João Barreiros
Através de um "software",
a Universidade de Aveiro diagnostica as lacunas de conhecimentos matemáticos
dos alunos que entram no 1.º ano
A UNIVERSIDADE de Aveiro vai aproveitar uma aplicação informática
desenvolvida pelo seu Departamento de Matemática para avaliar os
conhecimentos nesta disciplina dos novos alunos de ciências e de
engenharia.
O teste de diagnóstico, denominado TDmat, permitirá descobrir
quais são as maiores dificuldades dos jovens que este ano conseguiram
um lugar no ensino superior, corrigindo de imediato os problemas que trazem
consigo desde o secundário.
Os testes aos novos alunos serão realizados na próxima semana,
entre os dias 6 e 10 de Outubro, estando reservadas as primeiras aulas
de Cálculo 1 para "esclarecer e colmatar as dificuldades
diagnosticadas".
Um dos objectivos do TDmat é resolver a elevada taxa de reprovação
na disciplina de Cálculo, que causa um sério problema logístico
ao próprio departamento.
A insuficiente preparação que os alunos trazem do ensino
secundário parece estar na origem desta situação,
que obriga a universidade a destacar mais professores do que o normal
para leccionarem a disciplina.
Este ano estavam inscritos dois mil alunos, dos quais 45% vão ter
de repetir a cadeira. "E nem foi um dos anos piores",
sublinha o coordenador do Projecto Matemática Ensino ao EXPRESSO.
Impulsionador do teste de diagnóstico, António Batel Anjo
espera que a iniciativa possa ajudar a acabar com esta barreira, "dando
resposta às dificuldades dos alunos, nivelando conhecimentos, não
permanecendo de costas voltadas para o ensino secundário".
Avaliação qualitativa
Com uma experiência muito vasta na aplicação deste
tipo de testes nos ensinos básico e secundário, o responsável
pelo projecto adianta ainda que todas as questões do TDmat, realizadas
informaticamente, "avaliam aspectos muito precisos, de forma a
que possa ser feita uma avaliação qualitativa e não
quantitativa".
Ou seja, não importa à universidade avaliar quantas questões
foram respondidas de uma forma errada, mas sim detectar - de uma forma
mais global - em que áreas é que os alunos apresentam mais
dificuldades.
Apesar de reconhecer que a matemática é uma disciplina que
assusta muitos jovens, António Batel Anjo defende que a falta de
preparação dos alunos que agora chegam às universidades
é o resultado de diversos factores:
"O secundário está virado para a realização
de exercícios, para uma certa mecanização, quando
o que mais importa é que os alunos percebam as coisas. Por isso,
as notas com que chegam à universidade acabam podem não
reflectir o conhecimento deles".
Este ano entraram vinte e quatro alunos para o curso de Matemática
Aplicada da Universidade de Aveiro, metade dos quais escolheram a via
de ensino.
O coordenador do Projecto Matemática Ensino acha que a crise laboral
que afecta os professores é artificial e, por isso, entende que
os candidatos fizeram uma boa escolha:
"Em 2010 não teremos professores de matemática,
o que significa que iremos atravessar a crise pela qual a França
e outros países europeus estão a passar. Estamos a viver
um período muito conturbado, com um errado desinvestimento nos
cursos de ensino".
Mesmo hoje, na opinião deste docente, há lugar para muitos
mais professores de matemática. O secundário tem demasiados
alunos por turma e haveria grandes vantagens em desdobrar esses grupos
de alunos, exercendo-se um ensino mais próximo das necessidades
de cada um deles.
O ensino secundário está muito voltado para a 'mecanização'
do conhecimento e não para a sua compreensão
O Projecto Matemática Ensino, coordenado por António Batel
Anjo, pretende interagir com escolas de variados graus de ensino, integrando-se
numa das unidades de I&D do Departamento de Matemática.
Muito ligada às áreas científicas da informática
e da computação, esta iniciativa tem como objectivo criar
e aplicar instrumentos que permitam a avaliação e a aprendizagem
assistidas por computador.
Para além da aplicação do TDmat aos novos alunos,
o responsável por este projecto pretende alargá-lo, facilitando
a vida dos alunos que não possam frequentar a disciplina de Cálculo.
Através do computador, esses alunos irão trabalhando e monitorizando
a sua própria evolução, até ao momento em
que sintam estar prontos para realizar o exame.
Esta é outra das medidas tendentes à diminuição
do número de alunos acumulados naquela disciplina, que muitos finalistas
dos cursos de ciências e de engenharia têm em atraso praticamente
desde que entraram para a universidade.
Um défice crónico
Todos os estudos internacionais elaborados nos últimos anos mostram
que a maior parte dos alunos portugueses apresenta sérias dificuldades
na matemática.
O problema parece ser transversal, passando do básico ao secundário,
e com reflexos no ensino superior.
Há dois anos, as provas de aferição do 6º ano
de escolaridade revelaram que menos de 40% dos alunos conseguiam responder
de forma totalmente correcta aos problemas que lhes foram apresentados
(nas áreas da geometria, estatística e cálculo).
Os resultados foram na altura considerados compatíveis com os dados
existentes sobre o conhecimento dos alunos do 4º ano de escolaridade.
Este ano, a última escola da lista apresenta uma média de
2,5 valores, nos exames nacionais, verificando-se que há mais de
cinquenta escolas com uma média abaixo dos seis valores.
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