Fernanda Pedro e Ruben Eiras
A MAIORIA dos gestores das grandes empresas portuguesas
considera a acção dos sindicatos de "indiferente".
Esta é uma das conclusões de um estudo recente sobre as
práticas de gestão de recursos humanos e relações
laborais elaborado pelo Centro de Investigação e Estudos
em Sociologia do ISCTE. O inquérito foi dirigido a gestores e cobriu
mais de 250 empresas de grande dimensão em todas as áreas
de actividade, com excepção da educação, da
saúde, da acção social e da função
pública.
De acordo com os resultados daquele estudo, na totalidade das empresas
inquiridas, cerca de 31,8% dos gestores caracterizam o papel dos sindicatos
na empresa como indiferente e cerca de 30,6% classificam de "aceitável".
Mas mesmo nas empresas onde o grau de sindicalização é
mais elevado, cerca de 24% consideram indiferente a actividade dos sindicatos.
Onde pára a negociação colectiva?
Para João Proença, secretário-geral da UGT, este
resultado é um indicador do isolamento a que foi remetida a negociação
colectiva. "Este não é um obstáculo aos
empresários, mas também não traz valor acrescentado
à gestão da empresa e aos interesses dos trabalhadores",
comenta.
Isto porque, segundo aquele responsável, o processo de negociação
está limitado à fixação de aumentos salariais.
"Mas há que realçar que, no estudo, os sindicatos
não são vistos como agentes prejudiciais à actividade
empresarial - só 9% dos inquiridos os referem como tal. Isto
significa que muitas das acções sindicais são positivas
para a gestão da empresa", explica João Proença.
Afonso Diz, presidente da União de Sindicatos Independentes (USI),
não concorda com a principal conclusão do estudo, que
traça a acção dos sindicatos como "indiferente".
Para aquele dirigente sindical, o estudo prova que são as empresas
dos sectores mais competitivos que apresentam maior índice de
sindicalização. Ao contrário, o sector primário,
"o menos competitivo da economia nacional", é o
que apresenta a menor taxa de sindicalização: "onde
estão os sindicatos agrícolas?", indaga.
Segundo Afonso Diz, o argumento da alta competitividade das empresas
com maior taxa de sindicalização é também
corroborado naquela investigação. É que, quando
50,6% dos gestores avaliam as medidas pertinentes para a melhoria da
competitividade das empresas, colocam em segundo lugar, como imprescindível
e prioritário, a "maior implicação dos
trabalhadores nos resultados da empresa". E isso já
acontece na Banca, na PT, na EDP, ou seja, "os sectores mais
competitivos de Portugal e os que apresentam maior sindicalização",
afirma o dirigente.
Quanto ao recente crescimento da taxa de sindicalização
em 1,3% (ver edição 2 de Julho de 2004), Afonso Diz, considera
que este aumento tem ocorrido de uma forma sustentada e até tem
sido incrementado. "Nos sectores e empresas onde existem sindicatos
há progresso económico e social. Esta ideia é um
dos pilares fundamentais da Carta Social Europeia, a magna carta de
uma Europa competitiva e geradora de bem-estar social para os povos
que a constituem", salienta aquele responsável.
Socialismo e capital não são incompatíveis
De acordo com o sindicalista, já é quase um lugar comum
dizer que "o maior capital de uma empresa são os trabalhadores".
É por isso que considera que a formação ou educação
sindical, passa pela consciencialização dos trabalhadores
e a sua participação na vida das empresas. Nesta óptica,
o presidente da USI defende a desmistificação de duas
ideias feitas, "aliás muito marxistas", sublinha.
A primeira, é que "o sindicalismo e o capital são
incompatíveis ou até inimigos" e a segunda é
"confundir as noções de trabalho e emprego".
Para dirimir a indiferença face à negociação
colectiva, João Proença defende que se deverá caminhar
para um reforço da utilização da negociação
colectiva como um instrumento de conciliação de interesses
dos trabalhadores e da adaptabilidade exigida pelas empresas.
Como exemplos dá os casos do Grupo Millenium BCP e da AutoEuropa.
"Neste último caso, foi possível resolver o problema
de custos da empresa sem desemprego. O futuro da negociação
é, sem dúvida, a multiplicação deste tipo
de acordos de empresa", remata.
PERFIL DE SINDICALIZAÇÃO
- Sector não-sindical (empresas com uma taxa de sindicalização
de 5% ou menos): cerca de um terço das empresas contidas na amostra
- Mais de 19% das empresas relatam que não têm qualquer
sindicalização
- Sindicalização fraca (entre 6% e 20% de sindicalizados):
19% das empresas
- Sindicalização moderada (entre 21% e 45% de sindicalizados):
19,8% das empresas
- Sindicalização substantiva (taxa de sindicalizados acima
dos 46%): pouco mais de 22% das maiores empresas
Fonte: Práticas de gestão de recursos humanos e relações
laborais, CIES, ISCTE, 2004