O ensino como travão da competitividade
(09-06-2006)
Armindo Monteiro
Presidente da Associação Nacional de Jovens Empresários
Numa altura em que nem o Mundial de Futebol consegue aplacar a ebulição com que em Portugal se vivem as questões do ensino, com o Ministério da Educação e os professores em encarniçada rota de colisão, talvez seja pertinente deslocar a discussão para outra vertente da mesma problemática: a importância da qualificação para a competitividade económica.
Segundo um relatório da OCDE, Portugal é dos países que menos investe na educação. O Estado português gasta, anualmente, 4900 euros por aluno que frequenta a escola entre o ensino básico e o superior (a Suíça lidera a lista com 6300 euros) e o sector educativo absorve apenas 12,6% do investimento público total, quando a média na OCDE é de 12,9% (no México o investimento chega a 23,9%).
Contudo, tem-se a sensação de que, por maior que fosse o investimento público na educação, o dinheiro esfumar-se-ia sempre pelas frinchas de um sistema de ensino burocrático, centralista, pré-formatado e onde ninguém – dos alunos aos professores, passando pelos pais, directores de escolas e ministério – parece ser responsabilizado pelo que quer que seja.
Não é por isso de estranhar que, entre os 30 países da OCDE, Portugal seja aquele onde a população com idades entre os 25 e os 34 anos tem menor frequência da escola – apenas uma média de oito anos! E mesmo quando conseguem manter-se no sistema educativo, os nossos jovens têm, muitas vezes, que enfrentar situações de desregramento e até de violência como as que o recente documentário da RTP expôs com eloquência.
Ora, as muitas deficiências do sistema de ensino estão, paulatinamente, a condenar a nossa competitividade económica à escala mundial. Só podemos dar o salto desenvolvimentista se o factor humano for significativamente qualificado, como muito bem lembrou, na edição em papel deste semanário, o antigo primeiro-ministro irlandês Garrett Fitzgerald.
Ao Expresso , o ex-governante e um dos autores do milagre económico do «tigre celta» revelou ter reduzido o défice orçamental irlandês cortando em tudo menos na educação. Garrett Fitzgerald salientou ainda que, apesar do ensino se ter tornado gratuito, mesmo o privado, os níveis de exigência mantiveram-se no «máximo». Acontece que exigência é, precisamente, aquilo que falta nas escolas portuguesas, onde os nossos pedagogos cultivaram com desvelo o mito da aprendizagem sem esforço e sem disciplina.
Neste contexto, e de um ponto de vista empresarial, verificamos que quem se abalança na criação e gestão de empresas necessita de ter qualificações que lhe permitam enfrentar os desafios decorrentes da transição de uma sociedade industrial para uma sociedade em rede e do conhecimento. Daí que na Estratégia de Lisboa seja recomendado aos Estados-membros da UE que reforcem a «educação e formação em empreendedorismo», enquanto o nosso afamado Plano Tecnológico se propõe fomentar o «empreendedorismo qualificado».
Importa reter este conceito de «empreendedorismo qualificado», pois ele consubstancia uma das principais lacunas da actividade empresarial em Portugal. Segundo dados de 2001, os promotores de negócios nascentes ou de negócios com menos de três anos e meio apresentam baixas qualificações. Só 21% dos empreendedores nacionais têm, no mínimo, frequência universitária, enquanto 36% possuem como habilitações literárias a escolaridade obrigatória e 30% o ensino secundário.
Do Estado depende, em boa parte, a expansão do «empreendedorismo qualificado», não apenas através de políticas macroeconómicas que favoreçam o investimento e o desenvolvimento empresarial, mas também da organização do sistema de educação. Relativamente a este último ponto, parece-me inegável que o actual modelo educativo pouco estimula a capacidade de iniciativa e não valoriza suficientemente a «cultura do risco».
Neste sentido, importa introduzir o empreendedorismo nos programas escolares dos vários graus de ensino, de forma a inculcar nas novas gerações os valores que enformam a sociedade em rede e do conhecimento.