Fernanda Pedro / Maribela Freitas / Ruben
Eiras
A SEIS meses do pontapé-de-saída para o
Euro-2004, considerado o "campeonato turístico" do ano
para promover a imagem do país a nível internacional, as
entidades públicas e privadas não apostaram no aumento das
competências turísticas da população activa
portuguesa.
Isto apesar do número de turistas esperados ser elevado e dos
serviços comerciais, da hotelaria, da restauração
e dos transportes serem a "montra" do país.
Com efeito, as acções de formação com vista
à preparação para o Euro-2004 - como a promovida
pela Câmara Municipal do Porto dirigida a cerca 70 taxistas -
vêm tarde e a abrangência é muito limitada. Portugal
mais uma vez esqueceu a qualificação do seu tecido humano.
Atílio Forte, presidente da Confederação do Turismo
Português (CTP), refere que a formação profissional
é "a questão mais adiada do sector".
Mas já existem alguns sinais de mudança, pelo menos no
discurso dos dirigentes associativos. No entanto, as iniciativas de
formação que existem pautam-se pela escassez e irregularidade.
Por exemplo, Sousa Martins, presidente executivo da Associação
dos Industriais de Hotelaria, Restaurantes e Similares do Centro (AIHRSC),
reconhece que muitos portugueses estão descontentes quanto à
forma como são servidos em Portugal pelos profissionais da hotelaria
e restauração.
No entanto, aquele responsável refere que essa imagem tenderá
a desaparecer porque já "existe uma preocupação
do sector em aumentar a qualidade do desempenho dos profissionais da
restauração". Neste plano, Sousa Martins sublinha
que a dignificação das profissões do turismo e
da restauração passa por uma forte aposta na formação.
No que respeita ao comércio, a União das Associações
de Comércio e Serviços tem um plano anual permanente de
formação para empregados e empresários do comércio.
"Os conhecimentos básicos em inglês e o atendimento
e venda na loja são duas das áreas formativas que privilegiamos",
explica Soares Neto, da direcção desta organização.
Por norma estes cursos são ministrados somente duas vezes por
ano, mas com a proximidade do Euro-2004 e com a afluência prevista
de turistas, esta unidade associativa vai intensificar a oferta destes
blocos formativos. Mas não há números definidos.
Quanto aos taxistas, de acordo com Carlos Ramos, presidente da Federação
Portuguesa do Táxi (FPT), "a formação dada
para a obtenção ou revalidação da carteira
profissional de taxista engloba módulos de língua inglesa
e de relações interpessoais - esta última ocupa
grande parte do espaço formativo -, o que tem vindo a melhorar
o serviço prestado pelos taxistas, bem como a sua imagem".
Mesmo assim, parece que ainda há muito a fazer nesta área.
"A forma como se aborda o cliente é fundamental para
cativar mais utentes e a renovação da classe é
imprescindível para a mudança de mentalidades neste sector",
salienta.
A Associação de Técnicos de Turismo (ATT) tem apostado
nas acções de formação na área do
atendimento. "A qualidade no acolhimento é fundamental
e isso implica que os profissionais tenham uma aprendizagem na linguística
técnica, na expressão corporal ou na posição
de voz", explica Paulo Carrança, presidente daquela
organização. A próxima frente de formação
desta associação é a das novas tecnologias.
Não obstante estas iniciativas, o facto é que impera a
descoordenação e a falta de uma estratégia formativa
para um sector que emprega 10% da população activa portuguesa.
Uma das razões deste estado de anarquia letárgica é
que, segundo Atílio Forte, "nunca foi feito um trabalho
aprofundado sobre as necessidades de qualificações para
tornar esta actividade competitiva, nem para os jovens, nem para actualizar
as competências dos activos".
Para colmatar esta lacuna, aquele dirigente revela que dentro de três
meses serão divulgados os primeiros resultados de um estudo prospectivo
e estratégico sobre as necessidades do turismo em Portugal, que
envolve vários organismos estatais ligados à formação,
ao turismo, a própria CTP e as duas centrais sindicais, a UGT
e a CGTP.
E para que o estudo não fique na gaveta, Filipe Ferrão,
docente especializado em gestão do turismo no Instituto de Novas
Profissões, defende que é crucial que as entidades públicas
e privadas ligadas ao sector turístico avancem com acções
de marketing social sobre a importância económica desta
actividade para o desenvolvimento do país.
"É que, se as pessoas não estiverem cientes de
que o turismo profissionalizado é essencial para o seu sucesso
económico, as acções formativas perdem toda a sua
eficácia", remata aquele especialista.
Ensino mais prático
PARA a formação dos empresários turísticos,
Filipe Ferrão considera que as escolas superiores, de hotelaria
e os politécnicos devem concentrar esforços na oferta
de formação avançada - uma modalidade que fornece
um nível de conhecimentos de gestão elevado, sem que seja
necessário possuir um grau de educação superior
para a sua frequência.
"Só que estes cursos têm que ter conteúdos
muito mais pragmáticos e fornecer ferramentas de gestão
que os formandos possam utilizar no seu quotidiano. Têm que ser
concebidos para que empresários com pouca literacia consigam
apreender facilmente este tipo de conhecimentos", sugere.
Atílio Forte também defende uma revisão dos currículos
académicos e do ensino secundário, no sentido da inclusão
de competências transversais e de vias profissionalizantes que
facilitem a entrada dos jovens no mercado de trabalho turístico,
reforçando, por exemplo, o ensino das línguas com um módulo
sobre a actividade turística.