seu país, desenvolver as suas competências de forma sustentável.
P: O que o preocupa mais no desemprego jovem: a emigração dos portugueses qualificados ou a clara sensação dos jovens de que o país não tem projetos para eles?
R: Não vale a pena exacerbar a questão. Devemos colocá-la nos justos termos em que deve ser colocada - no quadro geral do desemprego enquanto decorrência de uma crise económica global. A obrigação dos governos, deste Governo, é responder da melhor forma com esta contingência e é isso que está a ser feito. Todavia, é preciso lembrar, somos membros da União Europeia em que vigora o princípio da livre circulação de trabalhadores. Há profissionais qualificados que ficam e há profissionais qualificados que saem. Ainda recentemente assistimos à entrega de prémios na área da ciência e da investigação a jovens cientistas portugueses das nossas universidades. Como mencionei, o Governo está empenhado no sucesso dos jovens portugueses no país. Como tal, entende que a distinção do trabalho de outros tantos fora das nossas fronteiras deve ser um motivo de orgulho nacional e não um pretexto para criticar as políticas da juventude que, forçosamente, são multidisciplinares e visam a tendencial fixação em Portugal.