Os problemas do TT como entidade clínica
Os problemas de saúde associados
ao TT são de tal modo importantes que
merecem o estatuto de "quadro clínico" nas classificações oficiais de
doenças (ICD-10, DSM-IV e ICSD-97). Dado que a ICD (International Classification
of Diseases da OMS) e a DSM (Diagonostic and Statistical Manual, da Associação
Americana de Psiquiatria) classificam os problemas associados ao TT como
"distúrbio do sono e da vigília", remetemo-nos para a International Classification
of Sleep Disorders (ICSD), revisão de 1997.
A ICSD divide os distúrbios do sono em 4 grupos: as dissónias (perturbações
do sono propriamente dito), parassónias (acontecimentos sensorio-motores,
vegetativos ou cognitivos que ocorrem durante o sono "normal"), as perturbações
do sono associadas a doenças médicas e psiquiátricas e um quarto grupo
de distúrbios do sono propostos (para os quais há informação insuficiente
para merecer o estatuto de entidade diagnostica). O grupo das dissónias
subdivide-se e, três subgrupos: distúrbios do sono intrínsecos (as causas
estão no corpo), extrínsecos (as causas estão no ambiente) e distúrbios
do ritmo circadiano do sono.
No subgrupo dos distúrbios do ritmo circadiano do sono incluem-se o síndroma
do "jet lag" (mudança de fusos horários), o distúrbio de sono do trabalho
por turnos (DSTT)e mais 5 outros distúrbios. Na ICDS o TT , codificado
com o número 307.45-1, é definido como um conjunto de sintomas de insónia
ou sonolência excessiva que ocorrem associados a escalas horárias de trabalho.
A quantidade habitual de sono perdido é da ordem das 1 a 4 horas por episódio
de sono, o sono é avaliado como insuficiente, há redução da capacidade
de vigilância e as queixas persistem a despeito de manobras de optimização
do ambiente, mesmo ao fim de muitos anos de TT.
Num caso de DSTT em seguimento na Unidade I&D de Psicofisiologia e Neuropsicologia
do Laboratório de Psicologia da Universidade do Minho, o doente trabalha
há 36 anos em turnos rotativos semanais (numa fábrica do sector químico).
Apresenta gastralgias, dispepsia, refluxo gastro-esofágico, úlcera duodenal,
perturbações vasculares (estase nos membros inferiores), irritabilidade,
tristeza, desinteresse e incapacidade para dormir mais de 3 horas, mesmo
nas semanas em que trabalha em turnos diurnos.
Está medicado com antiácidos, ranitidina (300mg por dia), 20mg de vincamina
(vasodilatador cerebral) 3 vezes ao dia, 4 mg de estazolam (hipnótico
benzodiazepínico) ao deitar. Tem vindo a apresentar muitas licenças prolongadas
por doença. Apesar de toda a medicação, persistem as queixas, sobretudo
as do foro psiquiátrico: "depressão" e insónia grave. Na cama passa a
maior parte do tempo a virar-se para um lado e para o outro: Citando o
doente, "são muitos anos a virar frangos".
Fonte RHM (continua)