Ruben Eiras
AS PROFISSÕES qualificadas são as mais afectadas pela vaga
de desemprego que assola o mercado de trabalho português.
Entre o quarto trimestre de 2001 e o mesmo período
de 2002, os quadros superiores, os especialistas das profissões
intelectuais e científicas e os técnicos de nível
intermédio perderam, no conjunto, mais de 58.700 empregos, ou seja,
cerca de 53,4% do total de postos de trabalho destruídos num ano.
Os cálculos são de José Palma Rita, docente universitário
e técnico superior do Instituto de Emprego e Formação
Profissional, os quais efectuou com base em dados do INE.
De acordo com aquele especialista, esta tendência é resultado
do modelo de desenvolvimento nacional que não rentabiliza os investimentos
na educação e na formação de mão-de-obra.
"Isto leva a questionar a nossa capacidade para retirarmos benefícios
do potencial da imigração de Leste, dotada de altas qualificações",
observa.
Os sinais de alerta da fraca absorção de talento qualificado
por parte do mercado laboral português são lançados
por organismos internacionais. Em recentes documentos, a OCDE e a Comissão
Europeia têm vindo a apontar a degradação das qualificações
do trabalho em Portugal, expressa na diminuição dos empregos
altamente qualificados e no crescimento dos empregos pouco exigentes em
qualificações. Com efeito, o último relatório
da OCDE sobre a economia portuguesa realçou esta tendência.
Mas há mais. O desemprego dos jovens detentores de qualificações
elevadas tem aumentado de forma constante ao longo dos últimos
anos. Só entre os finais de 2001 e de 2002, os licenciados desempregados
passaram de 24 para 30 mil.
Por sua vez, o estudo "Qualificações requeridas e frequência
educacional em Portugal, 1985-1997", elaborado por Maria Clementina
Santos, docente na Faculdade de Economia do Porto, e Mendes de Oliveira,
professor no Instituto das Ciências do Trabalho e da Empresa - já
divulgado no EXPRESSO Emprego -, constatou que 50% da força de
trabalho nacional não desempenha funções de acordo
com a sua qualificação. Isto é, um em cada dois portugueses
está sobrequalificado face ao seu emprego.
E os recente fluxos migratórios de Leste ainda poderão vir
a agravar mais a situação. Com efeito, os dados do INE revelam
que a população activa aumentou de 5,31 milhões em
2001 para 5,38 milhões no final de 2002. Segundo José Palma
Rita, estes continuam a prometer uma trajectória ascendente, "apetrechando
os mercados de trabalho com mão-de-obra altamente qualificada".
Uma má notícia, porque, de acordo com aquele investigador,
se Portugal não adoptar um modelo de desenvolvimento assente em
actividades qualificadas e de alto valor acrescentado, o aumento do desemprego
entre os imigrantes pode vir a criar um problema social profundo, "de
dimensões e contornos ainda imprevisíveis".
Se este cenário se confirmar, José Palma Rita salienta que
o país irá perder uma oportunidade única de injectar
capital humano com um enorme potencial de produtividade, dotado de competências
tecnológicas e de capacidade de organização.