O Imperativo do Mercado Global de Emprego
(31-03-2006)
Maria Márcia Trigo
Directora da Business School da Universidade Autónoma de Lisboa
Morreu o emprego protegido e para toda a vida, igual ao dos nossos pais e irmãos mais velhos. O que se passa em França e Alemanha – países fundadores, com a Inglaterra, do Estado Social Protector – é disso um sinal, mas os jovens franceses, a quem prometeram um emprego ainda melhor em França (ou terá sido, junto da residência de cada um?) gritam « contra as mudanças da história », as quais não mais permitem a garantia de um emprego protegido da competição a todos os níveis, igual ao da geração anterior, a qual viveu num mundo com barreiras mil (que a maioria de nós criticava), onde isso foi não apenas pensado, mas realizado e exportado.
Podemos analisar e chorar o passado, mas importante é desenhar e criar o futuro (a isto chama-se resiliência), antes que o futuro nos mude à força e com força .
Participei recentemente, em Lisboa, na apresentação de um «douto» estudo sobre as tendências das qualificações e da gestão das pessoas. Tudo muito arrumado, certinho, encantatório, mas adormecedor das nossas competências de competição, antecipação, abertura ao novo, criatividade, empreendedorimo e resiliência ao diferente, ao incerto e ao diverso, porque global. Até ouvi de um profissional de gestão de pessoas que «isto do futuro é como o D. Sebastião, o qual pode vir ou não », o que considero um apelo indecoroso ao reforço dos nossos brandos costumes do « deixa andar e depois logo se verá », sobretudo quando a assistência era substancialmente constituída por jovens ou quadros em risco de desemprego, porque essa é a única certeza verdadeiramente certa.
O que o tal profissional de gestão de pessoas poderia dizer é que o volume de «trabalho/emprego» continua a crescer, mas globalmente: noutras regiões, países, continentes, sectores e noutros contextos, onde se falam outras línguas que não as europeias. E deveria acrescentar que o trabalho, ainda existente em Portugal, está em mutação profunda, crescendo rapidamente o emprego do conhecimento e o emprego dito atípico, isto é, diferente do que vigorou durante longo tempo: subcontratado, em «part time», por turnos, sem horário fixo, precário, com remuneração baseada em resultados mensuráveis e não com base em horas de trabalho , etc. E que as empresas empregadoras procuram cada vez mais pessoas com muita energia positiva, auto-motivadas, resilientes à adversidade, «problem solver people», criativas, pontuais e disponíveis para a mobilidade de emprego, empresa, país e continente.
O Mercado de Emprego é hoje crescentemente global. Basta reparar na e migração e na i migração de trabalhadores, tanto desqualificados como qualificados e altamente qualificados e na deslocalização das empresas, no todo ou em parte, e respectivos empregos/trabalho.
Redes de trabalhadores do conhecimento (mas também outros) estão hoje disponíveis neste mundo plano em que, de repente, duzentos mil talentos trocam os EUA por Bangalore, na Índia, ou, por Xangai, na China, ou ainda, Taiwan, México, Nova Zelândia, Islândia ou Singapura, como constata D. Heenam, autor de « Flight Human Capital».
Já nos anos 90, Jack Welch, então CEO da General Electric/GE, descrevia assim a sua visão para a década passada « uma organização sem limites, na qual tenham sido derrubadas todas as barreiras internas e externas ». Por isso, a GE criou um Centro de operações de serviços partilhados, na Índia, o qual assegura 450 processos de negócio às operações mundiais da GE. A Nokia instalou na China o seu principal Centro de I&D. A Wal Mart (a maior cadeia mundial de distribuição e líder de baixos preços) abriu dezenas de «supercentros», vendendo e abastecendo-se, na China de mais de 50 mil milhões de mercadorias.
As multinacionais de TI e de Electrónica deslocalizam parte da sua cadeia de valor para a Índia, onde concebem (e não apenas produzem) novos e inovadores produtos, a mais baixo preço e igual qualidade. A Cifial portuguesa passou a fornecer-se de válvulas, na China. A farmacêutica portuguesa Hovione possui fábricas na China, desde 1984, com trabalhadores de uma dezena de nacionalidades, e a partir das quais fornece a indústria farmacêutica dos EUA.
O emprego de proximidade é cada vez mais exigente e em menor número, mas, neste mundo plano há imensas oportunidades à espera dos mais audazes. Hoje, a Esperança escreve-se com outras tintas, outras cores, noutras línguas e com cheiros e sabores de outros lugares. Se os empregos voam, voemos com eles.