A teoria nos Cursos de Comunicação
Autor: Alexandra Figueiredo
A dissociação entre a teoria e a prática é
uma realidade grave que afecta os alunos dos cursos de Comunicação
Social e Jornalismo.
Assim, existe um abismo imenso entre a teoria dos cursos e o mundo do
trabalho.
Os estágios, que deveriam ser uma ponte para o primeiro emprego,
acabam por se transformar numa questão espinhosa porque as entidades
empregadoras decidem fazer estágios sucessivos não remunerados.
Saiba tudo sobre a teoria que invade os cursos de Comunicação
Social.
A Explicação
do modelo teórico
A educação em Portugal é baseada
num modelo institucional e conservador.
Existe uma instrumentalização estrutural das instituições
que pode ser explicada sociologicamente. O problema é que esta
estrutura é tão rígida que determina a perpetuação
do passado mais do que a dinâmica tão necessária para
o futuro e evolução.
É claro que tudo isto leva a uma dualidade: Existe uma permanência
cultural estável e tranquila e, por outro lado, uma instabilidade
determinada pela necessidade do progresso tecnológico.
A tradição académica remonta
à Idade Média e, desde esse tempo, que as áreas teóricas
têm sido privilegiadas, mesmo com toda a sua predominância
especulativa e filosófica.
Parece que ainda hoje se discute "o sexo dos anjos" e o pior
é que na maior parte das vezes não se chega a conclusão
nenhuma. Claro que se das discussões nascer alguma luz, os benefícios
podem apaziguar os efeitos negativos da especulação teórica,
mas tem de haver mais que isto.
Neste momento não existe a aversão clerical,
da universidade medieval pelas ciências experimentais... mas parece
que a herança permaneceu até hoje.
Até mesmo o desenvolvimento tecnológico que a Revolução
Industrial impôs teve dificuldade em se implementar, apesar de toda
a importância económica que teve.
Por causa disto, algumas sociedades deram origem a uma universidade técnica
desligada da tradicional. Mas não foi a maioria.
A permanência da perspectiva teórica
e especulativa em detrimento do tecnicismo do sistema educativo, tem empenado
a evolução das estruturas curriculares e a adequação
às estruturas da sociedade, e tem mesmo condicionado a evolução
científica.
É caso para dizer que as redes de comunicação online
dominam o mundo mas a universidade parece, em muitos casos, preferir os
"museus".
É evidente a necessidade de um re-direccionamento dos cursos de
comunicação para diminuir o distanciamento da universidade
da realidade dos nossos dias.
Seria ideal se a visão predominantemente voltada para o passado
fosse reformulada e se abrisse a porta no sentido da evolução
tecnológica.
O Abismo entre a teoria e a prática
É caso para perguntar porquê que a universidade
não consegue criar jornalistas como cria médicos ou professores?
E porquê é que a prática do jornalismo só se
desenvolve nas redacções?
A resposta a estas perguntas reside no facto dos cursos de comunicação
e jornalismo serem demasiado teóricos.
Se é certo que nos últimos anos as universidades se muniram
de estúdios de rádio e televisão, também é
verdade que algumas os alugam a empresas ficando os alunos impossibilitados
de usufruir dessas estruturas.
Felizmente nem sempre é assim. Algumas universidades
conseguem implementar uma componente prática. No entanto, face
à realidade do nosso mercado de emprego, conclui-se que esta não
é suficiente.
Para lutar contra o entrave da falta de prática
aconselha-se que os estudantes sejam também trabalhadores, na própria
área é claro! Não há melhor maneira para desenvolver
competências e conhecimentos fulcrais senão ao longo da vida
académica. No final do curso, verá que a preparação
é muito maior.
A dissociação cognitiva entre teoria e prática tem
origem num comportamento passivo ou reactivo dos media e da sociedade.
O abismo entre o saber e o fazer é produto também de uma
falta de vontade política.
A forma de ensino é muito virada para a memorização.
Muitas vezes decora-se matérias que dali por alguns dias se esquecem
porque não foram realmente aprendidas.
É muito mais produtivo aprender menos coisas
mas com gosto, do que ser um papagaio e falar-se de matérias que
muitas vezes nem se entenderam de facto.
Claro que a falta de prática, não é infelizmente,
exclusiva dos cursos de Comunicação Social e Jornalismo,
o que deveria ser uma razão acrescida para mudar esta triste e
incomodativa realidade.
Além disto, cada vez mais existe a necessidade
de um alargamento de competências a cada profissão o que
exige a formação de indivíduos com maior capacidade
criativa e espírito crítico e inovador.
Existe a necessidade de acompanhar os novos valores
que se impõem à sociedade e não é com um ensino,
que voluntariamente ou não, cria papagaios, que se consegue alguma
coisa. As pessoas têm de saber pensar, decorar não interessa!
