Ruben Eiras
        
        AS EMPRESAS privadas de recursos humanos deveriam poder 
        aceder às bases de dados de desempregados dos sistemas públicos 
        de emprego (SPE) para os formar e inserir no mercado de trabalho.
      
      
    
    
      
      
    
  
  
  
  
     
       
        Quem o defende é Maria João Rodrigues, ex-ministra do emprego 
        e membro da recém-criada Task Force da Comissão Europeia 
        para o Emprego, em declarações ao EXPRESSO por ocasião 
        do 32º Congresso da Federação Internacional de Organizações 
        para a Formação e Desenvolvimento (IFTDO), que se realizou 
        nesta semana no Centro de Congressos de Lisboa, organizado pela Associação 
        Portuguesa de Gestores e Técnicos de Recursos Humanos (APG).
        
        "Por exemplo, se uma empresa de recrutamento ou de outro segmento 
        do sector de RH possuísse uma série de vagas por preencher, 
        não só poderia aceder à base de dados dos centros 
        de emprego, como também partilhar os seus recursos de formação", 
        explica aquela responsável. "Com este tipo de abertura 
        do SPE aos privados, as acções formativas tornar-se-iam 
        mais eficazes na resposta às necessidades do mercado de trabalho", 
        reforça.
        
        Ainda na via do aprofundamento das parcerias entre o sistema público 
        e as entidades privadas, Maria João Rodrigues advoga que se deveriam 
        criar sinergias para aproveitar ao máximo as áreas de investimento 
        com maior potencial de competitividade nas diversas regiões do 
        país. 
        
        Neste plano, os privados detectariam as oportunidades de negócio, 
        ao que as entidades públicas responderiam, adaptando a educação, 
        a formação e as acções de investigação 
        e desenvolvimento às necessidades de crescimento desses segmentos 
        empresariais.
        
        Esta estratégia, segundo aquela especialista, poderia ser aplicada 
        em Portugal, desde já, em três sectores de actividade em 
        que o país se poderá especializar, numa óptica de 
        valor acrescentado: o têxtil, o calçado e o turismo. "O 
        têxtil e o calçado têm que evoluir para a indústria 
        da moda - com a criação de novos tecidos e fibras - e o 
        turismo para a do lazer, com uma maior oferta cultural e valorização 
        do nosso património", sugere.
        
        Mas para que tal meta possa ser atingida, Maria João Rodrigues 
        reitera que esta estratégia deverá assentar num sistema 
        de gestão de conhecimento desenvolvido por empresas inovadoras. 
        "Ou Portugal percebe isto de uma vez por todas ou se atrasa ainda 
        mais", alerta.
        
        A docente do ISCTE passa a explicar os passos básicos que um empresário 
        inovador deverá seguir para aplicar uma gestão de conhecimento 
        competitiva. O primeiro elemento a ter em mente é que os produtos 
        a serem fabricados têm de ser "intensivos em conhecimento", 
        ou seja, possuir uma maior dose de tecnologia ou utilização 
        "intelectual" por parte do consumidor. 
        
        "Hoje já é possível comunicar com as máquinas 
        de lavar através do telemóvel. Este é um exemplo 
        de uma maior intensidade de conhecimento num produto que já conhecemos", 
        esclarece. 
        
        O segundo princípio é o "design" do produto, que 
        não implica somente a aplicação correcta de competências 
        artísticas, mas também de gestão e técnicas. 
        "Se a um produto bem desenhado e concebido não se juntar 
        um bom 'marketing' e técnicas de produção eficientes, 
        o sucesso está hipotecado logo à partida", sublinha.
        
        O terceiro factor é a gestão das pessoas. "São 
        as pessoas que produzem e desenvolvem o conhecimento. Por isso, é 
        inevitável o investimento na sua formação", 
        observa. Para que esta responda às necessidades da empresa, o gestor 
        tem de identificar qual o conhecimento relevante no produto e procurar 
        as soluções formativas e de recursos humanos mais adequadas. 
        "Este é o alicerce para suportar os processos de produção 
        e aplicação do conhecimento", reforça. 
        
        Portanto, o gestor poderá "beber" das experiências 
        das empresas concorrentes, recrutar quadros com as competências 
        que deseja inserir na empresa ou investir na formação interna 
        para desenvolver competências específicas necessárias 
        à sua competitividade baseada no conhecimento. "Mas esta 
        filosofia tem que ser aplicada a toda a empresa, para que os processos 
        mudem em toda a organização", salienta. 
        
        Quanto à situação da qualificação dos 
        portugueses, Maria João Rodrigues refere que continua a persistir 
        uma insuficiência de competência em todos os níveis 
        educacionais: básico, intermédio e superior. Todavia, frisa 
        que o país devia apostar com mais determinação na 
        educação de adultos. 
        
        "Não é possível atrair investimento qualificado 
        com o mínimo de qualificações", alerta, 
        ressalvando que é urgente colocar trabalhadores altamente qualificados 
        em sectores-chave da nossa especialização económica. 
        "Colocando qualificados junto de desqualificados cria-se um enquadramento 
        de alto nível nas organizações, que irá obrigar 
        ao seu desenvolvimento", afirma.
        
        Só que, face a esta necessidade, Maria João Rodrigues critica 
        o facto de Portugal ainda não valorizar, na prática e não 
        só nos discursos, a educação e formação 
        como factores da riqueza das nações. "O não 
        reconhecimento interno da educação deve-se à mesquinhez 
        e menoridade que ainda imperam nas nossas organizações. 
        Em vez de competirem para fazerem melhor do que o concorrente, tentam 
        destrui-lo ou desmontar o que fez de bom", lamenta. 
        
        Para inverter a situação, aquela responsável advoga 
        que o discurso político deve apoiar a excelência, "sem 
        medo de ferir as susceptibilidades dos que não são bons".