Cátia Mateus
QUATRO meses depois de assumir a liderança da Associação
Nacional de Jovens Empresários (ANJE), Armindo Monteiro promete
já uma revolução na ala empresarial mais jovem do
país
Uma aposta clara na formação nas áreas da estratégia
e da internacionalização. Na mira do empresário
lisboeta está a criação da Escola de Negócios
ANJE e da Escola Europeia de Empreendedores.
Madrid conhecerá ainda este ano o espírito de iniciativa
"Made in Portugal" com a criação de uma incubadora
de empresas por aquela associação.
EXPRESSO - Como caracteriza o empreendedorismo em Portugal?
ARMINDO MONTEIRO - Entendo o empreendedorismo como um conceito
mais lato, o da "força" que contraria toda a inércia
de um país e onde os valores da ética e da consciência
social são sagrados.
Quando as notícias vão todas para a Casa Pia, escândalos
conexos à área social e fraudes, o empreendedor deve ter
um papel dinâmico e exemplar na sociedade.
No entanto, há uma parte do empreendedorismo que é, para
mim, negativa. Transparece a ideia de que ser empresário é
um mar de rosas e que esta é a forma mais fácil de enriquecer.
Mentira!
É urgente contrariar a ideia do empresário a quem "tudo
é devido", que só exige proveitos e não comporta
custos.
EXP. - Essa é a imagem dominante do empresário no nosso
país?
A.M. - Não diria a dominante, mas é uma ideia que
é preciso expurgar do tecido empresarial. Isto não é
empreendedorismo.
O empreendedor é aquele que sabe que uma actividade empresarial
tem proveitos, mas também custos para quem quer triunfar. Está
no ADN da ANJE mostrar que vale a pena ser empresário mas não
a todo o custo, fazer entender que esta é uma actividade que
carece de grande investimento pessoal.
A nossa meta é ajudar a enraizar a ideia de que empreender é
acima de tudo uma atitude própria de quem consegue sempre fazer
mais e melhor, de quem tenta diariamente superar-se a si próprio.
"Há que ensinar a distinguir estratégia de táctica"
EXP. - Falta-nos essa visão?
A.M. - Falta a Portugal uma classe que concretize. Ideias há
muitas mas é preciso conduzir os empreendedores rumo à
sua concretização. Queremos fazer um "upgrade"
ao conceito de empreendedorismo pela via da materialização
das ideias.
"O empreendedor português tende a dimensionar o seu negócio
em função de um só cliente"
EXP. - Mas essa sempre foi a bandeira da ANJE. Considera que isso
não tem sido feito?
A.M. - Ainda estamos no primeiro estádio: as ideias. Não
podemos ficar por aqui. Há que filtrar as boas ideias e passar
às boas práticas.
EXP. - O que é que realmente precisamos?
A.M. - Ousadia. Somos muito bons até à concepção
da ideia, mas a sua materialização exige ousadia e determinação
para fazer frente aos inúmeros entraves que encontramos.
EXP. - A que entraves se refere?
A.M. - A burocracia é sem dúvida o principal.
EXP. - Não considera que essa ideia do entrave burocrático
também serve de refúgio à falta de iniciativa imputada
aos portugueses?
A.M. - Não. A burocracia é de facto um calvário,
principalmente se pensarmos que na altura de criar um negócio
tudo é incerto. Depois há a excessiva carga tributária.
Os Pagamentos Especiais por Conta são um péssimo enquadramento
para quem cria uma empresa. Trata-se de uma filosofia de presunção
de rendimentos que não faz qualquer sentido para uma empresa
em início de actividade que ainda não começou a
facturar.
Há também o entrave da falta de capacidade financeira
e da ausência de posicionamento estratégico. O empreendedor
português tende a dimensionar o seu negócio em função
de um cliente ou de uma oportunidade. É arriscado. Se isto falha
o negócio cai por terra. Há muito caminho a percorrer
rumo à materialização das nossas ideias.
EXP. - Por onde começaria?
A.M. - Pelo sistema de ensino. As universidades portuguesas não
preparam empresários, preparam funcionários. Quando saí
do curso de gestão nunca ninguém me explicou que havia
outro caminho além de trabalhar por conta de outrem. É
necessário fazer chegar às universidades o conceito de
empreendedorismo.
EXP. - A ANJE tem algum projecto nesse sentido?
A.M. - A formação é a nossa grande prioridade.
Há muito que a ANJE percebeu a lacuna existente entre a universidade
e o conceito de empreendedor e temos vários projectos para estreitar
este relacionamento.
Em fase de aprovação está a criação
da Escola Europeia de Empreendedores - que formará e promoverá
o intercâmbio de potenciais empresários europeus tendo
como meta a internacionalização - e já este ano
vamos arrancar com a criação de uma escola de negócios.
Trata-se de uma estrutura que foge ao ensino académico concebido
em prol da certificação e que tem como meta fornecer aos
empresários um conhecimento que funcione como um valor acrescentado
e, numa fase mais avançada, ajudá-los na gestão
dos seus projectos.
EXP. - Em que moldes decorrerá essa formação?
A.M. - A formação incidirá no domínio
da estratégia. Hoje para definir uma política de internacionalização
é fundamental compreender como funciona o mundo, onde se posiciona
Portugal e como poderemos tirar partido da nossa situação.
Queremos ensinar os potenciais empresários a distinguirem estratégia
de táctica, sempre com uma vertente de internacionalização.
A crise que afecta o país só será ultrapassada
se formos mais exportadores e arriscarmos a nível internacional.
EXP. - Quer dizer que os nossos empresários são mais
nacionalistas?
A.M. - (risos) Um empresário de Valença do Minho
continua a achar que é mais natural vender em Faro do que na
Galiza. Se considerarmos a Península Ibérica como tabuleiro
de jogo, nós ficamos sempre na nossa metade do campo enquanto
os espanhóis atravessam o meio-campo, vêm à grande
área e fazem golo! Nós não passamos da nossa metade
e com esta postura não se ganham jogos.
EXP. - O que nos limita?
A.M. - Uma fronteira cultural. Ainda não interiorizámos
que a expansão internacional tem de começar pela nossa
fronteira natural que é a Península Ibérica. Não
é razoável para uma empresa que se queira internacionalizar
ignorar o mercado espanhol.
"A nossa expansão internacional tem de começar
pela fronteira natural: a Península Ibérica"
EXP. - É por isso que a ANJE vai "atravessar" a
fronteira e criar em Madrid uma incubadora de empresas?
A.M. - O projecto que estamos a desenvolver tem como grande meta
inverter a tendência de quem se internacionaliza "à
sorte", como quem compra uma cautela para ver se dá prémio.
O nosso objectivo com a incubadora de empresas que teremos a funcionar
até ao final do ano é ajudar os jovens empresários
a prepararem um programa de internacionalização sustentado.
Forneceremos o espaço (dimensionado para 12 empresas), toda a
informação legislativa e serviços de consultoria.
EXP. - A ideia é minimizar o fracasso dos nossos projectos
no país vizinho...
A.M. - Sim, é evitar que as nossas empresas façam
incursões fracassadas e desperdicem oportunidades. A nossa caminhada
para Espanha tem de ser assumida como um desígnio nacional e
já desafiamos o primeiro-ministro a apoiar-nos nesse sentido.
A exportação tem de ser vista como uma bandeira e há
muito trabalho a fazer nas nossas empresas rumo a este objectivo. Não
podemos ir para um mercado mais competitivo que o nosso sem estarmos
preparados sob pena de deitarmos por terra uma boa oportunidade. Portugal
tem de ir para ganhar!