Ruben Eiras
PARA que os gestores se libertem do enfoque total no curto
prazo, é crucial que contratem pessoas novas para executarem as
tarefas operacionais. "Só assim é que se poderão
dedicar à estratégia e ao desenvolvimento da sua própria
formação", defende José Ramalho Fontes, director
da AESE, uma das escolas de negócios que formam as elites de gestão
portuguesas.
EXPRESSO - Para onde vai a gestão em Portugal?
JOSÉ RAMALHO FONTES - Estamos no caminho de profissionalizar
a gestão como uma função que utiliza recursos -
materiais e imateriais - para atingir objectivos. A nível do
ensino, estamos muito influenciados pela escola norte-americana, onde
a maioria dos nossos gestores se forma. No que toca à formação
pós-graduada, é um processo que precisa de ser sistematizado
- só agora é que começaram a aparecer os primeiros
doutoramentos em gestão. Mas há um grande progresso no
ensino da matéria face a anos anteriores.
EXP. - Há um estilo de gestão português?
J.R.F. - A gestão é uma arte e por isso há
um estilo de dirigir português. A destacar pela positiva, os nossos
gestores possuem uma grande facilidade de "desenrasque", de
flexibilidade nos momentos críticos. Mas, pela negativa, há
uma grande tendência para a indisciplina. Numa conversa que tive
com José Marques Gonçalves, director da Opel em Portugal,
ele referiu que um alemão demora um dia para compreender a mudança
num processo de trabalho, mas depois nunca mais a desaprende. Por sua
vez, os portugueses aprendem-na em 10 minutos, mas uma semana depois
já a desaprenderam. Compete às escolas de negócios
dar competências aos gestores portugueses para ultrapassar esta
barreira.
EXP. - Na AESE, o método de ensino assenta no estudo de caso.
Quais as suas vantagens?
J.R.F. - Nas escolas tradicionais em Portugal o método de
ensino é dedutivo - parte-se da generalização para
os casos. Aqui, o método é indutivo - parte-se dos casos
para a generalização. Da prática para a teoria.
O método de caso não é para incentivar as pessoas
a estudarem ou para apresentar exemplos de teorias. Este método
proporciona a constituição de uma plataforma de aprendizagem
e só deve ser utilizado com alunos que tenham experiência
profissional de gestão e direcção já consolidada.
Apoiamo-nos nas experiências e no conhecimento de cada um dos
formandos, na sua prática de gestão, de modo a que o ensino
seja o mais personalizado e individualizado possível. Cada pessoa
aplica os seus conhecimentos adquiridos na discussão dos casos.
Desta forma, cada formando valida o que tem de positivo, descobre o
que tem de negativo e o que precisa de saber em termos de novas ferramentas
a adquirir, segundo as circunstâncias específicas de cada
um. Isto em Portugal é único - não há nenhuma
outra escola no país que faça isto.
EXP. - Este método facilita a ligação da universidade
com a empresa?
J.R.F. - O método não é a principal ligação
entre a universidade e a
empresa, mas é-o em parte. Isto dá-se quando a escola
encontra casos mais apelativos e actuais, e se aproxima das empresas
para os escrever. Neste momento, estamos a redigir os casos da Mglass,
do MBnet, da Galp, do cartão Vivo, da Fundação
Portuguesa de Cardiologia e do Millennium BCP. No limite, é um
levantamento sistematizado das boas práticas de gestão
realizadas por organizações portuguesas.
EXP. - Porque é que os gestores portugueses não investem
mais na sua formação e ainda a encaram como um custo?
J.R.F. - Essa pergunta tem duas respostas: uma a sul e outra
a norte do país. No sul, existe uma procura de formação
em gestão, bastante sólida, incentivada pelas grandes
empresas e pelas multinacionais. O objectivo é assegurar uma
boa carreira e atingir novos patamares de exigência. Mas a norte,
isso não acontece, porque os dirigentes empresariais estão
absorvidos por tarefas mais operacionais, que os impedem de dedicar
tempo a coisas importantes, como a estratégia e a sua formação.
EXP. - Não têm tempo para pensar, nem para se formar...
J.R.F. - Pois, o que é um erro fatal. O Filipe Vila Nova,
director da Salsa, disse uma coisa surpreendente num colóquio
recente: "Eu, em 2003 não cresci, parei para pensar e foi
o ano em que tive mais rentabilidade".
EXP. - Então qual é a solução para os
gestores ganharem tempo para pensar?
J.R.F. - Têm de contratar mais pessoas, para se libertarem
das tarefas urgentes (o curto prazo) e se concentrarem nas importantes
(o longo prazo). A comunicação social tem de animar as
empresas para investir nas pessoas. Há que contratar gente nova,
formá-los no seu âmbito e deixá-los aprender. A
contratação de pessoas não é um custo, é
um investimento.