Paulino Teixeira, professor da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, chama-lhe o “quarto segredo de Fátima”, por ser “um segredo bem guardado”. Mas “é a pura realidade: em Portugal, a representação dos trabalhadores ao nível da empresa é a mais baixa da Europa Ocidental”.
Vamos a números: apenas 5% dos estabelecimentos empresariais em Portugal têm representação formal dos trabalhadores, através de associação sindical ou comissão de trabalhadores, conclui o estudo “Strikes, Employee Workplace Representation, Unionism, and Trust: Evidence from Cross-Country Data”, de que Paulino Teixeira é coautor.
A análise utiliza o “European Community Survey” — um inquérito às empresas a nível europeu — relativo a 2013 (últimos dados disponíveis). E a conclusão é perentória: Portugal tem o nível mais baixo de representação dos trabalhadores ao nível da empresa da União Europeia, além da Macedónia e da Turquia. Os 5% em Portugal comparam com 30% para o conjunto dos países analisados e com 70% na Dinamarca e na Finlândia.
A Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico (OCDE) já alertou para o problema. A OCDE quer descentralizar a negociação coletiva em Portugal, mas isso choca com a fraca representação dos trabalhadores nas empresas.
Por tipo de representação, em 2% dos estabelecimentos empresariais em Portugal há associação sindical (9% no conjunto dos países), em 3% há comissão de trabalhadores (14% no conjunto) e em 1% convivem ambos os tipos de representação (7% no conjunto).
Cultura de confronto
Esta realidade “é fruto de várias circunstâncias históricas”, considera Paulino Teixeira. “Há países com muitos anos de cultura de participação dos trabalhadores nas empresas”. É o caso da Dinamarca, Finlândia, Suécia, Luxemburgo ou França. Já em Portugal, “a cultura é mais de hostilidade e de confronto entre trabalho e capital, entre empregados e patrões”. Uma situação que “é fruto de décadas de ditadura, mas também da influência política sobre os sindicatos em Portugal”, considera o professor.
Sinal disso, Portugal estava, segundo dados de 2013, no grupo dos países europeus com maior incidência de greves. Um grupo liderado pela Itália, seguida por Espanha e Grécia, com Portugal na quarta posição. É certo que nessa altura a crise da dívida soberana assolava a Europa, com a adoção de medidas de austeridade duras nos países do Sul. Contudo, já em 2009, Portugal estava no grupo da frente deste ranking, conclui o estudo.
No outro extremo da tabela, ou seja, no grupo de países com menor incidência de greves em 2013, encontravam-se, por exemplo, a Suécia, o Luxemburgo e a Dinamarca, que têm dos níveis mais altos de representação dos trabalhadores ao nível das empresas.
Comissões de trabalhadores significam menos greves
Este estudo aponta outra conclusão: no conjunto dos países analisados (não há resultados por país), “quando as comissões de trabalhadores estão presentes e são prevalentes, a incidência de greves é menor do que no caso de representação por associação sindical”, salienta Paulino Teixeira.
Explicação? Paulino Teixeira destaca a “menor conflitualidade. As comissões de trabalhadores tendem a ser menos antagónicas em relação à gestão das empresas do que os sindicatos, porque têm outra perspetiva”. E aponta como exemplo a Autoeuropa. Na fábrica de Palmela do grupo Volkswagen, a comissão de trabalhadores é o veículo privilegiado de ligação entre trabalhadores e administração, “em linha com a tradição alemã”.
Sinal desta diferença, quando as comissões de trabalhadores são dominadas por elementos dos sindicatos (mais de 50% da sua composição), “o efeito de menor incidência de greves reduz-se”, nota o professor.
Por fim, nos países onde há maior dissonância no inquérito às empresas entre o que dizem o gestor e o representante dos trabalhadores sobre o ambiente de trabalho — bom ou mau —, como é o caso de Portugal, a incidência de greves é maior. “É um sinal de que algo não vai bem nos locais de trabalho”, remata Paulino Teixeira.