Cátia Mateus, Fernanda Pedro e
Ruben Eiras
A CRISE económica está a causar
mossas no sector do trabalho temporário, em particular no segmento
industrial. Segundo os especialistas contactados pelo EXPRESSO, o negócio
naquele nicho de mercado teve uma quebra estimada entre 20% a 30%. Em
contraste, os sintomas de desaceleração ainda são
pouco visíveis no sector terciário.
De acordo com João Lourenço, director da empresa de trabalho
temporário Atlanco, "os efeitos da crise já mostram
o seu impacto no sector do trabalho temporário". Para
aquele responsável, no caso específico da empresa que
dirige, "a crise não é ainda muito notória,
mas posso dizer que estamos a crescer menos do que no ano passado".
O sector que mais se tem ressentido com a actual conjuntura do país,
explica, "é o industrial, nomeadamente no ramo automóvel".
Um panorama que segundo João Lourenço não é
nada favorável às empresas de trabalho temporário,
já que segundo o responsável "cerca de 50% do
trabalho temporário estão ligados ao ramo industrial".
O sector do comércio e serviços é, até à
data, aquele que menos se tem ressentido com a crise.
Para João Lourenço, não há dúvidas
de que "a conjuntura que se vive desde o último trimestre
de 2002 irá continuar a limitar a actividade das empresas até,
pelo menos, meados do corrente ano".
Contudo, o responsável avança que "quando as empresas
se adaptarem à situação será um bom momento
para o trabalho temporário, já que antes de arriscarem
novas contratações vão apostar nos trabalhadores
temporários". Talvez por isso, a estratégia da
Atlanco para resistir à crise passe por não deixar de
investir na sua expansão geográfica em Portugal. É
que desta forma, diz João Lourenço, "quando a
retoma do mercado chegar, estaremos prontos para lhe dar resposta".
Especializar a diversificação
Apesar do crescimento gradual que o trabalho temporário registou
nos últimos anos no país, também para Mário
Costa, administrador-delegado do grupo Select/Vedior, "o mercado
global está neste momento a ser afectado, embora no caso da nossa
empresa a diversificação esteja aliada à especialização.
Este foi o factor que nos forneceu um crescimento acima do mercado".
Aquele responsável acredita que o trabalho temporário
é a melhor solução para garantir às empresas
o dimensionamento adequado às necessidades do mercado e da competitividade.
Por isso, Mário Costa não hesita em assumir o trabalho
temporário como uma ferramenta pragmática para assegurar
a necessária resposta, em termos de flexibilidade e adaptabilidade
dos recursos humanos, aos ciclos económicos e embates conjunturais.
Para este responsável, a melhor forma das empresas de trabalho
temporário enfrentarem a actual conjuntura é apostarem
na qualidade dos seus serviços, da sua equipa e da metodologia
aplicada.
Mas a dimensão da escala empresarial continua a ser um escudo
contra os maus ventos da economia. Para a Adecco, uma das maiores multinacionais
do sector, a actual conjuntura económica não está
a causar grande impacto na actividade.
Sentir a crise em "primeira mão"
Para Blas Olivier, director-geral daquela empresa, o trabalho temporário
"é uma área que está permanentemente em
situação de crise". Isto porque segundo este
responsável, "os trabalhadores com contrato de trabalho
temporário, dado o seu enquadramento legislativo, afiguram-se
como uma das franjas da força laboral que sente sempre, e em
primeira mão, as consequências de crises económicas".
Os sinais do desemprego não deixam de se fazer notar e Blas Olivier
avança que "o acréscimo significativo do número
de desempregados tem vindo a provocar um aumento das inscrições
nas diversas delegações que a Adecco possui de norte a
sul do país". Uma tendência de mercado que atenua
o impacto da desaceleração económica.
A Adecco foi uma das empresas que seguiu a estratégia da diversificação
especializada. "Apostamos fortemente em diversificar no 'outplacement',
formação e 'outsourcing'", revela.
Rui Quinhones, director-geral da Tutela, do grupo Egor, também
sente a crise no sector fabril, "onde a actividade desceu cerca
de 25%". As regiões mais penalizadas por esta inversão
do mercado são o centro do país e a cintura industrial
do Porto.
Todavia, o sector terciário está a atravessar este período
praticamente incólume, "pelo menos até agora",
ressalva aquele responsável. Com efeito, segundo Rui Quinhones,
a Tutela registou um crescimento em 2002 de 64%.
Mas a aterragem é quase inevitável neste ano. "Claro
que vai haver alguma contracção no mercado de trabalho
e só as pessoas com uma boa qualificação intermédia
é que se poderão adaptar a outras funções",
reitera. Para criar uma "almofada" contra a crise, Rui Quinhones
revela que a Tutela também apostou na diversificação
da actividade.
Todavia, para Blas Olivier, a actuação da Adecco em Portugal
não tem sido afectada pelas oscilações económicas,
mas sim pela ilegalidade que campeia no mercado. "São
necessárias acções inspectivas mais frequentes
às empresas de trabalho temporário que prevaricam e aplicar
penas severas".