Há ainda que ter em atenção a formação
dos professores que deverá ser constante, isto porque, se assim
não for, estes vão sentir-se impotentes e inferiorizados
face a algumas situações relacionadas com as novas tecnologias
que os alunos tão bem dominam.
O real e o virtual: ponte entre a universidade
e o primeiro emprego
No congresso de jornalistas subordinado ao tema "Jornalismo
Real, Jornalismo virtual", a abordagem principal foram as novas tecnologias,
mas este tema prestou-se a outras interpretações e muitos
jornalistas decidiram falar sobre o abismo entre a teoria dos cursos e
a necessidade de prática para entrar no mundo do trabalho, mais
precisamente no 1º emprego. Assim, pode chamar-se ao real o mundo
do trabalho, e ao virtual o curso universitário.
Algumas citações retiradas do livro Documentos, Teses e
Conclusões 3º Congresso dos Jornalistas Portugueses vão
fundamentar esta afirmação:
"Ninguém duvida que os alunos de jornalismo
que saem das universidades portuguesas hoje em dia estão munidos
com ferramentas mais poderosas do que aqueles que se iniciaram na profissão
há anos, antes da existência de cursos específicos
de comunicação
No entanto a capacidade crítica
falta à grande maioria" (Nuno Rocha, Terceiro Congresso dos
Jornalistas Portugueses, pág. 64).
Nuno Rocha, o autor desta citação, é
jornalista há já trinta anos.
É inevitável pegar-se nas palavras deste jornalista para
estabelecer relações entre o curso e o estágio.
Segundo ele, a capacidade crítica falta à maioria dos alunos
por falta de contacto com a realidade do seu meio.
A universidade dota o aluno de ferramentas poderosas, quando fornece doses
maciças de cultura geral em diversas áreas do conhecimento,
contudo o aluno precisa de aprofundar a sua capacidade crítica
para saber fazer face às situações reais com as quais
se depara ao entrar no mundo do trabalho.
Uma redacção não é uma sala de aula, e por
muita vontade que haja da parte dos profissionais em ajudar, o recém
licenciado terá de resolver os seus problemas da melhor maneira
possível.
Na Universidade somos confrontados com falta de meios, faltam estúdios
de rádio e televisão pelas Universidades que proliferam
ao longo de todo o país.
Independentemente destes factores, os alunos têm sorte ou azar quando
confrontados com o seu primeiro estágio ou com o seu primeiro emprego.
Em alguns casos a adaptação é boa, e se a equipa
de profissionais do local de trabalho for receptiva e der apoio ao recém
licenciado, tudo correrá bem, mas se isso não acontecer
ser-lhe-á muito mais difícil conseguir ultrapassar as dificuldades
que traz com ele porque herdou do seu curso.
Nuno Rocha concretiza a ideia de que teoria e prática devem complementar-se
num curso superior, que deve realmente existir uma ponte entre o curso
e o estágio ou o primeiro emprego:
"Entendemos que o caminho para uma melhor informação
passa pela formação universitária, que fornece elementos,
como as noções de ética profissional, de direito
da comunicação, de ciência política e economia
e de tantas outras áreas da vida social, que de outra forma eram
impossíveis para o jornalista no dia a dia do seu trabalho conseguir
absorver.
Mas que estas noções sejam completadas com a prática
diária, para que os formandos adquiram experiência, desenlace
e capacidade de resolver as dificuldades na obtenção das
notícias." (Nuno Rocha, Ob Cit.)
Entenda-se assim, que a prática é um instrumento fundamental
na obtenção do sucesso profissional de um recém licenciado.
É um facto que se sentem lacunas quando se começa a trabalhar,
porque são muito poucas as cadeiras em que existe componente prática.
Apesar de tudo, denota-se utilidade nas noções teóricas
aprendidas no decorrer do percurso académico, mas para que a ponte
entre o mundo académico e o mundo do trabalho seja totalmente real
e funcional, há ainda um longo caminho a percorrer, que passa pela
reformulação dos cursos de Comunicação Social
e Jornalismo e também pela iniciativa de organização
de mais congressos, que tanta falta fazem para moverem a classe em busca
dos seus ideais mais nobres.
E na linha do mesmo propósito expõem-se alguns conselhos
de Nuno Rocha, em jeito conclusivo:
"Entendemos que uma melhor comunicação
passará obrigatoriamente por uma forte aposta na preparação
dos estudantes universitários, proporcionando-lhes os rudimentos
teóricos mas levando-os a raciocinar sem paixões e a praticar
e a desenvolver o faro jornalístico" (Nuno Rocha, Ob Cit.)
Veremos se os próximos licenciados em
comunicação social e jornalismo vão poder usufruir
de um currículo com a mesma riqueza de conteúdo mas mais
devoto e motivado ao exercício prático.