Cátia Mateus
Nas cidades de Lisboa e Porto encontra-se a maior percentagem de criação de novas empresas do país. De acordo com dados do Instituto Nacional de Estatística, referentes ao primeiro semestre do ano transacto, “no concelho de Lisboa foram constituídas 1738 novas sociedades. A seguir vem o concelho de Sintra com 557 e só depois o Porto com 535”. Os dados vão ao encontro dos do Registo Nacional de Pessoas Colectivas que apontam a capital do país e o Porto como as urbes que mais empresas criaram durante o ano de 2006 acrescentando, no entanto, à lista, o sul do país com a cidade de Faro. Contudo, o facto destas cidades serem líderes nacionais em matéria de criação de empresas está longe de significar que se encontrem também na dianteira em matéria de postura empreendedora. Os especialistas não têm dúvidas de que os melhores exemplos vêm de cidades secundárias.
Armindo Monteiro, presidente da Associação Nacional de Jovens Empresários (ANJE), acredita que “os grandes exemplos em matéria de empreendedorismo vêm de cidades com défice de atracção empresarial. Cidades que não gozam dos benefícios estratégicos dos grandes centros urbanos mas que já perceberam a importância do fomento à iniciativa enquanto motor de dinamismo e competitividade”.
Aveiro é para o líder dos jovens empresários “um excelente exemplo, combinando inovação com a materialização de boas iniciativas”. Armindo Monteiro esclarece que há outras cidades que têm vindo a destacar-se em matéria de empreendedorismo, mas não nega que “há muitas dificuldades a ultrapassar”. O presidente da ANJE argumenta que “estamos a assistir em vários níveis a uma desertificação e o empreendedorismo não escapa a este movimento. Há cada vez menos iniciativas empresariais nas zonas que repelem pessoas e mais grave é que parece não haver massa crítica para inverter esta tendência”.
Igual opinião tem Joaquim Rocha da Cunha, presidente da Associação PME Portugal. O especialista considera que Lisboa e Porto gozam do facto de serem os principais centros de negócios há muitos anos, mas confessa não considerar que “estas cidades tenham a atitude mais proactiva ou empreendedora”. E se Armindo Monteiro destaca Aveiro, Rocha da Cunha vai mais longe e aponta municípios e não cidades. O presidente da PME Portugal cita como exemplos de fomento ao empreendedorismo de Oeiras, que considera ter “resultados evidentes e visíveis”, Cascais, Póvoa de Lanhoso ou Valença argumentando que “há hoje uma nova geração de eleitos, com experiência empresarial e de gestão que têm outra visão da função autárquica e da necessidade de atrair investimento e de criar um ambiente pró-empresarial”.
Uma ideia partilhada pelo presidente da ANJE para quem “líderes empreendedores fazem cidades empreendedoras”. Armindo Monteiro enfatiza a ideia de que “os sistemas de apoio à criação de empresas são nacionais e, portanto, não há outra justificação, que não a liderança, para que existam cidades que acarinham os empreendedores e outras que não o fazem”. Detectar uma cidade empreendedora é tarefa fácil. São urbes ‘amigas' do investimento, com estratégias bem definidas para atrair novas empresas e conscientes de que a capacidade de criação de emprego, riqueza e sustentabilidade fazem uma cidade.
E, à luz deste princípio, Portugal tem ainda um longo caminho a percorrer. O país tem-se esforçado por subir no «ranking» do empreendedorismo europeu. Uma intenção facilitada por iniciativas como a Empresa na Hora, mas que necessita ainda de reforços ao nível do financiamento e de interiorizar a percepção de que o empreendedorismo à escala global não sobrevive divorciado da inovação.
Nesta matéria, as cidades portuguesas têm bons exemplos à escala mundial. Aqui ao lado, Madrid, aumentou o número de habitantes em 50% nos últimos três anos. “Um crescimento em muito sustentado pela sua capacidade de atrair e fixar uma rede empresarial forte e coesa”, explica Joaquim Rocha da Cunha. Mas o olhar de Armindo Monteiro vai mais longe e destaca Bangalore, na Índia, como um exemplo a conhecer e assimilar. O líder da ANJE refere o facto de Bangalore atrair os melhores investigadores e materializar nas empresas o resultado do seu trabalho. “Essa combinação está a fazer de Bangalore um exemplo de empreendedorismo em várias áreas”, reforça.
Esta componente de inovação tem, segundo os especialistas de ser transversal a todos os sectores de actividade de forma a criar um Portugal Empreendedor e internacionalmente competitivo. A meta é que a batalha deixe de se travar apenas ao nível das cidades empreendedoras para se passar a fazer à escala do país.
País empresarial
Serviços, comércio, construção e turismo foram em 2006 as grandes áreas de aposta dos novos empreendedores que Portugal conseguiu gerar. De acordo com os resultados do Observatório da Criação de Empresas do IAPMEI (Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas e ao Investimento), a economia portuguesa está cada vez mais terciarizada.
O inquérito revela também que os empreendedores portugueses são maioritariamente jovens, com menos de 35 anos e do sexo masculino, muito embora 40% das empresárias sejam mulheres. Um dado que reforça o crescimento sustentado que se tem verificado nos últimos anos no que toca à aposta das mulheres no mundo dos negócios.
Ao nível da formação, o panorama é pouco animador se analisado à escala europeia. Seja qual for a cidade, a grande maioria dos jovens empresários que surgiram no ano passado não detém uma formação superior ao ensino secundários. Apenas 22,6% são detentores de licenciatura.
O mercado local é o alvo da maioria das empresas criadas em Portugal que continuam a não encarar a competição à escala global como um desígnio a atingir. Sinal de que o país tem mesmo um longo caminho a percorrer.