Cátia Mateus e Maribela Freitas
OS PRINCIPAIS sectores exportadores do país têm vindo a perder recursos humanos e as perspectivas de criação de novos postos de trabalho, a médio prazo, são poucas. De acordo com dados do ICEP, referentes ao primeiro trimestre de 2005, a maioria das exportações portuguesas decorriam de cinco áreas específicas: automóveis, tractores e outros veículos; máquinas , aparelhos e materiais eléctricos; máquinas e aparelhos mecânicos; vestuário e acessórios de malha; e calçado. As associações empresariais e sectoriais não estão optimistas quanto às tendências de criação de emprego nestas áreas e defendem que o panorama futuro não será muito diferente do actual que, por si, não é animador.
Segundo Ludgero Marques, presidente da Associação Empresarial de Portugal (AEP), «estes sectores têm um peso significativo nas exportações portuguesas, sendo por isso vitais para qualquer estratégia de desenvolvimento sustentado». Contudo, o presidente da AEP esclarece que é difícil traçar uma perspectiva global da evolução do emprego nestas áreas. «Estas são áreas com dinâmicas distintas e, por isso, apresentam diferentes perspectivas de criação de emprego», esclarece.
Ao longo dos últimos anos, o país tem vindo a assistir a um aumento do peso da fileira metálica (incluindo máquinas, equipamentos e material de transporte) e, em contrapartida, a uma diminuição do peso do têxtil, vestuário e calçado. Uma tendência com impacto directo no emprego e que, para Ludgero Marques, «deverá prosseguir, e até mesmo intensificar-se, no futuro» (ver caixas). Esta tendência denota, segundo o dirigente da AEP, «o afastamento de uma especialização em sectores trabalho intensivos em direcção a sectores mais dinâmicos, com mais capital intensivo e com maiores produtividades».
Os sectores do vestuário e do calçado serão, nesta altura, os mais problemáticos, ainda que considere errado assumi-los como segmentos condenados. Para Ludgero Marques, o futuro passa por «fazer evoluir as empresas destes sectores através de estratégias empresariais que valorizem, por um lado, a inovação (ao nível dos processos mas também dos produtos) e, por outro, a função comercial, acrescentando valor ao longo da cadeia produtiva».
O presidente da AEP adianta que «só desta forma as empresas conseguirão reter uma enorme parcela de valor que presentemente é apropriada pelas empresas estrangeiras que adquirem a sua produção e preenchem funções de concepção de produto e comercialização, continuando as empresas nacionais a empregar a maior parte dos seus recursos humanos e físicos em actividades de baixo valor acrescentado».
Numa análise mais específica, Mário Costa, director-geral do grupo de recursos humanos Select/Vedior, explica que «o sector automóvel e o da electrónica são os que mais exportam e têm a mão-de-obra mais jovem, com qualificação específica e formação contínua». Acrescenta que, aqui, o emprego tenderá a manter-se desde que se assegurem condições como a formação e a inovação e seja possível a colocação do produto no mercado nacional e internacional.
Panorama distinto apresentam os sectores do vestuário e calçado. Mário Costa considera que «nesta área, a mão-de-obra não se renovou nem adquiriu formação». Uma conjuntura que o responsável diz agravar-se porque «estes sectores sofrem o impacto da concorrência de mercados com maior capacidade de inovação e custo inferior do factor trabalho, o que os leva a ter uma maior produtividade e competitividade».
Mais optimista, Rui Madaleno, director de economia da Associação Industrial Portuguesa (AIP), considera que «no horizonte de médio prazo, em qualquer destas áreas, haverá criação de empregos, embora com ritmos diferenciados de crescimento». Mas o director acrescenta que este crescimento esperado deverá traduzir-se numa maior exigência do mercado quanto ao perfil dos seus colaboradores. «As empresas tenderão a ser mais exigentes em termos de qualificações», explica.
Para tornar estas áreas cada vez mais produtivas, Rui Madaleno defende «um melhor enquadramento para a actividade económica em vários domínios, de forma a melhorar a atractividade de Portugal para o investimento e assunção de riscos». Depois, esclarece que é importante tomar medidas que promovam o redimensionamento empresarial, a inovação, o «marketing» e o desenvolvimento de novos produtos e processos.
