Cátia Mateus e Ruben
Eiras
CERCA de 20% da população activa portuguesa possui uma
deficiência física, o que coloca Portugal acima da média europeia (que
é de 16,4%). Desta faixa populacional, apenas 15,8% estão empregados —
os restantes estão desempregados (21%) ou inactivos (31%). Não obstante,
a inserção laboral dos portugueses com deficiência é mais significativa
em Portugal do que no panorama geral da UE (12,7%). Este é o retrato da
empregabilidade das pessoas com deficiência em Portugal, no ano de 2002,
elaborada pelo Eurostat.
Segundo aquele documento, os empregos desempenhados
por esta fatia da força laboral em muito dependem do grau e da natureza
da deficiência de cada pessoa. Todavia, a análise do Eurostat salienta
que as tecnologias de informação possibilitaram a entrada de muitas pessoas
com deficiência no mercado de trabalho, aumentando assim o seu grau de
autonomia e de auto-estima.
Contudo, este estrato da população activa está marcado pelo estigma
da marginalização. Conforme sublinham os analistas do Eurostat, em todos
os países da UE, a taxa de desemprego não é maior do que a de inactivos,
o que indica a existência do efeito «trabalhador desencorajado». «Provavelmente,
muitas pessoas com deficiência sabem ou acreditam que é quase impossível
arranjar um trabalho — então nem sequer tentam encontrar um e por isso
são consideradas inactivas», refere o estudo.
Sociedade com «atitude deficiente»
Mas, para Humberto Santos, presidente da Associação Portuguesa de Deficientes
(APD) o problema é mais vasto. O primeiro grande entrave que se coloca
aos cidadãos portadores de deficiência é, de facto, o estigma social
«visível na existência de um conjunto de dogmas sociais que
estão longe de corresponder à realidade e potencialidades dos portadores
de deficiência».
Os cidadãos nestas condições não são vistos pela sociedade como uma
mais-valia económica no mercado de emprego e antes como um problema.
Humberto Santos garante que a igualdade de oportunidades é uma miragem
na sociedade portuguesa, o que se verifica, desde logo, no acesso ao
ensino superior. De acordo com o presidente da APD «há cursos
e instituições de ensino que limitam o acesso a portadores de deficiência
como é o caso de alguns cursos de medicina e até história».
Uma realidade que diz ser um dos pilares das desigualdades no acesso
ao mercado de trabalho.
A solução deste problema passa pela criação de uma nova imagem do cidadão
portador de deficiência, posicionando-o aos olhos da sociedade como
um elemento de valor acrescentado em amplos domínios. Humberto Santos
frisa ainda que temos de abandonar visão de «emprego solidário». É que,
como refere, «em grande parte dos casos o emprego de um portador
de deficiência resulta de incentivos estatais e da boa vontade de um
empresário e raramente se fica a dever às suas competências e perfil
profissional como acontece com os trabalhadores ditos comuns».
As empresas portuguesas ainda têm complexos em recrutar para os seus
quadros portadores de deficiência e o presidente da APD desafia mesmo
a um exercício matemático: «Quantos portadores de deficiência
já entraram na administração pública ao abrigo da célebre 'cota de emprego'
criada em 2000?». E alerta para o facto de muitos concursos
não mencionarem sequer esta cláusula.