Calçado
ACTUALMENTE, e segundo a Associação Portuguesa dos Industriais de Calçado, Componentes, Artigos em Pele e seus Sucedâneos (APICCAPS), este sector empregava no ano passado 43.850 trabalhadores. Aqui predominam os profissionais semiqualificados, representando 52% do universo, e qualificados, num total de 28%.
Fortunato Frederico, presidente desta associação, avança que, «no futuro, a tendência de emprego no sector é para estabilizar, ainda que com uma ‘nuance' diferente». O líder da APICCAPS acredita que o futuro passa por «deixar de estar concentrado na produção para passar a dominar a cadeia no seu conjunto, privilegiando a criação, distribuição e comercialização». Assim, apostas como a formação em áreas como estilismo, «design», «marketing» e comércio serão determinantes para a especialização do sector.
Máquinas
NA ÁREA das máquinas, aparelhos e materiais eléctricos, o panorama não é animador em matéria de emprego. As duas associações que abarcam estes sectores contactadas pelo EXPRESSO — Associação Portuguesa das Empresas do Sector Eléctrico e Electrónico (ANIMEE) e a Associação Nacional das Empresas Metalúrgicas e Electromecânicas (ANEMM) — apontam para um panorama futuro em que a diminuição do número de postos de trabalho é a regra. Segundo a ANEMM, são os trabalhadores com mais idade e menor grau de formação os que mais sofrerão com a diminuição dos postos de trabalho.
Automóveis
O SECTOR automóvel é responsável por cerca de 95 mil postos de trabalho no país — o equivalente a cerca de 1,8% do total de emprego nacional, representando 21% do total das receitas fiscais do Estado, segundo dados avançados pela Associação do Comércio Automóvel de Portugal (ACAP). Na opinião de Hélder Pedro, presidente da ACAP, «a indústria automóvel enfrenta a nível mundial uma forte contracção e existe mesmo uma grande concorrência entre as diversas fábricas do mesmo construtor».
Portugal não escapa a esta conjuntura e para o presidente da associação «a indústria nacional tem de saber posicionar-se tendo em conta estas situações». Entre 2000 e 2001, o sector sofreu uma redução de 7% do número de trabalhadores tendo a partir dai estabilizado a sua situação. Hélder Pedro esclarece que «embora não se possa falar, no segmento do fabrico e montagem de veículos, de uma situação de desemprego, as empresas continuam empenhadas em encontrar conjuntamente com os trabalhadores, mecanismos de laboração que impeçam a redução de pessoal».
Para garantir a competitividade do sector em Portugal, Hélder Pedro aponta a formação profissional, o reforço da vertente tecnológica no ensino oficial e a criação de cursos de licenciatura e pós-graduação ligados ao ramo automóvel como factores determinantes.
Vestuário
O SECTOR têxtil e vestuário enfrenta um momento particularmente difícil no país. Paulo Nunes de Almeida, presidente da Associação Têxtil de Portugal (ATP), esclarece que estas dificuldades «se estendem às demais actividades industriais, particularmente as dependentes de mão-de-obra intensiva».
Com as alterações provocadas pela mudança de modelo económico que o país está a sofrer e o aumento da concorrência internacional (em particular com as exportações das economias emergentes, imbatíveis em termos de preço), os níveis de emprego têm sofrido impactos imediatos e negativos.
Diz Paulo Nunes de Almeida que «o desemprego é obviamente uma ameaça, tendo em conta que este sector está inserido em regiões — litoral norte — onde aparece particularmente concentrado geograficamente e onde não existem outras alternativas de emprego».
Desde 1990 que o sector têxtil e de vestuário enfrenta uma tendência de perda de postos de trabalho, a uma média de 5000 empregos por ano. Esta quebra não afectou, segundo o presidente da ATP, a produção e a exportação, que cresceram sempre até 2003, reflectindo ganhos de produtividade.
Gerir o emprego nesta área — que abarca cerca de 200 mil efectivos — vai implicar uma aposta na qualificação e na polivalência. «A concorrência internacional vai forçar a uma maior competitividade, que só será possível com mais produtividade e qualidade nos produtos/serviços prestados, para fidelizar os clientes».